Capítulo 2 — Pessoas distintas, almas gêmeas.

...Miguel González ...

— Miguel, desculpe o atraso. Estava ajudando minha mãe com os papéis do divórcio — ela disse, sorrindo enquanto se sentava na cadeira à minha frente.

— Divórcio? — perguntei, tentando puxar assunto e conhecer melhor a garota que ocupou meus pensamentos durante a última semana.

— Ah, sim — suspirou. — Meus pais estão se separando — falou com uma expressão neutra.

— Mas… você está bem com isso? — sondei, querendo entender como ela se sentia diante de toda aquela situação complicada.

— Sim. Na verdade, estou até aliviada. Meus pais nunca se amaram. Esse casamento foi arranjado pelo meu avô.

Julia parecia mesmo aliviada. Seu olhar estava mais brilhante que o de costume, talvez por sentir algum tipo de libertação. Ainda assim, algo naquela expressão me dizia que o passado tinha deixado marcas.

— Eles não se davam bem? Ou não eram muito presentes pra você? — quis entender melhor como era o relacionamento dela com os pais.

— Muito pelo contrário. Eles sempre foram ótimos comigo, muito carinhosos. Mas não pareciam um casal… eram só amigos. Meu pai vive viajando a trabalho, mal para em casa. E quando está, só fala de negócios. Eles nem dormiam no mesmo quarto.

Minha mãe sempre idealizou um casamento por amor. Era difícil vê-la triste, como se a ilusão que criou tivesse se quebrado.

Segurei sua mão, que estava sobre a mesa. Ela baixou o olhar, pensativa. Senti tristeza pela mãe dela, que viveu um relacionamento vazio, e por ela, que cresceu no meio disso tudo.

— Eles esperaram muito tempo para tomar a decisão de se divorciar. Achavam que eu reagiria mal… mas estou realmente bem com isso. No fim, sempre foi só eu e a mamãe mesmo — disse com um certo pesar.

Ela tentou sorrir para quebrar o clima, mas mesmo que disfarçasse, eu percebi. Talvez ela esteja em paz com a separação, mas ainda não superou a ausência do pai.

— Vamos fazer os pedidos? Que tal uma torta de limão? Você já provou a daqui? É muito boa — falei, tentando mudar o assunto e animá-la um pouco.

Ela sorriu. Não importa quantas vezes eu veja esse sorriso... ele ainda parece mágico como da primeira vez.

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Depois de fazermos os pedidos, resolvemos conversar um pouco para nos conhecermos melhor.

— Então… você me falou sobre os seus pais, mas não tem irmãos ou algum parente mais próximo? — perguntei, demonstrando interesse.

— Não tenho muito vínculo com a família da minha mãe. Ela brigou feio com meu avô há muitos anos e, até hoje, eles mal se falam. Já com a família do meu pai... é complicado. Meus avós paternos morreram há muito tempo. Tenho um tio, uma tia e alguns primos, mas são todos interesseiros e presunçosos. Entendo por que meu pai não gosta de estar perto deles — ela revirou os olhos ao falar da família. Dava para sentir o desgosto daqui.

— Porém, eu tenho um irmão mais velho. Ele é filho do meu pai, de antes do casamento. Somos bem próximos. Atualmente, ele mora na Inglaterra. Estuda Medicina lá, então não temos muito tempo para conversar — seus olhos brilharam ao falar dele. Ela tem muito orgulho do irmão.

Sua expressão mudou, e com curiosidade ela me perguntou:

— E você? Como é a sua família?

— Não é muito grande. Meus avós paternos já são falecidos. Não tenho tios ou primos, mas tenho a dinda Vitória — ela é prima do meu pai.

— E os seus pais? Sua família materna? — ela se inclinou na minha direção, demonstrando interesse e me dando toda a sua atenção.

— Meu pai é incrível. Ele me criou sozinho. A mulher que me gerou me abandonou quando eu nasci. Ela não estava preparada pra ser mãe… ainda bem que meu pai, pelo menos, tentou — dava para sentir o amargor na ponta da minha língua. Acho que ela sentiu também, porque sua expressão se apagou.

— Eu sinto muito. Acho melhor a gente falar sobre gostos… quando se trata de família, não temos os melhores assuntos — ela soltou uma risada leve para mudar o clima, e conseguiu. Por algum motivo, eu fico hipnotizado por aquele sorriso.

Nossos pedidos chegaram e agradecemos ao garçom. Ela deu uma garfada grande na torta e, depois de provar, fez uma cara de felicidade, como uma criança em um parque de diversões.

— Eu ia perguntar se você prefere doce ou salgado, mas acho que já sei a resposta — disse. Ela me encarou com um olhar sugestivo, como se me desafiasse a adivinhar mais sobre ela. Então aceitei o desafio.

— Entre amargo, azedo e picante, você deve preferir azedo. Gosta mais do dia do que da noite e aprecia a primavera. É espontânea, então deve gostar de dançar, viajar e fazer amigos. É ousada e gosta de tomar iniciativa, mas sem forçar demais. Acertei?

Ela me olhou com mais intensidade e o sorriso sutil cresceu, evidenciando suas covinhas. Pelo jeito tímido com que me olhou, devo ter ido bem… ou chegado bem perto disso.

— Você é bom. Acertou quase tudo. Tirando a parte de fazer amigos, você me descreveu bem. Apesar de ser uma garota espontânea, como você disse, prefiro um círculo pequeno de amizades. Gosto de ficar na minha.

Mas… e você? Como você é? Só sei que é um pouco antissocial e que ama ler.

— Está certa. Pega tudo o que eu disse sobre você… eu sou o extremo oposto. Adoro comida picante, a noite e o inverno. Sou péssimo na dança, mas amo música. Na verdade, além de nadar, não curto nada que me faça me movimentar demais. Gosto de passeios, mas prefiro estar em casa. Sou um pouco fechado e normalmente não tomo iniciativa.

Mas o meu segredo… é que sou bom em ler as pessoas. É uma habilidade — sussurrei essa última parte como se fosse algo extremamente secreto.

— Então por que não trabalha pro FBI? — ela respondeu, divertida, no mesmo tom.

Gargalhamos juntos e passamos a tarde trocando piadas e descobrindo mais um sobre o outro. Mesmo sendo bem diferentes, temos muito em comum. Foi um encontro maravilhoso. Julia é encantadora.

Levei-a até em casa no fim da tarde e depois segui para a minha. Não consigo esconder a alegria — nem a ansiedade — pelo dia de amanhã. Vou levá-la à faculdade.

Já deitado na cama, mandei mensagem para o Matheus contando como foi o dia. Ele, claro, me zoou, dizendo que eu estava apaixonado. E… eu não posso negar. Acho que estou mesmo.

Ele me deu os parabéns por “desencalhar”.

Revirei os olhos para o celular, desliguei a tela e fiquei olhando para o teto, feito um maluco... até adormecer.

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