A mãe do Don

Narrado por Giulia

— Lorenzo, vem jantar com os meninos! — gritei do corredor, sem nem me importar com o tom. Sabia que ele estava lá dentro com os dois, provavelmente fingindo que ainda manda em alguma coisa, enquanto os filhos se afundavam no uísque e no sarcasmo.

— Estou indo, amor! — ele respondeu.

Sorri sozinha. Quando Lorenzo me chama de “amor” com essa voz meio cansada, é porque sabe que vai levar um sermão ou porque está escondendo algo. E, conhecendo meu marido como eu conheço, era um pouco dos dois.

Os três vieram rindo, com aquele jeito clássico deles. Enrico com a cara de quem carrega o mundo nas costas, Domênico com a expressão debochada e Lorenzo fingindo seriedade.

Quando todos se sentaram, mandei a governanta servir o jantar e me acomodei à mesa, com as mãos cruzadas no colo. Esperei alguns segundos, observei o Enrico em silêncio, e então falei:

— Enrico, precisamos conversar sobre a Melissa.

Ele ergueu os olhos, meio desconfiado, como se já esperasse por aquilo.

— O que tem a minha adorável futura esposa agora?

— Você precisa tentar se aproximar dela com carinho. Mandar flores. Levar joias. Mostrar que está disposto a conquistá-la. Ela não é uma prisioneira, é sua noiva.

Ele soltou uma risada abafada, pegando o copo de vinho.

— Ela não é uma mulher, mamãe. Ela é o demônio.

Domênico caiu na gargalhada, quase engasgando com o pão. Lorenzo também riu, mesmo tentando manter a pose.

— Eu tô falando sério, Enrico — avisei, olhando firme.

Ele também ficou sério.

— Eu também, mãe. Aquela garota tentou me matar só com o olhar. E ainda tentou fugir da casa do próprio pai. Eu posso até tentar ser gentil, mas não sou mágico. Nem padre exorcista.

Suspirei fundo e apoiei os cotovelos na mesa.

— Por que, com tantas mulheres no mundo, vocês prometeram justamente aquela maluca pra mim? — ele continuou. — Por quê?

Lorenzo tomou um gole de vinho, ajeitou os punhos da camisa e respondeu como se estivesse explicando o tempo:

— Porque ela é a mulher certa.

Domênico jogou o guardanapo na mesa, rindo.

— Pra matar ele, né?

— Domênico! — chamei a atenção. — Vai chegar a sua vez de casar. E na hora que seu pai escolher, eu espero que seja uma mulher melhor… porque, com esse seu jeito debochadinho, ela vai se irritar e quebrar a sua cara.

Ele me olhou com uma mistura de susto e humor.

— Você vai escolher com quem eu vou casar também?

Lorenzo riu, como quem achava aquilo uma pergunta engraçada.

— Claro, meu amor. Eu vou planejar o melhor acordo político possível pra você. Não se preocupe, papai ainda não te prometeu pra ninguém.

Enrico não segurou a gargalhada.

— Você tá tão ferrado quanto eu, maninho.

— Eu só vou me casar aos trinta — retrucou Domênico, virando a taça.

— Claro que não — respondi. — Eu e seu pai queremos viajar o mundo, e precisamos te deixar encaminhado com uma mulher cheia de verrugas na cara e, de preferência, com sessenta anos.

Os dois riram. Até Lorenzo sorriu.

Olhei para o Enrico de novo e falei com a voz mais delicada que pude:

— Enrico, eu vou convidar a Melissa e a família dela para jantarem conosco amanhã. Nós sempre nos demos muito bem com Matteo e Aurora. Eles são seus padrinhos, afinal. E acho que chegou a hora de fazer a paz reinar entre vocês.

Domênico arqueou a sobrancelha, cínico.

— Vai ser mais fácil o Oriente Médio ficar em paz.

— Não fala besteira, menino — retruquei, dando um beliscão no braço dele. — A Melissa só está assustada. Você estaria também se alguém te dissesse que vai se casar com uma pessoa que você mal conhece.

— Ela me conhece, sim. Me odeia desde que tem idade pra andar.

— E você nunca fez esforço pra mudar isso — rebati. — Vocês cresceram em festas de família, em jantares, viagens... e você sempre foi ríspido, seco. Ela aprendeu a te odiar porque você ensinou isso a ela. Mas ainda dá tempo de mudar. De mostrar quem você é de verdade.

Enrico se recostou na cadeira, olhando pro teto como se eu estivesse pedindo que ele escalasse o Monte Everest com uma flor na boca.

— Mãe… ela não quer ser conquistada. Ela quer me esfaquear.

— Mas toda mulher tem um lado doce — insisti. — Mesmo a Melissa. Principalmente ela. Você só precisa acessar isso.

— Com senha e reconhecimento facial, talvez?

— Com paciência. E presença. Mande flores. Leve um colar. Converse. Olhe nos olhos dela. E, por favor, não a trate como se estivesse fazendo um favor por casar com ela.

Lorenzo assentiu em silêncio. Domênico apenas mastigava, se divertindo mais com a situação do irmão do que com o jantar.

— E se ela continuar querendo fugir?

— Aí você vai atrás — respondi, simples. — É o mínimo.

A governanta serviu o prato principal e todos se calaram por alguns instantes. O cheiro de massa fresca e vinho preencheu a sala. A mesa, como sempre, estava impecável. Mas o ar... ainda carregava tensão.

— Amanhã será importante — continuei. — Vai ser o primeiro encontro depois de tudo. Eu quero que ela se sinta segura. Acolhida. Não ameaçada.

— Posso levar colete à prova de balas? — Enrico resmungou.

— Pode, desde que vá com flores na outra mão.

Domênico riu outra vez.

— Posso levar minha câmera? Vai ser lindo ver vocês dois fingindo que se toleram.

— Você vai ficar calado, isso sim — falei. — Um comentário atravessado e eu mesma coloco você pra jantar com a babá.

Lorenzo limpou a boca e, enfim, falou:

— A Melissa é uma força da natureza. Indomável, intensa, explosiva. Mas é exatamente disso que a nossa família precisa. De mulheres fortes. A Aurora é assim. Você, Giulia, é assim. Não quero ao lado do meu filho uma boneca moldável. Quero alguém que esteja à altura do trono que ele vai ocupar.

— Não sei se quero esse trono — Enrico murmurou, quase num desabafo.

— Você vai querer, meu filho — eu disse. — Só ainda não entendeu o quanto nasceu pra ele.

Olhei para os dois. Meus filhos. Diferentes, mas tão parecidos em essência.

Domênico fingia que não ligava pra nada, mas era puro coração. E Enrico... era só um menino preso em um destino muito maior do que ele podia controlar.

— Agora comam — falei, me levantando. — E amanhã, eu espero ver você, Enrico, sendo gentil com a sua noiva. Porque se você errar o tom... eu mesma vou puxar tua orelha no meio do jantar.

Ele ergueu as mãos como quem se rendia.

— Sim, senhora.

E por um segundo… eu vi aquele menino de oito anos que uma vez trouxe uma rosa roubada do jardim e disse que era pra mim. Ele ainda estava ali. Em algum lugar. Escondido debaixo da armadura do futuro Don.

E talvez, só talvez… Melissa fosse a única capaz de encontrá-lo.

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Comments

Renata

Renata

obedeça sua mãe enrico
porque se não o cartigo vai ser grande

2025-06-29

2

Maria Zelia

Maria Zelia

essa família continua linda, e Giulia bota eles no prumo.

2025-07-04

0

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