Após três dias e três noites de celebrações grandiosas, regadas a música, vinho e danças, a festa da coroação finalmente chegava ao fim e os Reis que apoiavam a rainha em sua coroação já voltavam para seus reinos. Os salões que haviam sido palco de risos, juras e alianças agora estavam silenciosos, as tapeçarias balançando suavemente com a brisa que entrava pelas janelas abertas do castelo de Arkanne.
Reis e príncipes, trajando mantos ricamente bordados, haviam retornado a seus reinos distantes, levando consigo lembranças da rainha loira que conquistara o trono com um olhar frio e determinado.
E não somente isso, a rainha esbanjava uma beleza esplendorosa, fazendo com que Reis. príncipes e nobres desejassem-na não somente por seu reino que era um dos maiores e mais fortes, mas para esbanjar a beleza que Otávio escondera por tantos anos. Casar-se com a rainha de Arkanne de repente se tornou algo agradável e cobiçado pelos mais favorecidos. No entanto, Lancelot não dividiria sua glória com ninguém e jamais deixaria que govenassem em seu lugar.
Nobres e cavaleiros também partiram, deixando para trás o vazio das mesas que agora aguardavam o retorno do dia a dia — ou de novos jogos políticos que se desenrolariam no silêncio das câmaras.
Lancelot, porém, sabia que a verdadeira prova de sua liderança estava apenas começando. A coroação fora um espetáculo, uma demonstração de força e controle, mas o poder real residia naqueles que estariam ao seu lado — no Conselho Real. Doze assentos de influência, onde as decisões que moldariam o destino de Arkanne seriam tomadas.
Duas cadeiras já estavam destinadas antes mesmo da festa: uma para Sir Aldren Darvane, o cavaleiro que, com uma voz firme e olhos resolutos, fora o primeiro a jurar lealdade à rainha no dia da coroação; outra para Lady Vyarra Mernesse, a estrategista cujo talento e inteligência Lancelot reconhecera e valorizara. Afinal, era melhor ter tamanha astúcia a seu favor do que contra.
Agora, no silêncio do seu aposento adornado por tapeçarias vermelhas e douradas, Lancelot repousava a pena, examinando cuidadosamente os nomes inscritos na lista diante dela. Escolher os outros dez membros do conselho era uma tarefa delicada — precisava equilibrar poder, lealdade e influência, garantindo que nenhum rival pudesse ameaçar sua posição. A escolha deveria favorecer a rainha de mãos de ferro, mas também parecer legítima aos olhos da nobreza.
O nome de Thorne, o duque cuja presença era uma sombra constante no salão, não havia sido acrescentado na lista por decisão da rainha.
A decisão não fora fácil, mas necessária. Thorne era astuto demais, poderoso e havia se mostrado um oponente à altura em muitas ocasiões. Contudo, sua lealdade era incerta, seu temperamento imprevisível. Confiar-lhe um assento no conselho poderia ser abrir uma brecha na fortaleza da rainha.
No dia seguinte à festa, quando a lista oficial do Conselho Real foi anunciada e os conselheiros reunidos para serem devidamente honrados, o murmúrio se espalhou pelos corredores do castelo.
Alguns se mostraram satisfeitos, outros descontentes.
Entre os últimos, o duque Thorne.
O rosto de Thorne ao ouvir os nomes anunciados, sempre marcado por uma expressão de ironia e desafio, endureceu ao saber que não faria parte do círculo privilegiado que agora governaria Arkanne ao lado de Lancelot. Ele se sentiu duplamente traído, a primeira foi quando Lancelot matou seu irmão, o rei Otávio. Agora sentia a segunda facada ser dada em seu peito.
Ele procurou a rainha em seus aposentos após as honrarias ao conselho, naquela mesma tarde, acompanhado por sua capa negra que parecia absorver a luz das velas.
Lancelot o aguardava, sua postura imponente refletindo a confiança de quem sabe o preço do poder. Vestia um vestido de veludo vermelho intenso, o brasão do lobo prateado sob a estrela dourada bordado no peito, símbolo do reino que agora comandava.
— Duque Thorne — cumprimentou ela com uma voz firme e ao mesmo tempo aveludada, sem um traço de calor. — Vejo que não recebeu a notícia com grande alegria.
Thorne sorriu, um sorriso que não alcançava os olhos. Um sorriso de quem esconde lâminas sob a luva.
— Minha rainha, como poderia alegrar-me ao saber que fiquei de fora do seu círculo íntimo? — respondeu ele, dando alguns passos lentos, medindo o espaço entre eles. — Uma decisão que certamente será motivo de comentários nas cortes.
Lancelot não se deixou abalar. Como havia dito, ela não aceitaria que seu reino fosse regido por falatórios.
— O Conselho não é um prêmio para vaidades, duque. É um instrumento de poder. E eu escolho aqueles em quem confio... ou em quem vejo utilidade.— Ela deu alguns passos em sua direção.— Fique tranquilo, não irei tolerar que comentários a seu respeito difamam sua imagem.— Tocou sua mão.— Afinal, ainda somos cunhados, somos família.
— Ah, a utilidade — murmurou Thorne, com um olhar afiado. — Uma palavra que pode esconder muitas verdades. Mas saiba, minha rainha, que confiança é algo difícil de se recuperar quando perdida. E alguns segredos... são como venenos silenciosos.
Ela ergueu as sobrancelhas, consciente do duplo sentido. E surpresa por ter sido completamente ignorada ao falar do parentesco entre eles.
— Fala de segredos perigosos?— a voz baixa e controlada. — Você entende o que esta insinuando, não é, Thorne?
O duque aproximou-se mais, o tom agora suave, quase um sussurro carregado de ameaça velada.
— Entendo perfeitamente. Mas não subestime o valor da paciência. E nem o alcance dos que sabem esperar, rainha de ferro.
Lancelot fixou-o com olhos que brilhavam de alerta.
— Seus avisos são notados. Mas deixo claro que o trono de Arkanne não será tomado por ameaças — disse, com a frieza que fazia tremer muitos que ousavam cruzar seu caminho.
Thorne recuou, sorrindo com desdém. Ele não tinha medo da rainha, sabia de sua astúcia, mas também tinha consciência de que estava completamente a sua altura.
— Muito bem, minha rainha. Que esta seja a nossa forma de jogar.— disse ele, fazendo uma reverência de despedida. — Que vença o mais astuto.
E, com passos medidos, deixou a sala, deixando para trás uma aura de perigo invisível, mas palpável.
Ele não deixou que a rainha respondesse a sua insolência, saiu em passos rápidos, igualando a sua raiva.
Lancelot permaneceu na janela, olhando para o horizonte do reino que agora comandava. Sabia que o jogo de poder com Thorne era apenas uma das muitas batalhas que enfrentaria. Mas ela estava pronta. A coroa sobre sua cabeça pesava, sim, mas era também a chama que alimentava sua vontade de ser a rainha que Arkanne jamais esqueceria.
— Que vença o melhor, Thorne
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 28
Comments