Sábado, 13h57 — Cafeteria Doce Refúgio
A fachada da cafeteria era charmosa, com janelas de vidro emolduradas por trepadeiras e uma plaquinha escrita à mão pendurada na porta: Aberto com amor.
O aroma de café fresco, canela e bolo de cenoura recém-assado preenchia o ar, convidando os clientes a desacelerarem. Mas Patrícia não conseguia relaxar. Sentada à mesa da janela, ela encarava o próprio reflexo no vidro, mexendo na alça da bolsa com os dedos ansiosos.
Ela chegou antes de Thiago, como de costume. Detestava atrasos, mesmo quando o atraso não era dela.
"Você não está aqui por vingança", ela repetia mentalmente. "Está aqui porque quer dar uma chance a outra coisa. A alguém que não te provoca só pra te deixar nervosa."
Era verdade.
Ou pelo menos, era o que ela queria acreditar.
Às 14h01, Thiago entrou.
— Desculpa o atraso — disse com aquele sorriso calmo. — O trânsito estava uma loucura.
— Imagina — Patrícia sorriu. — Acabei de chegar também.
Ele se sentou de frente para ela. Pediram cafés e dividiram um pedaço de torta de limão. A conversa começou leve, com amenidades da escola, professores, filmes. Thiago era educado, atencioso, gentil… mas algo dentro dela continuava inquieto.
E tudo piorou quando, às 14h08, o sininho da porta tocou novamente.
Ela nem precisou olhar para saber quem era.
Michael entrou como se estivesse em casa. De mãos nos bolsos, camisa dobrada nos braços, cabelo bagunçado — e um sorriso displicente nos lábios.
Ao lado dele, Lara.
Patrícia congelou por um segundo.
Ele olhou ao redor como quem buscava algo. Quando seus olhos encontraram os dela, parou. Só por um momento.
E então…
Sorriu.
Um sorriso curto. Afiado. Irônico.
E seguiu em direção à mesa do fundo com Lara.
— Conhece eles? — perguntou Thiago, virando-se para ver o casal recém-chegado.
— Somos da mesma turma — respondeu Patrícia, com um gole mais demorado do café. — Crescemos juntos.
Thiago assentiu. Não insistiu.
Mas ela sabia que ele havia percebido. A tensão. O desconforto. O jeito como ela olhava sem querer olhar.
Na outra mesa, Michael também tentava fingir normalidade.
— Gosta de café com leite ou puro? — perguntou Lara, sorrindo demais.
— Tanto faz — respondeu, sem tirar os olhos do cardápio.
Ou melhor… da mesa à frente.
Porque ele via tudo: os sorrisos contidos de Patrícia, o jeito como Thiago se inclinava para falar algo mais baixo, a forma como ela mexia no cabelo quando estava nervosa.
Ele odiava aquilo.
E não entendia por quê.
Quer dizer… entendia. Só não queria admitir.
— O que foi? — Lara perguntou, desconfiada.
— Nada. Só tô pensando em… no jogo de terça.
Lara assentiu, mas a tensão era visível. Ela não era boba. Sabia que estava ali como figurante em uma peça que não era dela.
Quinze minutos se passaram.
Os olhares entre as mesas se cruzavam vez ou outra. Michael disfarçava olhando pela janela, Patrícia fingia olhar o cardápio, Thiago parecia cada vez mais deslocado, e Lara mexia no celular compulsivamente.
Até que Thiago tomou coragem.
— Patrícia, posso ser direto?
— Claro.
— Eu gosto de você. Não é só um “interesse de escola”. Eu gosto da sua postura, da sua inteligência, do jeito como você comanda tudo. E… eu queria saber se você sente algo parecido.
Ela piscou.
A pergunta veio como um balde de água fria. Não porque era ofensiva — longe disso. Mas porque ela não tinha resposta. Não uma honesta.
E, como se o universo conspirasse para tornar tudo pior, Michael levantou-se da outra mesa naquele exato instante e passou por trás deles para ir ao balcão.
Ouviria tudo.
Sentiria tudo.
— Thiago… — Patrícia começou, com cuidado. — Você é incrível. De verdade. E talvez, em outro momento, eu… tentaria. Mas agora… acho que estou confusa demais pra te dar o que você merece.
Thiago assentiu lentamente, escondendo a frustração com elegância. — Agradeço por ser sincera.
Ela sorriu, aliviada por não precisar fingir.
Mas quando Michael voltou à sua mesa, havia algo diferente em seu olhar. Ele não sorria mais. Nem provocava. Estava quieto. Observador. E, talvez… decepcionado.
Lara percebeu também.
— Michael — ela disse, enquanto ele mexia no copo vazio. — Você não está aqui comigo. Nem por mim. E tudo bem. Mas não me faça parecer idiota.
Ele a olhou, surpreso com a clareza.
— Me desculpa — foi tudo o que conseguiu dizer.
Lara pegou a bolsa. — Espero que você descubra logo o que quer. Antes que seja tarde.
E foi embora.
Dez minutos depois, Patrícia saiu da cafeteria. Thiago havia sido gentil até o fim, mas a conversa murchou depois da resposta dela. Não havia mais nada a dizer.
Ela estava atravessando a calçada quando ouviu passos atrás.
— Pati.
Ela parou. Fechou os olhos por um segundo antes de virar.
Michael estava ali. Com as mãos nos bolsos, expressão estranhamente… calma.
— Eu estraguei tudo, né?
— O quê?
— O clima. O encontro. A cafeteria.
— Foi você quem convidou alguém só pra me provocar. Quem estragou o quê?
Ele riu, sem graça. — Você viu, né?
— Todo mundo viu.
— Eu não sei o que tô fazendo — ele disse, de repente. — Eu só sei que… não gosto de te ver com ele.
— E o que você sente quando me vê com você?
Ele abriu a boca para responder, mas nenhuma palavra saiu.
Ela deu um passo para trás.
— Quando souber, me avisa.
E foi embora, deixando Michael parado na calçada com a dúvida mais incômoda de todas.
Não sobre ela.
Mas sobre si mesmo.
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Atualizado até capítulo 60
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