A primeira vez que Elena notou algo estranho foi em uma manhã qualquer.
O cheiro de café fresco enchia a cozinha, como sempre. Mas havia algo de errado na forma como Dona Isabela mexia a colher no açúcar. Seus dedos tremiam, levemente, como folhas presas no vento.
— Vó, tá tudo bem? — Elena perguntou, com o cenho franzido.
— Claro, minha menina. Só um pouco de cansaço.
Mas o cansaço voltou no dia seguinte. E no outro. E começou a se espalhar. Nas mãos trêmulas, nos esquecimentos sutis, no jeito lento de caminhar.
Elena observava em silêncio, como quem assiste uma rachadura crescer numa parede antiga. Pequena no início, mas impossível de ignorar.
— Talvez seja só idade… — tentou se convencer, dobrando as roupas no varal. — Ou o frio…
Mas no fundo, ela sabia. Algo estava errado.
Na semana seguinte, levou a avó ao pequeno posto de saúde do vilarejo. A enfermeira, uma mulher gentil, mas de rosto preocupado, pediu exames com urgência.
Dias depois, a confirmação.
— É degenerativo — disse o médico, com uma voz séria demais para aquele consultório de paredes descascadas. — Neurológico. Avançado.
Ela vai precisar de cuidados constantes. E tratamento especializado.
Em outras palavras: hospital particular, medicação de alto custo e suporte profissional.
Elena saiu da consulta com as pernas trêmulas, a garganta seca e os olhos ardendo. A palavra “avançado” ecoava como um martelo em sua mente.
Naquela noite, Dona Isabela dormiu cedo. E Elena ficou sentada à beira da cama, observando o rosto sereno da única pessoa que a amara verdadeiramente.
Tantas rugas, tantas histórias. Tantos sacrifícios.
Ela lembrava da infância simples, das noites ouvindo histórias sob o cobertor, das vezes em que a avó apertava suas mãos e dizia: “Você é o melhor pedaço da minha filha.”
Agora, o tempo estava cobrando. E ela… ela não tinha como pagar.
Na manhã seguinte, Elena pegou o ônibus para a cidade grande mais próxima, onde havia um hospital com neurologistas. Levava na mochila os papéis dobrados com o diagnóstico, e no bolso o pouco dinheiro economizado da venda de doces e costuras da avó.
Tentou explicar, tentou negociar. Mas os olhos do atendente eram frios e objetivos.
— O plano de saúde de vocês não cobre internação. E o tratamento custa caro.
Muito caro.
Elena saiu de lá com um gosto amargo na boca. Caminhou pelas ruas com passos arrastados, observando vitrines que pareciam de outro mundo. Sapatos brilhantes. Perfumes que custavam mais que todo o salário do mês.
Pessoas apressadas. Ricos entediados. Felicidades compradas.
Ela sentia raiva. Um tipo de raiva que nunca tivera antes. Não da vida… mas da injustiça.
Ela sabia quem poderia ajudar. Sabia o nome. Sabia o rosto.
Arturo Vasquez.
O homem que a rejeitou. O homem que criava Valentina como uma princesa, enquanto ela aprendia a sobreviver com restos. O homem que assinava cheques com o sobrenome que ela carregava como um peso.
Naquela noite, ela escreveu uma carta. Simples. Direta. Sem orgulho.
“Meu nome é Elena Vasquez. Sou sua filha. A filha que você recusou.
A mulher que me criou está morrendo. Preciso da sua ajuda.
Só isso.
Por favor.”
Postou a carta no dia seguinte. O envelope seguiu para o endereço que vira tantas vezes nas colunas sociais. A mansão no alto do bairro mais nobre de Nova York.
Por dias, esperou. No início, com esperança. Depois, com dor. E, por fim, com raiva.
A resposta veio. Mas não em palavras.
Veio em silêncio. Em ausência. Em desprezo.
Ele não respondeu. Não mandou nada. Não moveu um dedo.
Era como se ela não existisse.
E foi nesse silêncio que algo dentro dela morreu.
Não a doçura. Não a compaixão. Mas a ilusão.
A ilusão de que sangue bastava.
A ilusão de que, um dia, ele olharia para ela como pai.
Naquela noite, Elena chorou. Chorou até a garganta doer. Chorou sozinha, no quarto apertado, com o som dos grilos do lado de fora e o coração quebrado por dentro.
Mas ao amanhecer… algo havia mudado.
Havia menos lágrima. E mais aço.
Ela começou a vender tudo que podia. Costurava à noite, vendia pão de manhã.
Mas sabia… que não seria suficiente.
O tempo da avó estava se esgotando. E ela não tinha mais onde correr.
Ainda não sabia, mas em breve, o destino bateria à porta com uma proposta que mudaria tudo.
E para salvar quem amava, Elena cruzaria a linha entre sacrifício e dor.
Entre a filha esquecida… e a mulher que ninguém ousaria apagar.
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Atualizado até capítulo 45
Comments
Carolina Luz
esse verme não deve ser humano mesmo ele não a quis como filha mas algo me diz que no futuro vai querer ser o "pai"😠
2025-05-25
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Mclaudia Oliveira
Desgraçado 🤬😤
2025-05-27
0
Dulce Gama
Que paí perverso tomara que o reinado dele caia e ele vá pedir ajuda da filha rejeitada AFF 🌹🌹🌹🌹🌹🎁🎁🎁🎁🎁♥️♥️♥️♥️♥️👍👍👍👍👍
2025-05-24
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