capítulo 3- A Garota Invisível

O corredor principal do Colégio Internacional Bravatares tinha uma acústica peculiar. Tudo parecia ecoar mais do que deveria — passos, cochichos, risos abafados. E naquela manhã de segunda-feira, o som que ecoava mais alto era o do desprezo disfarçado.

A nova aluna havia voltado.

Seus cabelos estavam presos num coque desajeitado. As roupas, apesar de limpas, eram simples demais para os padrões do colégio. Não havia maquiagem em seu rosto, nem celular nas mãos, nem qualquer sinal de interesse em interagir. Caminhava como se quisesse desaparecer, como se cada passo fosse um pedido silencioso para que ninguém a notasse.

Mas todos notavam.

— Quem veste esse tipo de blusa em maio? — zombou uma das meninas do terceiro ano, mal disfarçando o riso ao lado do armário.

— Acho que ela não conhece o conceito de condicionador — murmurou outra, lançando um olhar de cima a baixo.

A garota ouviu. Mas não respondeu. Apenas abaixou a cabeça e apertou os livros contra o peito, como se fossem um escudo frágil entre ela e o mundo.

Edward observava tudo do canto oposto do corredor. Braços cruzados, encostado na parede. Parecia distraído, mas não perdia um único gesto.

Ele não sabia o nome dela ainda.

Sabia apenas que havia chegado na semana anterior, transferida de um colégio público do interior. Disseram que era órfã de mãe, que o pai a havia deixado com parentes distantes. Mas ninguém sabia de verdade. E ninguém se importava o suficiente para perguntar.

A escola era cruel com os fracos. E ela parecia fraca.

Mas Edward sabia que havia uma força perigosa naqueles que se acostumaram a apanhar em silêncio.

**

Na hora do almoço, o refeitório parecia uma vitrine de ostentações: mochilas de grife, celulares de última geração, conversas sobre viagens internacionais e festas em iates.

A nova garota se sentou no canto mais afastado. Pegou seu lanche — um pão embrulhado em papel alumínio e uma caixinha de suco de uva — e começou a comer devagar, olhando para o nada.

Uma maçã foi arremessada em sua direção. Bateu de leve na mesa, rolando até parar perto de sua mão.

Risos.

Ela não reagiu.

Mas Edward viu.

Levantou-se da sua mesa. Não disse nada aos colegas. Apenas atravessou o salão em passos calmos, pegou a maçã da mesa dela, olhou para os dois garotos que haviam rido, e simplesmente jogou a fruta de volta. Não com força, mas com precisão. Ela bateu no centro da bandeja de um deles, fazendo a água do copo cair.

Silêncio.

Todos observaram.

— Isso foi um aviso? — perguntou um dos garotos, tentando parecer desafiador.

— Não — respondeu Edward, com frieza. — Foi um lembrete.

Virou-se, andou até a sua mesa novamente… e naquele dia, pela primeira vez, deixou metade da comida no prato.

**

À noite, de volta à fazenda, ele chegou calado. Subiu direto para o quarto, sem jantar, sem trocar palavras com os irmãos.

Mas Luna, como sempre, sentiu.

Ela foi até lá. Bateu de leve na porta e entrou sem esperar resposta. Encontrou Edward sentado na escrivaninha, encarando o tabuleiro de xadrez como se os peões carregassem dilemas maiores que o próprio mundo.

— Não vai comer? — perguntou com suavidade.

— Não estou com fome.

— Aconteceu alguma coisa?

Ele demorou a responder.

— Estão machucando ela na escola mãe — disse, enfim. — Mas não com tapas. Com palavras. Com olhares. Com desprezo.

Luna se aproximou, parando ao lado dele.

— E você quer protegê-la?

Ele olhou para cima. Seus olhos cinzentos estavam escurecidos por uma indignação contida.

— Eu não quero. Eu vou.

— Por quê?

Edward hesitou. Não tinha uma resposta clara. Não a conhecia. Não sabia seu nome. Só sabia que ela não pertencia àquele mundo cruel, e mesmo assim, tentava sobreviver nele com uma dignidade silenciosa.

— Porque ela é invisível pra todo mundo… menos pra mim.

Luna acariciou seus cabelos, emocionada.

— Então veja por ela. Até que ela consiga ver por si mesma.

**

No dia seguinte, ele a viu novamente.

Estava sentada no mesmo lugar da biblioteca, com os mesmos livros velhos e o mesmo silêncio ao redor. Mas quando Edward passou por ela, desta vez, deixou uma frase solta no ar:

— Você tem um nome?

Ela ergueu os olhos, surpresa. Como se ninguém houvesse perguntado isso antes.

— Isadora.

Edward assentiu.

— Prazer, Isadora. Eu sou Edward.

E continuou andando. Não esperava gratidão. Não queria medalhas.

Mas a partir daquele momento, a garota invisível não estava mais sozinha.

**

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