minha história e propósito que mudou minha vida

Herói, pra mim, nunca teve capa.

Teve farda.

Teve suor, sangue, olheiras profundas e cheiro de café amargo às cinco da manhã.

Meu pai se chamava Adam.

Ele era policial.

Não desses que aparecem em propaganda sorrindo em campanha de segurança pública.

Era de verdade.

De alma, de corpo, de missão.

Eu cresci vendo ele limpar a arma com o mesmo cuidado que me ajeitava o cabelo antes da escola.

Cresci ouvindo histórias de tiros, fugas, madrugadas sem dormir.

Mas também cresci ouvindo promessas.

— Um dia você vai crescer, minha sargentinha. E quando crescer, vai saber que heróis existem. Eu sou um.

E eu acreditava.

Acreditava tanto que nem o Super-Homem me convencia.

Meu pai era o exemplo de homem que eu queria pro futuro.

Era o amor da minha vida antes de eu entender o que era amor.

Quando eu nasci, minha mãe morreu no parto.

Então era só nós dois e minha vó Lúcia.

A véia mais braba e mais doce do universo.

Tinha mãos calejadas de cuidar dos outros, voz de cigarro e fé inabalável.

— Adam é teimoso, mas tem coração bom — ela dizia. — E você puxou a cabeça dura dele, menina.

Eu puxei mesmo.

Dei trabalho.

Mas nunca mais do que a vida me deu.

O dia em que meu pai morreu foi o dia em que eu perdi o chão.

Um tiroteio entre facções. Um erro de estratégia. Uma bala que não era endereçada a ele, mas achou casa no peito do homem que era meu mundo.

Lembro do rádio noticiando.

Lembro da vó gritando.

Lembro de mim, parada na sala, sem conseguir chorar.

— Não... não... ele vai voltar... — eu repetia, sem voz, sem ar, sem acreditar.

Mas ele não voltou.

Voltou só num caixão coberto com a bandeira do Brasil.

Voltou só em lembrança, cheiro no uniforme, cartas antigas.

A partir dali, virei adulta.

Não por escolha. Por necessidade.

A pensão que recebíamos mal cobria as contas.

A vó Lúcia já estava doente — diabetes, pressão alta, os remédios cada vez mais caros.

Os postos de saúde viviam sem insulina, sem atendimento, sem vergonha.

Então, aos 15, comecei a fazer bico.

Distribuía panfleto, lavava carro, vendia brigadeiro em porta de hospital.

Tudo pra não deixar faltar nada pra ela.

Ela era tudo o que me restava.

— Você devia estar estudando — ela resmungava, enquanto tomava o chá que eu preparava pra baixar a pressão.

— E tô. Mas antes disso, eu tô sendo filha.

E fui.

Fui até o fim.

Até o dia em que ela teve um AVC fulminante.

Os médicos tentaram. Mas ela já era frágil demais.

Enterrei minha avó com a mesma farda preta que usei no dia em que entrei como segurança no shopping da cidade.

Passei no concurso aos 19.

Dois anos depois, já era chefe de equipe no aeroporto.

Dava ordem pra homem de cinquenta com ego ferido e cara feia.

Eu não me tremia.

— Se encostar a mão de novo em qualquer passageira, eu mesma arranco seu crachá — falei uma vez pra um segurança metido a galã que achava que podia tudo.

— Você acha que pode falar assim comigo só porque é chefe?

— Não. Eu falo assim porque sou mulher. E porque, se quiser, te derrubo com um dedo. Quer tentar?

Ele não quis.

Ninguém queria.

Meu nome virou sinônimo de respeito.

De medo.

De eficiência.

E foi por isso que a proposta chegou.

Segurança particular. Nível internacional.

Contrato em Seul. Moradia inclusa. Salário em dólar.

— Vai mesmo deixar tudo? — perguntou a gerente do aeroporto.

— Já deixei quando perdi meu pai e minha avó. Aqui não sobrou nada.

Fui com uma mala, a alma cansada, uma arma na cintura e um instinto de sobrevivência que latejava como músculo treinado.

Ninguém me esperava no aeroporto de Incheon. Só um motorista com uma plaquinha:

JOYCE ALMEIDA – SEGURANÇA NÍVEL 4

Subi no carro sem olhar pra trás.

Sabia que meu futuro não tava mais no Brasil.

Tava onde meu trabalho me levasse.

— Você tem ideia do que tá indo proteger? — perguntou o motorista, enquanto passava por ruas modernas e luzes neon.

— Não.

— Não se assuste. O cliente é um pouco... famoso.

Eu ri de canto.

Já protegi gente rica, filho de político, e até modelo que achava que o mundo girava em torno do abdômen trincado dele.

— Famoso não me assusta. Homem mimado, talvez.

Eu só não sabia que o mimado em questão era uma bomba de testosterona chamada Jeon Jungkook.

E que, em menos de uma semana, eu ia querer algemar ele.

Pelo motivo errado.

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