Capítulo 4 - A Casa Esquecida

As ruínas surgiram no horizonte como uma lembrança esquecida.

No alto de um vale coberto por neblina acinzentada, pedras quebradas e estruturas retorcidas se erguiam contra o céu negro, como ossos antigos lutando para não desaparecer. Era difícil dizer se aquilo fora um templo, uma morada ou um esconderijo. Mas Kael soube imediatamente o que era.

Refúgio.

Não apenas físico, mas mágico. Um lugar escondido do tempo e dos olhos do mundo.

Eles atravessaram o caminho coberto por folhas secas que não cheiravam a nada — como se até os cheiros tivessem sido apagados — e chegaram ao centro da construção. Havia ali o que restava de um salão: colunas caídas, tapeçarias desfeitas pelo vento, e ao fundo, um espelho quebrado pendurado entre raízes que tomavam as paredes.

Kael foi o primeiro a falar, mas suas palavras vieram carregadas de peso.

— Eu acredito que sei o que aconteceu… no dia em que vocês vieram para este mundo.

Selene o encarou, atenta. Seus dedos ainda estavam frios desde o altar. Maya e Ariadne também se viraram, silenciosas.

— A explosão na colina — começou ele — não foi causada por acaso. Nem por Selene. Foi um feitiço. Um feitiço de ligação… poderoso, antigo… e instável.

— Ligação? — Maya perguntou, franzindo a testa.

— Genevieve… — disse ele, pausando, como se saborear o nome real de Elaine lhe causasse certo desconforto — ou melhor, Elaine… Ela lançou esse feitiço para unir vocês três. Para conectar Selene às duas como se fossem sangue do mesmo sangue. Só que feitiços assim não vêm sem preço. E nem sempre obedecem ao tempo.

Selene sentiu o chão parecer um pouco menos firme sob seus pés.

— A explosão... — sussurrou. — Você está dizendo que foi causada por isso?

Kael assentiu, grave.

— Quando Elaine lançou o feitiço, ele se ancorou em Selene. A magia se espalhou como um raio de energia, procurando o destino que ela havia selado: Ariadne e Maya. Mas vocês estavam distantes. A magia precisou viajar, se adaptar, e nesse intervalo… se acumulou.

— Por isso a explosão aconteceu na colina — concluiu Ariadne, cruzando os braços. — Porque Selene estava no centro.

— E por isso o carro saiu da estrada… — murmurou Maya, tocando a lateral do próprio corpo, como se ainda sentisse o impacto. — Nós sentimos o efeito da magia quando ela finalmente nos alcançou. Era como se algo nos atravessasse de dentro para fora.

— Vocês não perceberam, mas o feitiço se completou ali, entre os gritos, a dor e o sangue. — Kael olhou diretamente para Selene. — E foi naquele momento que vocês se tornaram parte uma da outra.

O silêncio caiu sobre o salão em ruínas.

Selene levou a mão ao peito, onde agora o calor mágico parecia mais forte, como se reagisse às palavras de Kael. Ela nunca entendeu por que, depois daquele dia, sentia as emoções das irmãs como se fossem suas. Por que às vezes ouvia o pensamento delas em ecos. Por que os sonhos se confundiam.

Agora sabia.

— Ela me ligou a elas... — sussurrou. — Para me proteger?

— Para te esconder, provavelmente — respondeu Kael. — Mas também… para te ancorar. Para que não perdesse o que te torna humana, mesmo com o que começa a despertar dentro de você.

— Mas por que esconder algo assim de nós? — Ariadne perguntou, o tom duro.

Kael hesitou por um momento, depois disse:

— Porque às vezes, amar alguém é esconder verdades... mesmo que isso custe tudo. E Elaine sabia que, uma vez que a ligação se completasse, vocês não seriam mais apenas filhas, ou irmãs. Seriam parte de algo muito maior.

Selene abaixou os olhos. No fundo do peito, a dor era real — uma saudade que não fazia sentido, uma raiva que não tinha forma, e um amor estranho por uma mãe que agora parecia tão distante quanto o céu apagado acima delas.

Foram os segredos, as perdas e os laços que fizeram dela o que agora despertava.

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