O Julgamento de Si Mesmo (Passado de Julián)
Seis Anos Atrás
Dante me esperava na laje. Os olhos dele brilhavam sob o céu nublado, e o cigarro pendia dos lábios enquanto ele fingia que não se importava com nada — como sempre fazia.
Mas eu conhecia aquele olhar. Ele estava com medo.
Medo de mim.
— O que houve? — perguntei, sentando ao lado dele, os joelhos encostando por descuido.
— Seu pai descobriu, não foi? — ele soltou, amargo.
Eu não respondi. O silêncio foi minha única resposta.
Dante soltou um riso sem humor. — Sabia que isso ia acontecer. Você é bom demais pra esse mundo. Demais pra mim.
— Cala a boca.
— Você vai embora.
— Eles querem que eu vá pra Brasília, estudar Direito. Dizem que posso ser alguém...
— Já é alguém pra mim.
Meus olhos se encheram de água. E quando o abracei, ele não resistiu. Apertou meus ombros como se quisesse gravar meu corpo em suas mãos. E talvez quisesse.
Naquela noite, fizemos amor como se fosse a última vez. E foi.
Na manhã seguinte... eu fui.
Julián – ( Depois da Partida )
Brasília era tudo o que eu sonhava. E tudo o que eu odiava.
Salas brancas, rostos de terno, palavras difíceis e olhares vazios.
Lá, eu podia ser “Julián Albuquerque, futuro juiz federal”.
Mas por dentro, continuava sendo o menino que deixou o amor da sua vida pra trás.
Nos primeiros meses, tentei escrever. Mas as mensagens nunca foram enviadas. A vergonha me impedia.
E quando soube que o pai de Dante havia morrido em um tiroteio... eu soube o que viria a seguir.
Ele herdaria o trono. O sangue. A guerra.
E eu não estaria lá.
Fiz o que sabia fazer: mergulhei nos livros. Me tornei o melhor aluno. O mais frio. O mais técnico. O mais... intocável.
Mas à noite, quando fechava os olhos, o cheiro da pele dele ainda estava comigo.
Julián – ( Agora )
Hoje sou juiz federal.
Tenho respeito, cargo, status...
E uma vida vazia.
Nunca me casei. Nunca confiei em ninguém o bastante pra me despir de novo.
E então... Noah apareceu.
Com os olhos doces de quem ainda acredita nas pessoas.
Com a mesma coragem que Dante tinha. E a mesma pureza que eu destruí dentro de mim.
E ver os dois juntos...
Era como reviver uma ferida.
Era como ser forçado a olhar no espelho.
Era como… ser julgado todos os dias pelo que fui covarde demais pra manter.
Julián – ( Voz Interna )
> “Eu não fui embora porque quis.
Eu fui porque meu amor era um crime.
E no fim, o sistema me venceu.
Agora… é tarde demais pra pedir perdão.
Mas talvez… não seja tarde pra impedir Dante de arrastar Noah pro mesmo abismo que me engoliu.”
Julián
O que me assusta não é o poder de Dante.
É o fato de que... ele ainda me conhece.
Mesmo depois de tudo. Mesmo depois dos anos, dos silêncios, das escolhas. Ele olha pra mim e me desmonta como se cada camada da minha armadura fosse de vidro.
Mas agora, não é só ele.
Noah.
Esse garoto me bagunça.
Talvez por me lembrar de quem eu fui. Ou talvez porque me mostra tudo o que eu poderia ter sido, se não tivesse fugido.
Ele tem a inocência que o mundo me roubou.
E a coragem que Dante nunca perdeu.
E entre nós três... há uma linha tênue de desejo, medo e algo que ninguém quer nomear.
Noah
— Ele te magoou? — perguntei a Dante naquela noite, com os dedos trêmulos sobre a xícara quente.
Ele me olhou de canto, os olhos escurecidos por lembranças que eu não conhecia.
— Ele me deixou — respondeu, simples.
— Você o amava?
Silêncio.
E então:
— Como um homem ama outro homem quando o mundo inteiro diz que é errado.
Meus lábios secaram.
Porque, por mais que eu tentasse ignorar, algo dentro de mim também ardia por ambos.
Dante era sombra, calor e perigo.
Julián era controle, honra e silêncio.
E eu... estava me afogando no meio deles.
Julián
Naquela noite, bebi mais do que deveria. Revirei o celular cinco vezes. Toquei a tela, abri a imagem de Noah na audiência.
O rosto dele, quando me olhou pela primeira vez, estava gravado em mim.
Fechei os olhos. Imaginei seus dedos sobre os meus. Seus olhos perdidos nos meus.
Minha mente me traiu: por um segundo, foi Dante quem apareceu atrás de Noah, puxando-o pela cintura, sussurrando algo em seu ouvido.
E os dois... me olhando.
Meu coração acelerou. Minha pele ardeu.
E eu soube.
A verdade cruel e inevitável.
> Eu nunca parei de amar Dante.
E agora... estou começando a amar Noah também.
Isso não é amor. É loucura.
Mas talvez, só talvez...
A loucura seja o único lugar onde nossos três mundos possam se encontrar sem ruir.
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Atualizado até capítulo 30
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