Capítulo 1 - Ecos da escuridão

Acordei assustada.

Tudo não passava de um sonho.

Um sonho absurdamente real.

Mesmo sabendo que era apenas isso, Selene Lancaster ainda conseguia sentir o peso da água ao seu redor, o impacto das ondas, o vento bagunçando seus cabelos enquanto despencava do céu... e a força invisível que a puxava em direção ao estranho de cabelos cor de fogo.

Desde que se mudou para Londres com sua família, Selene vinha tendo sonhos assim. Às vezes, eram sonhos quentes - o que ela atribuía ao fato de não fazer sexo havia uns seis meses, desde que se formou na universidade. Mas, com o tempo, os sonhos se tornaram pesadelos aterradores.

Pesadelos onde se via pendurada pelas mãos, amarrada nas vigas de um teto escuro, enquanto um homem alto de olhos dourados a torturava. Ele queimava sua pele com o atiçador de uma lareira, ou cortava sua carne com a lâmina fria de uma adaga, evitando sempre as artérias principais - prolongando a dor, se divertindo com seus gritos.

Felizmente, Selene tentava esquecer esses pesadelos. Alguns desapareciam com facilidade, como poeira levada pelo vento.

Ela suspirou e olhou o relógio ao lado da cama. Eram cinco da manhã.

- Que ótimo... - murmurou. - Com certeza gritei. Mamãe deve ter ouvido.

Sua mãe sempre ouvia. Sempre se preocupava.

Às vezes, até demais.

Era sufocante a forma como Genevieve Lancaster tentava protegê-la - a ela e às irmãs. Como se ainda fossem crianças. Como se o mundo lá fora fosse uma fera pronta para devorá-las. E talvez fosse.

Selene se levantou e caminhou até o banheiro. Ao acender a luz e encarar o espelho, soltou um suspiro.

- Meu Deus, eu tô horrível.

Seus cabelos estavam embaraçados, arrepiados, e duas olheiras enormes destacavam ainda mais o âmbar dos seus olhos. Desde a mudança para a cidade, ela não dormia bem. Os pesadelos eram constantes, e aquele sentimento estranho de inquietação não a deixava em paz. Vivendo com os músculos sempre tensos, ansiosa, como se seu corpo esperasse... algo.

- Deve ser coisa da minha cabeça - disse a si mesma, com um sorriso nervoso. - Tô ficando louca. Ou pior... ficando igual à minha mãe.

Genevieve dizia ter empatia - aquela habilidade de sentir o que os outros sentem. Selene nunca acreditou nisso. Atribuía tudo à intuição materna. Mas, ultimamente, ela própria vinha sentindo coisas. Sensações inexplicáveis. Vozes dentro da mente que sussurravam para ela se preparar.

Selene abriu o armário atrás do espelho e procurou seu remédio. Desde que contou à mãe que andava dormindo mal, recebeu um frasco de aspirinas e a recomendação de tomar uma antes de dormir.

Ela não tomara naquela noite. Achava que não precisaria. Se enganou.

Achou o frasco, tomou dois comprimidos com o copo d'água que deixava ao lado da pia, e voltou para o quarto.

Logo depois, alguém bateu à porta.

- Lena? Você está bem? - perguntou sua mãe, do outro lado.

Selene foi até a porta, tentando soar tranquila.

- Estou bem, mãe. Não se preocupe.

- Você sempre foi péssima mentirosa. Me diz, o que aconteceu?

- Só outro pesadelo. Mas estou bem, tomei o remédio. Vou conseguir dormir tranquila agora. Por favor, volta a dormir.

Houve uma pausa antes da resposta.

- Tudo bem... Mas amanhã, no café, a gente conversa. Boa noite, filha.

- Boa noite.

Genevieve Lancaster sempre foi uma mulher forte, determinada. Desde pequena, Selene a via batalhar para criar as três filhas. Mas havia segredos. Muitos.

A mãe nunca falava sobre sua infância, nem sobre os próprios pais. Até hoje, Selene não conhecia os avós. Não sabia se estavam vivos, mortos, ricos, pobres. Toda vez que tocava no assunto, a mãe se fechava, ficava tensa.

O pai também era um mistério. Os dois - mãe e pai - pareciam cúmplices de um segredo que as filhas jamais conheceriam.

De volta à cama, Selene se deitou e encarou o teto branco do quarto. Os olhos pesavam; o remédio já fazia efeito.

Mas sua mente ainda gritava perguntas sem respostas.

O que era essa inquietação que sentia?

Essa tensão nos músculos, essa ansiedade constante?

O que estava acontecendo com ela?

Virou o rosto para a janela e viu a lua brilhando no céu escuro, cercada de estrelas. Bem naquele instante, uma estrela cadente cortou o firmamento.

Selene fechou os olhos e fez um pedido.

Quero respostas.

E, com esse desejo, finalmente adormeceu.

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Comments

Sara Niziato

Sara Niziato

cuidado com o que deseja ...

2025-07-05

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