CAPÍTULO 1

O quarto de Beatrice cheirava a lavanda, tinta guache e infância.

Ela tinha seis anos e usava uma coroa de papel feita por Lorenzo, colada com fita e orgulho. Estava sentada no chão, cercada por bonecas desalinhadas, canetinhas sem tampa e um urso de pelúcia que vestia um avental de pizzaiolo.

— Alteza, aceita mais um pedaço da pizza mágica? — perguntou David, com cinco anos, o guardanapo enfiado no colarinho como se fosse uma gravata.

Beatrice cruzou os bracinhos, empinou o queixo.

— Só se tiver chocolate com morango. E com a borda muito recheada, senão não vale.

— Tem borda! — ele respondeu, rindo. — Eu coloquei até chantilly na borda. Mas não conta pra ninguém.

Eles riram alto. Riam fácil naquela época. O mundo era um jardim com cheiro de orégano e som de violino ao fundo, onde Ana às vezes tocava só pra ver os filhos dançando desengonçados, derrubando almofadas e tropeçando em brinquedos.

Lorenzo entrou no quarto, com a camisa suja de farinha, e parou na porta como se tivesse dado de cara com um tesouro escondido.

— O que minha princesa está aprontando?

— Tô mandando no mundo. — Beatrice disse, com a fita da coroa torta sobre a testa e a pose de quem tinha nascido para isso.

Ele se ajoelhou diante dela, com um exagero teatral que arrancou risadinhas de David.

— Então permita que seu fiel humilde servo beije sua mão.

Beatrice estendeu a mãozinha e sussurrou com toda solenidade:

— Só se depois você me der sorvete.

— De pistache? — ele sorriu.

— De morango. Pistache é verde esquisito.

David fingiu cair de costas de tanto rir. Lorenzo beijou a mão da filha como se estivesse diante de uma rainha. E por um segundo, naquele instante bobo e sagrado, tudo parecia eterno.

Mesmo os irmãos mais novos — Thomas, Lucas e o pequeno Jacob — ainda pequenos demais pra entender, pareciam ter nascido com a missão silenciosa de cuidar da Beatrice. Como se o coração da casa tivesse o nome dela escrito no teto.

A infância dela era feita disso

De pizza no café da manhã (quando Ana não via), de desenhos rabiscados na parede da sala, de dias em que Lorenzo a levava para a pizzaria só pra ela “fiscalizar a massa”.

De noites em que Ana deitava ao seu lado e lia histórias de mulheres que mudaram o mundo algumas reais, outras inventadas na hora.

— Princesas também sabem lutar — dizia Ana. — E as melhores vencem com palavras.

Beatrice acreditava em tudo. E repetia as frases em frente ao espelho, com a escova de cabelo como microfone:

— Eu vou defender o mundo inteiro! Mesmo que seja só com as palavras.

Quando Yasmin Entrou Na Vida Dela

Beatrice tinha sete anos e um fichário com capa roxa, cheio de adesivos de coroa e canetas coloridas organizadas por tom. Estava na fila da biblioteca da escola quando uma menina baixinha, de cabelo preso em duas tranças apertadas, passou direto.

— Ei, eu tava aqui — Beatrice disse, não gritou, mas também não se moveu.

A menina virou com o queixo empinado.

— Eu só vou pegar “Matilda”. É meu livro preferido.

— É meu também — Beatrice rebateu. — E hoje é meu dia da sorte. Eu sonhei com esse livro.

As duas se encararam por três segundos. Depois, como se tivessem feito um pacto silencioso, começaram a rir.

Na semana seguinte, estavam fazendo um cartaz juntas pro clube de leitura. Pouco depois, Yasmin já passava tardes na casa dos Moretti, comendo pizza de sorvete e se escondendo do Thomas, que insistia em ser o “juiz das brincadeiras”.

Helena virou sua irmã escolhida. Daquelas que ouve, que analisa, que guarda segredo como quem guarda joia.

Helena apareceu como um furacão

Foi no dia da apresentação da escola. Beatrice estava no palco recitando um poema que ela mesma escreveu sobre justiça. Falava de igualdade, de coragem, de empatia. Usava um vestido azul-marinho e segurava o papel com as duas mãos tremendo.

No meio do silêncio, uma voz da plateia interrompeu:

— Lê de novo! Essa parte foi perfeita!

Era uma menina com cabelos loiros e meias coloridas. A sala caiu na risada. Beatrice corou até a ponta da orelha. Mas sorriu.

No intervalo, a mesma menina surgiu com um suco na mão.

— Você fala como gente grande. E eu gostei disso. Quer ser minha amiga?

Beatrice arqueou uma sobrancelha.

— Só se você souber brincar de protesto com cartaz.

Helena deu um pulo:

— Eu tenho um estojo só de glitter pra isso!

Desde então, elas estavam coladas. Yasmin era exagero, cor, riso alto. O tipo de amiga que falava o que ninguém tinha coragem. E Beatrice? Era o equilíbrio perfeito. Entre elas, tudo fazia sentido.

A adolescência chegou como um trovão

Aos treze, Beatrice já discutia argumentos com a mãe no jantar.

Aos quinze, leu seu primeiro processo escondido e devolveu com anotações.

Aos dezessete, escreveu um artigo que Ana usou numa palestra sobre ética e juventude no direito.

Ela era a filha mais velha. Mas era também a bússola da casa.

David confiava nela mais do que em si mesmo. Thomas pedia conselhos antes de contar qualquer segredo. Lucas chorava escondido no colo dela. E Jacob... bem, Jacob acreditava que a irmã era uma super-heroína de verdade.

Sofia, mesmo longe, participava de tudo por video-chamada. Riam, choravam, jogavam jogos online, compartilhavam playlists e confidências que só elas entendiam.

E entre uma fase e outra, elas criaram um grupo: "As Quatro da Justiça".

Era ali, entre áudios longos, emojis e promessas de reencontros, que Beatrice encontrava o tipo de amor que não se explica só se vive.

Na noite dos seus dezoito anos, a varanda estava cheia de luzinhas penduradas, e uma mesa de madeira com flores do campo exalava simplicidade e afeto.

Ana levantou a taça de vinho.

— À minha filha. Que nunca se esqueça que nasceu do amor, mas é feita de coragem.

Lorenzo completou, segurando a mão dela:

— Que construa seu império. E que saiba, onde quer que vá, terá sempre um lar pra voltar.

Beatrice, de vestido vinho e olhos marejados, sorriu. E pensou:

"Agora começa a minha história."

Vestido da Beatrice:

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