Os dias que seguiram ao beijo foram um vazio cruel.
Aurora esperava um olhar, uma palavra, um gesto — qualquer sinal de que aquilo não havia sido apenas um impulso. Mas Dante Vasconcellos parecia ter apagado aquele momento da memória. E, pior, apagado ela.
Não havia mais bilhetes à mão, chamadas diretas, trocas de olhares. Agora, tudo era repassado por e-mail, por terceiros, com frieza cirúrgica. Quando muito, ele respondia com um “Ok.” seco. Quando a via, fingia que não.
Aurora se questionava se tinha imaginado tudo. Talvez aquele beijo tivesse sido um erro — mas, se foi, por que doeu tanto ser ignorada depois?
Ela tentou abordá-lo no terceiro dia de silêncio. Entrou em sua sala com uma desculpa qualquer sobre um contrato. Ele a olhou por menos de dois segundos.
— Deixe os documentos na mesa. Estou ocupado.
E voltou à tela do notebook como se ela não estivesse ali.
Aurora ficou parada por um instante, esperando algo. Uma explicação. Um traço de humanidade.
Não veio.
Saiu da sala com o coração apertado, engolindo em seco a raiva e a decepção.
—
Na sexta-feira, chegou o convite da gala empresarial. Um evento de prestígio, com a presença da elite do mundo dos negócios. A Vasconcellos Holdings era uma das patrocinadoras — Dante seria o anfitrião.
E ela, como parte de sua equipe de apoio, teria que comparecer.
Aurora hesitou. Não queria dividir o mesmo ambiente que ele. Não depois do que estava vivendo. Mas se ausentar só levantaria suspeitas. E ela não daria esse gosto a ninguém.
—
Na noite do evento, o salão era um espetáculo de elegância. Cristais, veludos, música clássica ao fundo. Aurora usava um vestido preto de seda com costas nuas, simples, mas impecável. Entrou discretamente, tentando ignorar os olhares curiosos dos outros convidados.
Logo avistou Dante.
Ele estava impecável, como sempre, em um terno escuro, rodeado por empresários, investidores e jornalistas. Sorria com aquela educação automática, fria. Era a imagem perfeita do CEO inatingível.
E, como nos últimos dias, fingiu que Aurora não existia.
Ela passou por ele a poucos passos. Ele virou o rosto. Nem um aceno.
Aurora sentiu o estômago revirar.
O que mais a machucava não era o silêncio — era a indiferença. A ausência de qualquer explicação, qualquer resquício de reconhecimento.
Ele a havia apagado. Com a mesma facilidade que apagava um nome de uma lista de contatos.
—
Aurora tentou se distrair. Conversou com colegas, tomou uma taça de espumante, sorriu para câmeras. Mas tudo parecia embaçado. Tudo girava em torno da ausência de um único olhar.
Foi quando o viu com ela.
Alta, loira, deslumbrante. Uma mulher do tipo que parecia feita sob medida para o mundo de Dante. Eles conversavam de perto, riam, trocavam confidências silenciosas.
Aurora não precisava ouvir para entender. Aquela mulher fazia parte de algo que ela nunca compreenderia.
De repente, tudo fazia sentido. O distanciamento. O silêncio. O arrependimento dele.
Ela nunca teve chance.
—
Foi até a varanda, o coração apertado, os olhos úmidos.
Ali, sozinha com o vento frio da noite, Aurora sentiu o peso de tudo o que vinha tentando ignorar. A desigualdade entre eles, a posição que ocupava na empresa, o risco que havia corrido ao sentir algo por um homem como ele.
Um homem que, agora, agia como se ela não fosse nada.
Ela abraçou os próprios braços, lutando contra a vontade de chorar.
— Estúpida — sussurrou para si mesma.
—
Quando a noite terminou, Aurora saiu antes do fim do evento. Não se despediu de ninguém. Nem mesmo de Dante.
E ele, fiel ao novo papel que havia assumido, sequer notou.
Ou, se notou, fingiu que não.
O silêncio dele doía mais do que qualquer palavra.
Mas Aurora prometeu a si mesma: nunca mais deixaria que alguém a fizesse sentir-se tão pequena.
Nem mesmo Dante Vasconcellos.
Na segunda-feira, Aurora chegou à empresa decidida a encarar a semana como se nada tivesse acontecido.
Vestiu sua melhor máscara, aquela que aprendera a construir desde cedo — a de mulher forte, profissional, impenetrável. Mesmo que, por dentro, tudo estivesse em ruínas.
Dante passou por ela no corredor do andar executivo sem sequer desviar o olhar para seu lado.
Era como se fosse invisível.
Aurora sentiu a dor de novo, como uma fisgada aguda no peito. Mas engoliu seco, ergueu o queixo e continuou a andar com firmeza.
No elevador, ouviu dois funcionários comentando baixinho:
— Dizem que a secretária nova do CEO esteve com ele no evento.
— A loirinha?
— Não, a morena… Aurora. Estava linda. Mas depois sumiu cedo. Vai ver ele dispensou.
Aurora sentiu o sangue subir ao rosto, mas manteve a postura.
“Que falem,” pensou. “Eu sei o que vivi. Ele também sabe.”
Mas o orgulho, quando ferido, pesa. E a indiferença de Dante agora era mais cruel do que qualquer humilhação pública.
—
No fim do expediente, Aurora estava organizando documentos na mesa de apoio quando o celular vibrou com uma mensagem de sua mãe:
Filha, o médico ligou. A nova medicação do seu pai será mais cara. Vamos dar um jeito, mas achei que deveria saber…
Aurora fechou os olhos. O salário na Vasconcellos Holdings era bom — mas cada centavo extra era necessário. Não podia se dar o luxo de perder aquele emprego.
Não podia se dar o luxo de se apaixonar por Dante Vasconcellos.
—
Mais tarde, ao passar pela sala de reuniões, viu Dante conversando com um grupo de investidores.
Ele parecia tão no controle. Tão seguro. O CEO impecável que todos reverenciavam.
Aurora, então, entendeu algo com clareza.
Para ele, o que houve entre eles foi um deslize. Para ela, foi um terremoto.
Mas ela não seria o erro dele. Nem a fragilidade que ele apagaria com desprezo.
Decidiu ali que não daria mais nenhum passo em direção àquele homem.
Se ele queria distância, ela lhe daria o infinito.
—
Na manhã seguinte, Aurora entrou na sala de Dante para entregar os relatórios semanais.
— Bom dia — disse, em tom neutro.
Ele nem respondeu.
Ela depositou as pastas sobre a mesa com profissionalismo, sem olhar para ele.
— Os dados do projeto Dália foram atualizados. Estão separados por setor, como o senhor pediu. Boa reunião.
E saiu sem esperar qualquer resposta.
Pela primeira vez em dias, Dante levantou os olhos e a seguiu com o olhar enquanto ela saía.
Não disse nada. Mas seus punhos se fecharam lentamente sobre a mesa.
—
Naquela semana, Aurora mudou.
Não só em postura, mas no olhar. Tornou-se mais firme, mais silenciosa. E, paradoxalmente, mais intocável.
E essa nova versão dela começou a perturbar Dante mais do que ele podia admitir.
Porque agora, quando ele a olhava… ela não o olhava de volta.
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Atualizado até capítulo 44
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