Cordas Invisíveis

O som dos saltos de Isabella ecoava pelo corredor, marcando um ritmo tão tenso quanto seus próprios pensamentos. Ela apertava os braços contra o corpo, tentando não demonstrar o quanto as mãos tremiam.

"Respira. Controle. Você sempre teve controle."

Quando chegou à recepção, o jornalista já a aguardava, sorrindo educadamente com uma prancheta nas mãos.

— Professora Isabella Monteiro? Que bom te encontrar. Sou Daniel, do Diário Cultural. Vim conversar sobre a apresentação de fim de semestre.

— Claro. — respondeu, com aquele tom educado, elegante, profissional... tão diferente da bagunça que ela era por dentro naquele momento. — Podemos falar aqui mesmo?

Enquanto respondia às perguntas, sua mente estava a quilômetros de distância, vagando de volta para o salão. Mais especificamente, para o corpo de Luna.

A forma como ela se movia... A pele suada, o cheiro, a respiração quente que parecia invadir mais do que o espaço físico.

Isabella apertou a própria caneta contra o bloco que segurava, na tentativa de ancorar-se à realidade.

"Isso precisa parar. Eu não posso, não devo, não quero... quer dizer... não... eu não posso querer."

No salão, Luna girava sozinha, ensaiando a sequência pela terceira vez seguida. Mas os movimentos estavam desconectados. Seus braços iam para um lado, sua cabeça queria outro.

— Droga. — praguejou, chutando o chão.

De repente, sentiu mãos segurarem seus quadris.

— Seus ombros estão tensos. — disse Clara, uma das dançarinas mais antigas da companhia. — Você nunca erra essa sequência. O que tá acontecendo?

Luna respirou fundo, fechando os olhos.

— Não é nada.

— É a professora, né? — Clara arqueou uma sobrancelha, sorrindo. — Vocês duas andam parecendo gato e rato. Dá pra sentir a tensão daqui.

— Tensão? — Luna fingiu rir. — Isso é só... sabe... rivalidade.

Clara cruzou os braços, encarando-a com aquele olhar que atravessava qualquer fachada.

— Luna... todo mundo aqui vê o que vocês duas não querem enxergar. A energia entre vocês não é normal. É... sei lá... é elétrica.

— Você tá viajando. — respondeu, desviando o olhar, mas seu rosto já começava a corar.

"Ninguém pode saber. Nem eu quero saber."

Meia hora depois, Isabella retornava ao salão. Assim que cruzou a porta, os olhos dela encontraram, involuntariamente — ou talvez nem tanto — os de Luna.

E, mais uma vez, aquela conexão invisível se formou.

Ambas fingiram não notar. Fingiram que não sentiam o ar ficando mais pesado, o corpo reagindo, o coração acelerando. Fingiram tão bem que quase acreditaram.

— Da última vez, vocês estavam... quase. — Isabella disse, passando os olhos pela sala, mas detendo-os em Luna. — Vamos tentar de novo.

Luna respirou fundo, caminhou até ela, e quando ficou perto o suficiente, disparou:

— Você vai me derrubar hoje ou vai só me torturar emocionalmente mesmo?

Isabella arqueou uma sobrancelha, cruzando os braços.

— Só se você merecer.

— Então se prepara, porque eu sou bem merecedora.

O olhar das duas se manteve fixo por segundos longos demais para serem considerados profissionais.

Então, a música começou.

Dessa vez, os corpos se buscaram como se tivessem vontade própria. As mãos de Isabella encontraram a cintura de Luna antes mesmo que a coreografia pedisse. E quando Luna se curvou para o giro, foi Isabella quem segurou seu queixo, puxando-a para mais perto, quase colando seus rostos.

O toque que deveria ser condução virou algo entre domínio e desejo.

O giro se transformou em uma queda controlada, com Luna presa entre os braços de Isabella, as costas arqueadas, o pescoço exposto.

Isabella apertou mais, como se quisesse deixar marcas.

E Luna, em vez de se soltar, sorriu.

— Cuidado, professora... — sussurrou, com a voz rouca. — Tá começando a parecer que você gosta de me ter assim.

Isabella apertou os olhos, lutando contra o próprio corpo.

— Você é insuportável. — respondeu, mais para si mesma do que para ela.

Mas não soltou.

Por longos segundos, ficaram ali, presas em uma espécie de transe. O salão, os outros dançarinos, o mundo inteiro, simplesmente... desapareceu.

Quando finalmente Isabella a soltou, foi quase como quebrar uma corda invisível que mantinha ambas suspensas em outro plano de existência.

Luna ajeitou o cabelo, fingindo estar mais irritada do que realmente estava.

— Se isso for parte da metodologia de ensino... acho que vou começar a gostar das suas aulas.

Isabella respirou fundo, pegou uma garrafa de água e, sem olhar, respondeu:

— Nem nos seus melhores sonhos, Cavalcanti.

Mas a mão dela tremia. E seu coração... bem, esse já estava completamente fora do ritmo.

"Isso não pode continuar assim. Não pode. Mas... como eu paro?"

E, do outro lado do salão, Luna encostou-se na parede, cruzou os braços e sorriu, mordendo o lábio.

"Se isso for guerra... eu tô disposta a perder. Ou ganhar. Tanto faz... desde que seja com ela."

Ambas não sabiam, mas estavam cada vez mais amarradas por essas cordas invisíveis — feitas de desejo, orgulho, raiva... e algo muito mais perigoso: amor que nenhuma das duas queria — ou conseguia — admitir.

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