Se tem uma coisa que aprendi nos primeiros dias naquela casa enorme foi: silêncio demais é sempre sinal de que algo tá prestes a explodir.
Meu padrasto vivia ocupado, minha mãe tava mais preocupada com eventos sociais do que comigo, e Nick… bom, Nick simplesmente sumia. Às vezes à noite, às vezes durante o dia. Ele aparecia e desaparecia como se fosse feito de fumaça. E, quando aparecia, era só pra jogar umas frases afiadas e me deixar com o coração batendo rápido e o orgulho todo embaralhado.
Na manhã de quinta, resolvi fazer o que qualquer garota com tempo livre e curiosidade demais faria: espionar.
Peguei uma mochila pequena, coloquei um boné, fones de ouvido (de enfeite mesmo, nem liguei) e saí andando pelas ruas próximas da mansão. A segurança ali era grande, mas não impossível de furar. E meu objetivo era claro: descobrir o que Nick tanto escondia.
Já tinha percebido que ele saía sempre depois do pôr do sol. De moto. Uma máquina preta com detalhes vermelhos, barulhenta, agressiva e linda. Dava pra ouvir o motor rugindo da janela do meu quarto, e aquele som... sei lá. Era tipo um chamado. Um desafio.
Naquela noite, esperei ele sair.
Fiquei sentada perto da piscina, disfarçando com um livro aberto no colo. Quando ouvi o motor, meu coração deu aquele pulo. Levantei na hora. Ele passou por mim sem nem olhar, capacete na mão, jaqueta de couro aberta no peito, tatuagens à mostra. Subiu na moto como quem já nasceu em cima dela. E quando ligou o motor... mano, que cena. Quase cinematográfica.
Esperei uns dois minutos e fui atrás.
Chamei um carro por aplicativo e pedi pro motorista seguir a moto preta. O cara me olhou esquisito, mas nem questionou. Só disse:
— Esse aí corre, hein?
— E eu corro atrás — respondi, com um sorriso torto.
A gente seguiu pela Zona Sul, cortando bairros chiques e becos escondidos, até que ele entrou numa estrada meio deserta, que levava pra uma área industrial abandonada. O lugar parecia cenário de clipe underground: grafites nas paredes, cheiro de óleo queimado, luzes neon improvisadas e... motos. Muitas motos.
Meu motorista parou uns metros antes. Eu desci, paguei rápido e fui andando devagar. O chão vibrava com os motores. Jovens se espalhavam pelos cantos, com copos na mão, cigarros nos lábios, celulares gravando tudo. Era um submundo vibrante, barulhento e perigoso. E Nick tava no meio dele. No centro. Como se fosse rei daquele caos.
Ele tava encostado na moto, conversando com dois caras e uma garota de cabelo azul, que tava claramente querendo mais do que conversa. Senti uma pontada estranha. Inveja? Ciúme? Não, claro que não. Eu só tava... observando.
Cheguei mais perto, misturada na galera. Ninguém me notou. Até que a garota azul passou a mão no braço dele e ele virou na direção dela, mas não sorriu. Só afastou devagar, com aquele olhar frio que eu já conhecia.
Foi aí que ele me viu.
Os olhos dele encontraram os meus no meio da multidão como se já soubessem exatamente onde procurar. Um segundo congelado. E então ele veio andando até mim, devagar. A galera abriu espaço sem ele pedir. O som dos motores pareceu diminuir só pra dar espaço pro silêncio tenso entre nós.
— Achei que você era curiosa, mas não suicida — ele disse, parando na minha frente.
— E eu achei que você era só um babaca metido a bad boy. Mas parece que é um pouco mais complexo que isso.
Ele inclinou a cabeça.
— O que você tá fazendo aqui, Noah?
— Seguindo o barulho. E, sinceramente, era óbvio que você escondia alguma coisa.
— Isso aqui não é lugar pra você — ele disse, com a voz mais baixa, quase brava.
— Por quê? Porque eu sou a filha da esposa do seu pai rico? — perguntei, cruzando os braços. — Porque eu não tenho tatuagens e não fumo?
Ele deu um meio sorriso.
— Não. Porque aqui é onde as regras somem. E eu gosto quando elas somem. Mas não quero você nesse meio.
— Você não manda em mim, Nick.
— Ainda não — ele murmurou.
Engoli em seco.
— E o que você faz aqui? Corre? Ganha dinheiro? Se mata aos poucos?
Ele me encarou, sério.
— Eu vivo. Aqui é onde eu sou de verdade. Onde ninguém me enxerga como “filho do magnata” ou “o problema da família perfeita”.
— E o que você vê em mim?
Ele deu um passo à frente. Agora, a gente tava tão perto que o calor da pele dele misturava com o meu.
— Você é problema. Novo. Brilhante. Teimoso. E perigoso pra mim.
— Então a gente tá empatado — falei, quase sem ar.
Ele sorriu, mas os olhos estavam escuros.
— Vai embora, Noah. Antes que fique tarde demais.
— Tarde pra quê?
Ele não respondeu.
Virou as costas e voltou pra moto.
O pessoal começou a se movimentar, preparando o início da corrida. Vi as motos alinhadas, o chão tremendo, o cheiro de gasolina e adrenalina no ar. Nick subiu na dele com a postura de quem já sabia que ia vencer. E quando o sinal improvisado foi dado, ele saiu como um raio.
Eu assisti tudo. Fiquei ali parada, hipnotizada, com o coração na garganta. Era perigoso. Era doido. Era errado.
Mas meu Deus... como era lindo.
Quando a corrida acabou, ele voltou ofegante, tirou o capacete e veio direto pra mim. Suado, com os olhos brilhando de adrenalina.
— Última vez que você vem aqui, Noah. Eu não tô brincando.
— E se eu quiser voltar?
— Então você vai descobrir o que significa cruzar o limite.
— Que limite?
Ele sorriu.
— O meu.
E foi embora.
Me deixando ali.
Sozinha.
Ofegante.
E completamente perdida entre a raiva e o desejo.
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Atualizado até capítulo 40
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