Capítulo 04 | O Diagnóstico.

As portas do hospital se abriram automaticamente, e o frio da madrugada pareceu piorar ali dentro. Não sei se era o ar-condicionado ou o pânico que estava rasgando meu peito. Corri até o balcão, com a bolsa escorregando do ombro e o celular ainda tremendo na minha mão.

— Por favor... eu sou Celine Moretti. Recebi uma ligação... sobre meu marido. Vlad Moretti. Ele sofreu um acidente. — Minha voz mal saiu. Parecia presa na garganta, como tudo que eu vinha sentindo nas últimas semanas.

A atendente digitou algo, com olhos que já viram tragédias demais.

— Ele está em cirurgia. Sofreu um acidente de moto. Chegou há menos de uma hora. —

Cirurgia.

Aquilo ecoou na minha mente como uma sentença. Meus joelhos falharam por um segundo, mas eu me obriguei a ficar de pé. Não agora. Não podia desabar agora.

— E... ele vai... vai ficar bem? — Ela desviou os olhos. Não sei se pra não mentir ou porque estava cansada. Talvez os dois.

— Não posso te dar essa informação, senhora. O médico vai te atualizar assim que possível. Pode esperar ali. — ela apontou para as cadeiras na recepção.

Esperei. Sentada numa cadeira dura, fria, desconfortável — perfeita para o que eu estava sentindo. Fria como o silêncio que sempre ficou entre mim e Vlad. Dura como os últimos meses ao lado dele. Desconfortável como esse casamento que nunca me abraçou de verdade.

Olhei pro celular de novo. Nenhuma resposta. Nenhuma mensagem. Só aquele aviso absurdo do hospital, congelando meu sangue:

>> “Estado grave.”

Por que ele saiu de casa? Por que ele sumiu daquele jeito, mais uma vez? Por que ele sempre foge de mim?

Tantas perguntas me atravessando de uma vez, enquanto eu só queria uma coisa: ele vivo.

— Por favor, Deus… — sussurrei com a cabeça baixa. — Só me diz que ele vai ficar bem. Eu não tô pronta. Eu ainda não tô pronta pra perdê-lo. Não assim. Não agora…

E foi só aí que percebi… Eu ainda o amava. Eu o amo. Com tudo o que ele me fez. Com toda a distância, com toda a frieza, com todos os silêncios que gritavam mais alto que qualquer briga.

Horas se passaram naquela sala de espera fria e silenciosa, onde o tempo parecia se arrastar e cada segundo era um martírio. Eu estava ali, sentada, as mãos tremendo e o coração preso na garganta. Quando a porta se abriu, um homem de jaleco branco entrou, veio na minha direção e eu soube: era ele, o médico.

Ele se aproximou, com um olhar sério, porém compassivo. Respirou fundo antes de falar.

— Sra. Moretti? — eu acenei — Sou o Dr. Thompson, cirurgião responsável pelo seu marido. — Engoli em seco e balancei a cabeça, num gesto silencioso de confirmação.

— Vlad sofreu um trauma abdominal grave. Foi necessária uma cirurgia de emergência para conter uma lesão no baço. Ele está estável, mas ainda precisa de repouso absoluto para evitar complicações.

Meu peito apertou, e eu mal conseguia respirar.

— O segundo problema é uma fratura no braço direito, o braço dominante dele. Isso vai dificultar bastante as atividades diárias, pelo menos enquanto ele estiver em recuperação.

Ele fez uma pausa, como se escolhendo as palavras certas.

— Ele vai precisar de ajuda para praticamente tudo: se alimentar, vestir, tomar banho... O processo de recuperação pode ser lento, mas ele voltará a uma vida normal com o tempo. — Fiquei ali, olhando para ele, sem saber o que dizer. As lágrimas que eu segurava ameaçavam cair.

— O senhor pode me dizer se ele vai acordar? Se ele vai me reconhecer? — ele suspirou ao me ouvir.

— Ele está sedado, mas a sedação será retirada nas próximas horas. Quanto ao reconhecimento, não podemos garantir nada ainda, mas não há lesões cerebrais. Tudo indica que ele está bem cognitivamente.

Meu mundo parecia girar, mas ao menos aquela pequena luz me deu esperança.

Dr. Thompson olhou para mim com um olhar sério. — Preciso informar que Vlad estava com um nível muito alto de álcool no sangue quando deu entrada. Quase entrou em coma alcoólico. Isso significa que, mesmo após a cirurgia, ele pode demorar mais para acordar, já que o corpo ainda está eliminando o álcool e seus efeitos.

Ele fez uma pausa, avaliando minha reação.

— Por isso, é importante ter paciência. A sedação vai ser retirada, mas o tempo para que ele recupere a consciência pode ser maior do que o esperado. — fiquei em choque. Ele está realmente se embebedando sempre que sai de casa. Eu me casei com um alcoólatra? Vlad nunca demonstrou ser desse jeito pra mim enquanto estávamos namorando. Céus, ele parecia tão... Centrado.

— Certo, doutor. Muito obrigada mesmo... — agradeci enquanto mordia os lábios, tentando me conter para não cair em lágrimas mais uma vez.

— Disponha. Qualquer coisa, qualquer dúvida, estarei disponível. Pode falar comigo. — e então, me deixou sozinha com meus pensamentos.

Depois de um tempo, a porta se abriu novamente e a família começou a chegar — minha mãe, meu pai, e logo depois os pais do Vlad e seu irmão Scott. Cada rosto carregava um misto de medo e preocupação.

Minha mãe segurou minha mão com firmeza.

— O que aconteceu, minha filha? — ela perguntou com imensa preocupação. A mãe de Vlad já chorava.

Eu expliquei toda a situação para eles e eu conseguia ver a indignação nos rostos, principalmente no de seu pai. — Puta merda... Eu não criei um alcoólatra! Esse moleque só me dá desgosto e decepção... — disse com muita raiva e a mulher dele foi acalmá-lo.

Vlad ainda estava longe de mim, mas pela primeira vez eu senti que não estaria sozinha nessa batalha.

• • •

As horas seguintes passaram como um borrão.

A gente esperava por notícias enquanto os minutos se arrastavam, intermináveis. O relógio da parede fazia mais barulho do que o necessário, como se zombasse da nossa angústia.

Minha mãe se manteve do meu lado o tempo todo, como uma rocha. Meu pai caminhava de um lado pro outro, inquieto. Já Scott, irmão do Vlad, parecia pálido, como se ele também carregasse o peso de algo não dito.

A mãe de Vlad, sentada ao lado do marido, ainda enxugava as lágrimas discretamente, com um lenço que já estava encharcado.

Foi então que a porta se abriu outra vez, e o médico apareceu. Todos se levantaram de imediato.

— O paciente está estável — anunciou, com a calma clínica de quem já disse aquilo milhares de vezes. — A cirurgia abdominal correu bem. Retiramos o baço, que foi seriamente comprometido no impacto. Agora, ele precisa de repouso absoluto nos próximos dias.

— E o braço? — perguntei, mesmo sabendo da resposta, só pra ter certeza.

— Fraturado. Ele terá que manter o membro imobilizado por algumas semanas. Vai precisar de auxílio com praticamente tudo.

"Auxílio com tudo" ficou ecoando na minha cabeça. Eu sabia exatamente o que aquilo significava.

O médico olhou para mim, depois para os demais, mas pareceu entender, de alguma forma, que era comigo que ele precisava falar.

— Ele está inconsciente, mas não por sedação. O nível de álcool no sangue dele estava altíssimo quando deu entrada. O corpo dele está reagindo de forma mais lenta que o normal, e por isso pode demorar mais a despertar.

Senti um arrepio subindo pela espinha. Mesmo depois de tudo... eu ainda me assustava com a profundidade do buraco em que Vlad se enfiava cada vez que tentava fugir de si mesmo.

Agradeci ao médico com um aceno silencioso, e ele se afastou.

Todos voltaram a se sentar, exceto Scott, que permaneceu de pé, encarando a parede como se ela fosse dizer alguma coisa. Ele parecia inquieto, desconectado, como se quisesse dizer algo — mas travado por dentro.

Suspirei fundo e me mantive firme. Vlad estava vivo. E agora, ele ia precisar de mim. Mais do que nunca.

E dessa vez... ele não teria como fugir.

O silêncio tomou conta de novo. Cada um mergulhado nos próprios pensamentos, enquanto a esperança dançava entre o medo e o alívio. O pai do Vlad, que até então estava calado, levantou-se lentamente da cadeira e checou o relógio de pulso pela terceira vez em menos de dez minutos.

— Já passa das três da manhã... — murmurou, mais pra si do que pra nós. Depois, levantou os olhos pra mim. — Celine, vá pra casa. Descanse. Amanhã cedo você volta. Eu fico aqui com ele.

Balancei a cabeça de imediato. — Não... eu não quero ir embora. Eu preciso estar aqui quando ele acordar. Ele pode abrir os olhos e se assustar, achar que tá sozinho. Ele... ele precisa de mim. — falei, com convicção.

— E você acha que ele não vai precisar de você amanhã também? — ele rebateu com um olhar sério, mas sem grosseria. — Eu tô vendo na sua cara como você está cansada, Celine. Vá embora. Você será muito mais útil se estiver descansada.

Minha mãe assentiu, tocando meu ombro com carinho. — Ele tem razão, filha. Vá descansar. Ele está estável agora. Não é abandono, é cuidado. Você já fez muito por hoje.

Scott também se manifestou. — Eu também vou ficar. A gente se reveza. Mas você precisa de um tempo pra respirar. Dorme um pouco, toma um banho... depois volta. A gente te liga se qualquer coisa mudar, prometo.

Engoli seco. Tudo em mim gritava pra ficar. Mas eu sabia que eles estavam certos. Meu corpo inteiro doía de exaustão. Eu estava há muito tempo ali sentada naquela cadeira rígida e com os pensamentos fervendo.

Olhei pela última vez para a porta da UTI, como se meus olhos pudessem ultrapassar as paredes e alcançar o Vlad.

— Tá... mas se algo acontecer, qualquer coisa... me liguem na hora, tá bom? — insisti, pegando minha bolsa com mãos trêmulas.

— Você será a primeira a saber — garantiu o pai dele.

Assenti com dificuldade. Me sentia como se estivesse abandonando o campo de batalha, mas no fundo, sabia que aquilo era só o primeiro round.

E eu ia precisar estar inteira pros próximos

Algo me diz que não será nada fácil. E em se tratando do Vlad... Eu tenho plena certeza de que realmente não será.

...❀ • ❀ • ❀ • ❀ • ❀ • ❀ • ❀ • ❀...

Mais populares

Comments

MARIA RITA ARAUJO

MARIA RITA ARAUJO

ainda bem que existe a cláusula em que ele vai ficar dependendo d lá por causa da herança e já estou curiosa para saber 🤔

2025-07-10

0

MARIA RITA ARAUJO

MARIA RITA ARAUJO

que bomba ela pegou 🙆🏻‍♀️

2025-07-10

0

Ver todos
Capítulos
1 Prólogo
2 Capítulo 01 | A Cláusula Quarta
3 Capítulo 02 | Deslize.
4 Capítulo 03 | A Mensagem Inesperada.
5 Capítulo 04 | O Diagnóstico.
6 Capítulo 05 | Eu Não Quero Te Perder.
7 Capítulo 06 | A Cláusula Quinta.
8 Capítulo 07 | Doce Momento.
9 Capítulo 08 | Entre a Cruz e a Espada.
10 Capítulo 09 | Finalmente, Fora do Hospital.
11 Capítulo 10 | Coragem Para Contar a Verdade.
12 Capítulo 11 | Sem Alternativas
13 Capítulo 12 | A Realidade Dói
14 Capítulo 13 | Foi Tudo em Vão?
15 Capítulo 14 | Força Para Seguir
16 Capítulo 15 | Verdades À Flor Da Pele
17 Capítulo 16 | Existe O Perdão?
18 Capítulo 17 | O Preço Do Legado
19 Capítulo 18 | O Plano De Reconquista
20 Capítulo 19 | Pisando No Orgulho
21 Capítulo 20 | Ajuda Extra
22 Capítulo 21 | O Cerco
23 Capítulo 22 | Acordo Frio
24 Capítulo 23 | Baixar A Guarda
25 Capítulo 24 | O Retorno
26 Capítulo 25 | Preparativos
27 Capítulo 26 | Irredutível.
28 Capítulo 27 | O Preço da Armadura
29 Capítulo 28 | Tela Em Branco
30 Capítulo 29 | Invasão Gentil
31 Capítulo 30 | O Muro Rachando
32 Capítulo 31 | Desistir Não é Uma Opção Viável
33 Capítulo 32 | A Honra “Anônima”
34 Capítulo 33 | O Limiar Da Ausência
35 Capítulo 34 | O Regaste da Ternura
36 Capítulo 35 | Recomeço
37 Capítulo 36 | Jantar em Paz
38 Capítulo 37 | Amor Sobre Lençóis
Capítulos

Atualizado até capítulo 38

1
Prólogo
2
Capítulo 01 | A Cláusula Quarta
3
Capítulo 02 | Deslize.
4
Capítulo 03 | A Mensagem Inesperada.
5
Capítulo 04 | O Diagnóstico.
6
Capítulo 05 | Eu Não Quero Te Perder.
7
Capítulo 06 | A Cláusula Quinta.
8
Capítulo 07 | Doce Momento.
9
Capítulo 08 | Entre a Cruz e a Espada.
10
Capítulo 09 | Finalmente, Fora do Hospital.
11
Capítulo 10 | Coragem Para Contar a Verdade.
12
Capítulo 11 | Sem Alternativas
13
Capítulo 12 | A Realidade Dói
14
Capítulo 13 | Foi Tudo em Vão?
15
Capítulo 14 | Força Para Seguir
16
Capítulo 15 | Verdades À Flor Da Pele
17
Capítulo 16 | Existe O Perdão?
18
Capítulo 17 | O Preço Do Legado
19
Capítulo 18 | O Plano De Reconquista
20
Capítulo 19 | Pisando No Orgulho
21
Capítulo 20 | Ajuda Extra
22
Capítulo 21 | O Cerco
23
Capítulo 22 | Acordo Frio
24
Capítulo 23 | Baixar A Guarda
25
Capítulo 24 | O Retorno
26
Capítulo 25 | Preparativos
27
Capítulo 26 | Irredutível.
28
Capítulo 27 | O Preço da Armadura
29
Capítulo 28 | Tela Em Branco
30
Capítulo 29 | Invasão Gentil
31
Capítulo 30 | O Muro Rachando
32
Capítulo 31 | Desistir Não é Uma Opção Viável
33
Capítulo 32 | A Honra “Anônima”
34
Capítulo 33 | O Limiar Da Ausência
35
Capítulo 34 | O Regaste da Ternura
36
Capítulo 35 | Recomeço
37
Capítulo 36 | Jantar em Paz
38
Capítulo 37 | Amor Sobre Lençóis

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!