Viver entre os Virmond era como viver em meio a tempestades previsíveis.
Cada um dos seis irmãos era um universo distinto, com seus próprios ritmos, manias e formas de lidar com o mundo. E Luna, acostumada a transitar como visitante honrada, agora via tudo com olhos diferentes.
Porque agora, só ela sabia.
Só ela conhecia o segredo que mudaria o rumo da família.
E aquele segredo vestia terno preto, falava pouco e nunca jantava com os outros.
Na manhã seguinte à visita à sala de leitura com Alaric, Luna foi até a cozinha da mansão — um ambiente surpreendentemente caloroso para um lar de tanto luxo. Dona Maëlle, a cozinheira-chefe, preparava o café como fazia desde que Luna era pequena.
— Bom dia, menina doce — disse ela, com o sotaque antigo das montanhas. — Seu chá está pronto. E adivinha quem está acordado antes das galinhas?
— Dante? — Luna arriscou.
— Não. Tristan. — Maëlle sorriu. — Ainda não aprendeu a diferença entre acordar cedo e dormir tarde demais.
Luna riu baixo.
Logo depois, os irmãos começaram a aparecer, como se ensaiados em um espetáculo matinal.
Levi, o quinto irmão, sempre chegava primeiro. O mais atlético, de sorriso fácil, cabelo bagunçado e energia insuportável para aquele horário. Ele cumprimentava todos com um beijo na testa, mesmo que ninguém pedisse.
Elias, o terceiro, vinha logo depois. Mais discreto, porém observador. Tinha uma alma mais artística, gostava de fotografia e vivia fazendo piadas sutis que nem sempre os outros percebiam.
Adrian, o segundo, era o que mais falava. Tinha um charme desleixado e um humor sarcástico que escondia uma mente extremamente afiada. Ele adorava provocar os irmãos — especialmente Cael.
Cael, por sua vez, era sempre o último a chegar e o mais barulhento. Tinha o cabelo perfeitamente penteado, perfume caro e uma autoconfiança que dava nos nervos. Ele ignorou Luna completamente ao entrar na cozinha, o que, curiosamente, foi um alívio para ela.
Era estranho perceber que seu coração já não acelerava como antes. Só doía — de forma mais silenciosa, mais resignada.
E então havia Tristan, o quarto, o mais excêntrico, que já estava ali antes de todos, jogado no sofá com uma xícara de café preto e um livro de poemas russos que ninguém acreditava que ele realmente lia.
— Pensei que não sobreviveria à noite passada — disse ele quando Luna passou por ele. — Joguei pôquer com Adrian e perdi até minha dignidade.
— Você nunca teve — Adrian respondeu ao fundo.
— Toque de sarcasmo logo cedo? — Elias murmurou, bocejando. — Esse café precisa ser mais forte.
O ambiente era leve, ainda que caótico. Luna observava tudo em silêncio, sentada com sua xícara nas mãos, como uma peça que não pertencia totalmente ao quebra-cabeça… mas ainda assim era parte dele.
Ela riu em alguns momentos, trocou olhares com Elias e Levi, respondeu a uma provocação de Adrian, mas evitou qualquer contato visual com Cael.
Não havia mais espaço para ilusões. Nem para dor.
Era como se um ciclo tivesse se encerrado sem que ela tivesse escolhido.
Dante, como sempre, não apareceu para o café.
Maëlle explicou que ele havia saído cedo para uma reunião em Bélvar — a capital do país — e só voltaria à noite.
— Seu irmão mais velho é feito de aço — comentou Levi. — Tenho certeza que ele nem dorme. Se alimenta de planilhas e contratos.
— Ou de almas inocentes — acrescentou Adrian, arrancando risadas.
— Aposto que ele tem um quarto secreto onde pratica meditação fiscal. — disse Elias, com seu humor peculiar.
Mesmo em sua ausência, Dante era tema constante.
Todos pareciam lidar com ele como quem lida com uma lenda viva: com respeito, mas também com uma certa ironia contida, como se aquele homem nunca tivesse sido, de fato, um irmão comum.
— Ele é tão diferente de vocês… — Luna disse, quase sem pensar.
Tristan foi o único que respondeu com seriedade.
— Porque ele teve que ser. — murmurou, encarando a xícara. — Quando nosso avô morreu, Dante tinha só dezoito. Assumiu tudo, inclusive a sombra do nosso pai. Não é fácil crescer sendo o nome que todos esperam respeitar. Ele não teve o direito de errar. Nós… tivemos.
Luna ficou em silêncio.
Pela primeira vez, sentiu algo parecido com empatia.
Talvez a frieza de Dante não fosse desinteresse. Talvez fosse proteção.
Um escudo moldado por expectativas que ele nunca teve permissão de recusar.
No fim da tarde, Luna decidiu ir até a biblioteca da mansão. Era um dos únicos lugares onde a presença de Dante ainda parecia viva — mesmo quando ele não estava ali.
Lá, entre livros antigos e o cheiro de madeira polida, ela caminhou pelas prateleiras como fazia quando criança. Seus dedos passaram pelos títulos, pelos nomes em couro, pelas letras douradas.
E, no canto da mesa central, encontrou um fichário.
Aberto.
Com anotações firmes, meticulosas. Caligrafia precisa.
Era dele.
Ela não devia ter tocado, mas tocou.
Um simples gesto. Um toque na borda da página.
Como se quisesse entender a mente por trás daquela assinatura fria.
Dante.
Ele era um enigma.
Um silêncio que dizia muito mais do que os gritos dos irmãos mais novos.
E, por alguma razão que ela ainda não sabia explicar, Luna sentia que havia algo naquele silêncio que falava diretamente com o dela.
Naquela noite, antes de dormir, escreveu:
"Hoje eu vi os irmãos dele rindo, brincando, zombando, existindo em liberdade.
E pensei: o que é crescer sem poder errar?
Talvez Dante nunca tenha tido o direito de ser só um homem. Talvez ele nunca tenha sido apenas um irmão.
Talvez ele seja o único que, mesmo sem saber, pode entender a versão de mim que ninguém conhece.
O silêncio dele me atrai. Não por romantismo… mas por reconhecimento.
Há um mundo dentro de mim que só alguém como ele pode visitar."
E, com isso, Luna dormiu.
Sabendo que o tempo estava se estreitando.
E que o dia de dizer a verdade viria.
Mas por enquanto… ela só queria continuar olhando.
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Atualizado até capítulo 52
Comments
Lorrainecristinioliveira Oliveira
Luna vão estar certa em escolher Dante vai ser um amor puro e verdadeiro
2025-07-03
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