O relógio digital marcava 23:47. A luz fraca do abajur projetava sombras no teto, e o silêncio da casa parecia mais pesado naquela noite. Larissa estava deitada de lado, abraçando o travesseiro, com os cabelos caídos sobre o rosto e a expressão cansada de quem já não esperava mais nada.
O lado direito da cama seguia vazio.
Ela soltou um suspiro longo, fechando os olhos por um instante. Qualquer outra pessoa acharia triste o marido ainda não ter voltado pra casa, mas para Larissa… não era. Na verdade, havia certo alívio nas noites em que ele demorava. Era um tempo só dela, um espaço sem gritos, sem cobranças, sem aquele olhar acusador. Um intervalo de paz entre as batalhas diárias.
—É estranho dizer isso em voz alta, pensou. Mas eu sou muito melhor quando ele não está aqui.
O abajur fazia a luz brilhar suavemente sobre a parede descascada. Larissa fixou o olhar ali e, sem querer, deixou a mente voltar para o passado. Um passado que, às vezes, ela tentava esquecer… e em outras, revisitava sem saber por quê.
Ela tinha dezenove anos na época. O colégio estava todo enfeitado com cartazes coloridos e estandes improvisados para a feira de ciências daquele ano. Larissa apresentava um projeto simples de maquete de cidade sustentável, com suas miniaturas feitas de isopor e restos de papelão que havia catado aqui e ali.
No meio da movimentação, ela notou um rapaz parado próximo ao estande. Tinha um sorriso fácil e o cabelo bagunçado. Usava a camiseta da escola vizinha e segurava um copo de refrigerante. Ele ficou observando o projeto e depois olhou diretamente para ela.
— Gostei da sua maquete, disse, com um tom sincero que pegou Larissa de surpresa.
Ela ficou sem saber o que responder, corou de leve e sorriu.
— Ah… obrigada. É meio improvisado, mas deu trabalho.
O nome dele era Sérgio. E naquele dia, o destino — ou a ingenuidade — resolveu abrir uma porta. Eles trocaram contatos, começaram a conversar pelas redes sociais e, nos dias seguintes, as mensagens se tornaram constantes.
Falavam sobre música, séries, sobre como odiavam matemática. Larissa ria das piadas bobas dele e se sentia importante. Pela primeira vez, alguém parecia interessado nela de verdade, sem segundas intenções. Pelo menos, era o que ela acreditava.
Quando Sérgio a pediu em namoro, Larissa já estava envolvida. Disse sim sem pensar muito. Ela queria acreditar que aquele sorriso simpático escondia um coração bom.
As coisas aconteceram rápido demais. Em pouco tempo, ele começou a fazer planos para os dois, falava sobre casamento, filhos, casa própria. E Larissa… queria tanto ser amada, queria tanto aquela história perfeita que cresceu ouvindo em contos de fada, que nem percebeu os sinais pequenos que, hoje, teria enxergado de longe.
O barulho do relógio puxou Larissa de volta para a cama vazia e escura. Ela mexeu no travesseiro e suspirou de novo.
Era tão fácil naquela época, pensou. Eu acreditava em tudo… acreditava que o amor podia salvar a gente. Que a gente podia mudar as pessoas só amando mais.
Olhou para o teto, sentindo uma lágrima escorrer pelo canto do olho, sem força sequer para limpar.
A atual vida de Larissa era a prova cruel de que nada daquilo tinha sido perfeito. Que o “homem dos sonhos” era só mais um disfarce. Que sua ideia de vida feliz foi um engano construído pelo coração ingênuo de uma garota boa demais para um mundo que não perdoa quem é puro.
Naquela noite, antes de adormecer, Larissa se perguntou quantas outras mulheres estariam deitadas em camas vazias, sentindo o mesmo. E se, algum dia, ela teria coragem de não esperar mais.
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Atualizado até capítulo 41
Comments
Sandra Camilo
acorda larga s homem, vai buscar uai felicidade
2025-05-25
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