Na superfície, Lara tinha tudo: uma família de prestígio, uma faculdade de elite, um círculo social influente. Mas por dentro, sentia-se como uma boneca de porcelana presa em uma prateleira alta, bonita, admirada, mas sem liberdade de escolha.
A sabotagem do trabalho ainda latejava como um hematoma em sua autoestima. Ela sabia que não era um erro seu. Sabia que aquelas duas Clara e Vanessa estavam por trás daquilo. Mas mais uma vez, silenciou.
Silenciar era mais fácil. Era o que havia aprendido desde pequena: mantenha a postura, sorria, não exponha fraquezas. Seus pais têm um nome a zelar.
No dia seguinte, Clara foi até sua casa “preocupada”.
— Amiga, eu trouxe chocolate e vinho. Você tava tão estranha ontem… achei que podia animar você.
Lara abriu a porta com expressão cansada. Sabia que havia veneno atrás daquele gesto. Mas... estava exausta demais para enfrentar.
— Entra.
Sentaram-se na varanda da casa. Clara despejou vinho nas taças enquanto sorria, mas os olhos varriam o ambiente como quem vasculhava oportunidades.
— Sabia que o Tomás tá de volta? — soltou ela, casualmente.
O nome bateu como um soco no estômago de Lara.
— Ele voltou? Por quê?
— Parece que conseguiu um estágio em Milão… com apoio do pai. Mas... disse que ainda pensa muito em você.
Lara franziu a testa.
— Você falou com ele?
Clara hesitou, mas deu um sorriso.
— Ele me chamou no Insta. Perguntou se você ainda tava com aquele jeitinho fofo. Eu disse que sim. Que você ainda se magoa fácil.
Lara travou.
Era aquilo. Sempre aquilo. Clara a entregava de bandeja. A pintava como frágil. Como tola.
— Eu não quero contato com ele, Clara. Ele me destruiu por dentro. Me manipulou, me traiu, me humilhou.
— Ai, Lara... você leva tudo tão a sério. Ele errou, claro, mas era tão apaixonado por você.
Vanessa chegou logo depois, sem ser convidada, como sempre.
— Amores! Gente, eu trouxe pizza e fofoca — disse entrando na varanda com o próprio vinho na mão. — Sabem aquela garota que passou na prova de estágio da promotoria? Pegou um professor casado. Todo mundo sabe, mas finge que é mérito.
Lara desviou o olhar.
Aquelas eram as conversas delas. Sempre diminuindo outras mulheres. Sempre usando o veneno como maquiagem.
Durante toda a noite, Clara e Vanessa alternaram fofocas, risadinhas e indiretas. Falaram de Lara como se fossem suas conselheiras, mas enfiaram facas invisíveis em cada frase.
》 “Você é tão boazinha, Lara. Quase uma santa. Só tem que aprender a ser menos... mole.”
》 “Sabe o que falta em você? Maldade. Um pouco só. Pra sobreviver nesse mundo.”
》 “Você nunca vai segurar um homem forte, tipo o Henry, sendo desse jeitinho.”
Era isso. O padrão. Elas a diminuíam sutilmente, dia após dia, para que ela nunca se visse como era: poderosa. Inteligente. Forte. Perigosa.
E pela primeira vez... Lara sentiu nojo.
Não delas. Mas de si mesma, por aceitar aquilo tanto tempo.
Quando as duas foram embora, ela foi direto para o quarto. Trancou a porta. Sentou no chão com os olhos marejados.
Pegou o celular e abriu uma pasta secreta de documentos no Google Drive. Ali estavam todos os prints que havia salvo de conversas abusivas com Tomás, mensagens antigas das manipulações de Clara, prints de comentários maldosos de Vanessa sobre outras colegas.
Ela lia aquilo como se estivesse analisando um caso.
E pela primeira vez, pensou:
"Eu sei como destruir gente como vocês. Só preciso parar de me calar."
Naquela noite, não dormiu. Mas algo dentro dela acordou.
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Atualizado até capítulo 53
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