O caderno de capa preta não era apenas um diário. Era uma cápsula do tempo.
Naquela tarde, depois de deixarem a caverna onde haviam encontrado os pertences escondidos, Jhenifer e Luca seguiram direto para o pequeno quarto que ele mantinha nos fundos da casa da avó. Era um espaço apertado, com uma janela alta que deixava entrar apenas um fio de luz, mas tinha um ar de refúgio — o tipo de lugar onde o mundo parecia distante. Ali, rodeados por pilhas de livros antigos e fotografias em preto e branco, poderiam analisar o que haviam encontrado com calma e, principalmente, longe de olhos curiosos.
Jhenifer se sentou na beirada da cama, segurando o caderno com as duas mãos. Os dedos hesitavam em abrir a capa. Parecia invasivo, quase desrespeitoso, mergulhar nos pensamentos de alguém que havia desaparecido. Mas, no fundo, ela sentia: Ana Sofia queria ser lida. Suas palavras eram pistas. Um pedido de socorro velado.
— Está pronta? — perguntou Luca, ajoelhada ao seu lado, com o olhar fixo no diário.
Ela respirou fundo e assentiu.
As primeiras páginas continham rabiscos comuns: datas, relatos triviais sobre a escola, reclamações sobre professores exigentes, reflexões soltas. Mas, à medida que avançavam, o tom das anotações ganhava tensão. Algo se escondia nas entrelinhas.
“Comecei a notar movimentações estranhas no colégio. Reuniões noturnas. Portas trancadas que antes ficavam abertas. Não é paranoia. Tem algo errado aqui.”
“Encontrei um pen drive atrás do armário da história. Arquivos criptografados. Vou tentar decifrar.”
“Conversei com R. Ele também desconfia. Disse que não é só sobre dinheiro. É sobre pessoas.”
Luca parou a leitura bruscamente. Os olhos marejaram e ele fechou o punho com força.
— R. murmurou, quase para si mesmo. — Esse era o apelido do meu irmão com Ana.
Jhenifer virou-se, surpresa.
— Seu irmão estava envolvido nisso?
Luca assentiu, com um peso nos ombros, que parecia mais velho que ele.
— Eles eram próximos. Mas ele nunca me contou nada. Só… desapareceu, depois de uma discussão com o diretor. Minha família sempre achou que ele foi embora por escolha própria. Mas agora... agora tudo começa a fazer sentido.
O quarto pareceu encolher. O ar ficou mais denso. Um silêncio desconfortável os envolveu, até que Jhenifer folheou o diário até uma página onde algo chamou sua atenção: um pequeno pen drive preso com fita adesiva envelhecida.
— É esse? — perguntou ela, erguendo o dispositivo.
Luca assentiu com firmeza e ligou o notebook. As mãos tremiam ao conectar o pen drive. O vídeo iniciou com ruídos abafados e uma imagem desfocada. Então, Ana Sofia surgiu na tela. Estava sozinha, num lugar escuro. Os olhos vermelhos e cansados.
“Se vocês estão vendo isso, é porque algo deu errado. Porque não consegui terminar o que comecei.”
“O que está acontecendo nessa escola vai muito além de provas trocadas e alunos favorecidos. Tem gente sumindo. Tem chantagem. Tem medo.”
“E o pior… não sei mais em quem confiar. Nem entre os professores. Nem entre os alunos.”
“Se algo acontecer comigo, olhem nas conchas. Lá estão as provas.”
O vídeo terminou em silêncio.
Luca e Jhenifer se entreolharam. A respiração dos dois parecia presa no peito. Ali, naquele quarto abafado, sabiam: estavam entrando em algo muito maior do que podiam imaginar. E não havia mais volta.
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Atualizado até capítulo 30
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