## 🌑 Capítulo 2 – O Guardião
No dia seguinte, a luz do sol me pareceu falsa. Branda demais. Como se estivesse mentindo pra mim.
Acordei com a lembrança da noite anterior queimando por trás dos olhos. Não foi um sonho. A marca ainda estava lá. Discreta agora, mas visível. Um símbolo que parecia pulsar junto ao meu coração, como se tivesse vida própria.
Evitei o espelho. Não queria ver nos meus olhos o que eu já sabia: eu não era mais só Mary, a garota curiosa da vila.
Fiquei horas tentando entender o que havia acontecido. A criatura, a marca, aquele garoto chamado Bryan — e sua espada feita de escuridão. Tudo parecia saído de um pesadelo misturado com as histórias antigas que minha avó contava quando eu era criança. Só que agora... era real.
No fim da tarde, minha inquietação venceu o medo.
Peguei meu casaco, enfiei o capuz, e saí. A floresta parecia me chamar de novo. Cada passo que eu dava em direção a ela trazia um arrepio, mas eu não hesitei.
Fui até a mesma clareira.
E ele estava lá.
Bryan.
Como se nunca tivesse saído dali. Como se soubesse que eu voltaria.
Ele estava encostado em uma árvore, os braços cruzados. Assim que me viu, se endireitou, mas não falou. Apenas me observou. Seu olhar tinha o peso de quem carrega segredos demais.
— Então... tudo aquilo era verdade — falei, tentando não deixar minha voz vacilar.
Ele assentiu devagar.
— Eu queria que não fosse.
Silêncio.
— O que foi aquilo? A criatura. A marca. Você?
Ele deu um passo à frente, com cautela. Como se se aproximar de mim exigisse cuidado.
— Aquilo que te atacou foi um servo da sombra pura. Uma criação de Malcor.
— E quem é Malcor?
— Um antigo Guardião. Como eu.
O modo como ele disse "como eu" me fez congelar.
— Então... você é um deles?
— Não mais — respondeu, a voz firme. — Eu abandonei a Ordem quando descobri o que estavam fazendo.
— E o que estavam fazendo?
Ele hesitou, o maxilar tenso.
— Caçando os marcados como você. Destruindo o equilíbrio em nome do controle.
A palavra “caçando” fez meu estômago virar.
— Por quê?
— Porque vocês têm o poder da luz dentro de si. E isso ameaça todos que escolheram viver nas sombras.
Olhei para meu pulso. A marca parecia responder, latejando sob a pele.
— E por que você me salvou? Por que não me entregou?
Ele me encarou então, como se estivesse vendo algo muito mais profundo do que minha aparência.
— Porque quando te vi... algo dentro de mim silenciou.
Meu coração deu um salto. Quase me esqueci de respirar.
— Silenciou?
— Pela primeira vez, em muito tempo, eu não senti a escuridão me puxar.
Eu não sabia o que responder. Então fiquei quieta. Apenas o observei.
Bryan parecia ter uns vinte anos, talvez um pouco mais. Havia algo selvagem nele, e ao mesmo tempo... quebrado. Como se vivesse em guerra consigo mesmo. Ele era sombra e silêncio, e ainda assim, me fazia sentir segura.
— Você está em perigo agora, Mary. Depois do que aconteceu ontem, vão vir atrás de você.
— Eles... quem?
— Os Caçadores da Ordem. Eles vão sentir o despertar da sua luz. E não vão deixar você escapar.
O frio tomou conta de mim. Bryan deu mais um passo.
— Mas eu posso te proteger. Se você confiar em mim.
— E por que eu confiaria?
Ele ficou em silêncio por um segundo. Depois, se aproximou o bastante para que eu visse a marca escura em seu próprio pulso.
Igual à minha.
Mas invertida. Como se fosse o reflexo em um espelho.
— Porque estamos ligados — disse ele. — Desde antes de nos encontrarmos.
A noite caiu sobre nós como um véu.
E naquele instante, pela primeira vez, eu me perguntei:
Será que tudo o que me ensinaram até agora… era mentira?
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Atualizado até capítulo 26
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