Capítulo 2 – O Homem dos Sonhos

O dia seguinte amanheceu cinzento, com nuvens pesadas encobrindo o céu. Do quarto no sexto andar, Isadora observava a cidade através da janela, como se esperasse que alguma rua, prédio ou detalhe disparasse uma lembrança. Mas tudo parecia... estrangeiro.

Ela mal dormiu. O sonho — se é que podia chamar assim — ainda ecoava nela. Era vívido demais. Real demais. A sensação da chuva molhando seus cabelos, o calor das mãos que seguravam seu rosto, o tom desesperado da voz que suplicava para que ela não esquecesse.

Mas o rosto dele… ainda era uma névoa.

Alguém bateu suavemente à porta.

— Com licença? — uma enfermeira loira, de sorriso gentil, entrou com uma prancheta em mãos. — Oi, Isadora. Trouxe seu café e vim fazer alguns testes de memória.

Ela assentiu em silêncio, ainda olhando a cidade.

A rotina dos testes já havia começado no dia anterior. Palavras simples para repetir. Imagens para reconhecer. Datas, nomes, números. Tudo se confundia na cabeça dela. Era como tentar montar um quebra-cabeça com peças de outros jogos.

— Você se lembra da sua profissão?

Isadora franziu o cenho.

— Eu… acho que era designer. Algo com criação. Imagens. Mas… não sei com certeza.

A enfermeira anotou algo.

— E o nome do seu noivo?

Isadora engoliu em seco.

— Daniel.

— Ótimo. E qual a última lembrança nítida que tem?

Ela hesitou. Respirou fundo.

— Eu estava no aeroporto. Com as minhas amigas. Íamos viajar para comemorar meu aniversário. Era junho. E… depois disso, nada.

A enfermeira sorriu com doçura, embora houvesse compaixão no olhar.

— O médico vai vir te ver mais tarde. E seu noivo também disse que vem no fim da tarde, como ontem. Ele está muito dedicado a você.

Isadora forçou um sorriso, mas assim que ficou sozinha, o vazio reapareceu.

Ela não duvidava da bondade de Daniel. Ele parecia gentil, carinhoso, cuidadoso. O tipo de homem que qualquer mulher gostaria de ter ao lado. Mas havia uma lacuna entre a lógica e o coração. Ela simplesmente não sentia o que deveria sentir. Nenhum frio na barriga. Nenhuma urgência no toque. Nenhuma lembrança despertando.

E pior: quando ela fechava os olhos, o rosto que queria ver não era o de Daniel.

Naquela tarde, enquanto caminhava lentamente pelos corredores do hospital com ajuda de uma fisioterapeuta, Isadora parou diante de um quadro decorativo na parede: uma fotografia em preto e branco de um campo aberto, onde um casal corria em direção um ao outro.

Foi apenas um segundo.

Mas a imagem ativou algo.

Seu coração bateu forte. E, de repente, ela ouviu a voz novamente, nítida, como se estivesse dentro dela:

"Você prometeu... você disse que nunca ia me deixar."

Ela levou a mão ao peito, os olhos marejados.

— Está tudo bem? — perguntou a fisioterapeuta, preocupada.

Isadora balançou a cabeça, sem conseguir explicar. Como explicar que estava sendo assombrada por memórias que não pareciam inventadas?

Ela precisava entender. Precisava encontrar respostas.

Mais tarde, no quarto, Daniel chegou com flores nas mãos e um sorriso cansado.

— Trouxe suas favoritas — disse, depositando um buquê de lírios brancos na mesinha. — O cheiro te acalma. Sempre dizia isso.

Ela agradeceu com um aceno. Estava mais calada que o normal, e ele notou.

— Está tudo bem? — ele perguntou, sentando-se.

Ela respirou fundo. Precisava perguntar.

— Daniel… você tem fotos nossas? De antes do acidente?

Ele sorriu.

— Claro. Muitas. Você sempre postava no Instagram, e eu também. Eu trouxe seu celular, carregado. Está aí na gaveta. — Ele apontou. — Achei melhor esperar até você se sentir pronta.

Ela assentiu lentamente.

— Posso ver?

— Claro — respondeu ele, se levantando para pegar o aparelho. Entregou-o com cuidado, observando-a com olhos atentos. — Se ficar angustiada… para, tá bem?

Isadora desbloqueou o celular. Sua digital ainda funcionava. Um alívio estranho. Como se uma parte dela ainda estivesse ali.

Começou a rolar a galeria.

Havia fotos com Daniel em restaurantes, em festas, em viagens. Sorrisos, abraços, legendas apaixonadas. Mas… tudo parecia encenado. Como se ela estivesse olhando para uma vida de outra pessoa.

Então, algo a fez congelar.

Entre as fotos com Daniel, havia uma pasta separada. Oculta.

"Arquivo Protegido", era o nome.

Ela clicou. E pediu uma senha.

Franziu a testa.

— Você sabe essa senha? — perguntou a Daniel, tentando parecer casual.

Ele se aproximou e olhou.

— Isso? Não… talvez você tenha protegido algo pessoal. Documentos, talvez. Não lembro de ter visto isso antes.

Isadora disfarçou a decepção.

Mas agora, havia mais uma certeza.

Havia algo que estava sendo escondido.

E ela iria descobrir.

Naquela noite, o sonho voltou.

Só que agora, ele falava seu nome.

"Isadora... você prometeu. Me encontra. Eu te espero. Sempre te esperei."

Ela acordou ofegante, suando frio. E, pela primeira vez, sentiu que talvez… estivesse sendo vigiada.

Mais populares

Comments

Maria Silva

Maria Silva

O que será que aconteceu com ela e quem é essa pessoa que ela sonha sempre

2025-07-13

1

Maria Silva

Maria Silva

qual a história dela?pois já começou no hospital

2025-07-13

0

Cristiane-10 oliveira

Cristiane-10 oliveira

está na cara que o Daniel não é o noivo dela !!!!???🤔🤔

2025-07-12

0

Ver todos
Capítulos
1 Capítulo 1 – Acordar no Vazio
2 Capítulo 2 – O Homem dos Sonhos
3 Capítulo 3 – O Homem da Carta
4 Capítulo 4 – O Nome Que o Coração Não Esqueceu
5 Capítulo 5 – Jogo de Aparências
6 Capítulo 6 – A Casa Onde Eu Não Me Reconheço
7 Capítulo 7 – Onde Tudo Começou
8 Capítulo 8 – A Mulher Que Corre
9 Capítulo 9 – A Voz Que Rompe o Silêncio
10 Capítulo 10 – O Julgamento Invisível
11 Capítulo 11 – As Vozes Que Nunca Foram Ouvidas
12 Capítulo 12 – O Jogo Sujo
13 Capítulo 13 – As Correntes Invisíveis
14 Capítulo 14 – A Mulher no Banco das Verdades
15 Capítulo 15 – A Voz que Ninguém Pode Calar
16 Capítulo 16 – A Última Página do Processo
17 Capítulo 17 – Onde Eu Me Quebrei
18 Capítulo 18 – Aquilo que Ainda Precisa Ser Dito
19 Capítulo 19 – O Nome Que Eu Quase Apaguei
20 Capítulo 20 – Quando a Voz Vira Eco
21 Capítulo 21 – Os Nomes que me Dão
22 Capítulo 22 – O Peso da Bagagem Que Levo
23 Capítulo 23 – A Mulher Que Eles Querem Que Eu Seja
24 Capítulo 24 – A Voz Que Me Faltou
25 Capítulo 25 – Quando Eu Viro Personagem
26 Capítulo 26 – A Versão Que Inventam de Mim
27 Capítulo 27 – A Cena Que Nunca Gravei
28 Capítulo 28 – Quando o Mundo Me Vê
29 Capítulo 29 – Quando o Amor Começa a Doer de Novo
30 Capítulo 30 – Quando o Mundo Me Escuta
31 Capítulo 31 – A Resposta Que Eu Tinha Medo de Ler
32 Capítulo 32 – Quando a Luz Apaga e Eu Ainda Estou Aqui
33 Capítulo 33 – O Começo de Alguma Coisa
34 Capítulo 34 – O Lugar Onde Não Dói
35 Capítulo 35 – E Se For Amor, Mas Sem Dor?
36 Capítulo 36 – Onde a Pele Fala Antes do Perdão
37 Capítulo 37 – Depois do Desejo, o Silêncio
38 Capítulo 38 – As Coisas Que Ele Nunca Disse
39 Capítulo 39 – O Lugar Que Também é Teu
40 Capítulo 40 – O Livro Que Escrevi Sem Saber Que Era Sobre Mim
41 Capítulo 41 – Onde o Amor Decide Ficar
42 Capítulo 42 – Onde Tudo Começou, Onde Eu Escolhi Ficar
43 Capítulo 43 – O Amor Que Eu Lembrei de Escolher
44 Epílogo – O Amor Que Eu Não Preciso Mais Lembrar
Capítulos

Atualizado até capítulo 44

1
Capítulo 1 – Acordar no Vazio
2
Capítulo 2 – O Homem dos Sonhos
3
Capítulo 3 – O Homem da Carta
4
Capítulo 4 – O Nome Que o Coração Não Esqueceu
5
Capítulo 5 – Jogo de Aparências
6
Capítulo 6 – A Casa Onde Eu Não Me Reconheço
7
Capítulo 7 – Onde Tudo Começou
8
Capítulo 8 – A Mulher Que Corre
9
Capítulo 9 – A Voz Que Rompe o Silêncio
10
Capítulo 10 – O Julgamento Invisível
11
Capítulo 11 – As Vozes Que Nunca Foram Ouvidas
12
Capítulo 12 – O Jogo Sujo
13
Capítulo 13 – As Correntes Invisíveis
14
Capítulo 14 – A Mulher no Banco das Verdades
15
Capítulo 15 – A Voz que Ninguém Pode Calar
16
Capítulo 16 – A Última Página do Processo
17
Capítulo 17 – Onde Eu Me Quebrei
18
Capítulo 18 – Aquilo que Ainda Precisa Ser Dito
19
Capítulo 19 – O Nome Que Eu Quase Apaguei
20
Capítulo 20 – Quando a Voz Vira Eco
21
Capítulo 21 – Os Nomes que me Dão
22
Capítulo 22 – O Peso da Bagagem Que Levo
23
Capítulo 23 – A Mulher Que Eles Querem Que Eu Seja
24
Capítulo 24 – A Voz Que Me Faltou
25
Capítulo 25 – Quando Eu Viro Personagem
26
Capítulo 26 – A Versão Que Inventam de Mim
27
Capítulo 27 – A Cena Que Nunca Gravei
28
Capítulo 28 – Quando o Mundo Me Vê
29
Capítulo 29 – Quando o Amor Começa a Doer de Novo
30
Capítulo 30 – Quando o Mundo Me Escuta
31
Capítulo 31 – A Resposta Que Eu Tinha Medo de Ler
32
Capítulo 32 – Quando a Luz Apaga e Eu Ainda Estou Aqui
33
Capítulo 33 – O Começo de Alguma Coisa
34
Capítulo 34 – O Lugar Onde Não Dói
35
Capítulo 35 – E Se For Amor, Mas Sem Dor?
36
Capítulo 36 – Onde a Pele Fala Antes do Perdão
37
Capítulo 37 – Depois do Desejo, o Silêncio
38
Capítulo 38 – As Coisas Que Ele Nunca Disse
39
Capítulo 39 – O Lugar Que Também é Teu
40
Capítulo 40 – O Livro Que Escrevi Sem Saber Que Era Sobre Mim
41
Capítulo 41 – Onde o Amor Decide Ficar
42
Capítulo 42 – Onde Tudo Começou, Onde Eu Escolhi Ficar
43
Capítulo 43 – O Amor Que Eu Lembrei de Escolher
44
Epílogo – O Amor Que Eu Não Preciso Mais Lembrar

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!