A Farsa e o Exílio
O veredito do teste ancestral havia sido claro como cristal: Kael Noctharion fora considerado o mais fraco dentre os filhos de Lorde Arkan. Enquanto os servos e alguns mestres das casas vizinhas tentavam esconder seus sorrisos sarcásticos, dentro da Mansão Noctharion o clima era de humilhação velada. Kael, ainda ferido da luta contra o demônio abismal, sentia o peso do desprezo de seus irmãos como uma lâmina cravada no orgulho.
Seleria Noctharion, a mais velha entre os filhos, mal lhe lançava olhares, como se sua existência não valesse mais do que a de um inseto. Elina Noctharion, a segunda filha, até demonstrava um leve pesar em seus olhos, mas era um olhar distante, como o de quem já aceitara a sentença de fraqueza. Valeska Noctharion, a caçula entre as irmãs, aproximou-se uma única vez, lhe oferecendo uma maçã e algumas palavras tímidas de consolo antes de se afastar para não ser vista com ele.
Já os irmãos homens — Dareth Noctharion, o primogênito; Malrik Noctharion, o guerreiro arrogante; e Lioran Noctharion, o mais manipulador entre eles — não poupavam comentários cruéis.
— Um verme sobreviveu à Fenda... uma lástima para o nome Noctharion — disse Dareth em uma noite, enquanto todos jantavam à mesa.
— Talvez devêssemos ensiná-lo a lavar os corredores do castelo. Isso sim ele faria bem — provocou Malrik com um sorriso venenoso.
— Com sorte, morre de vergonha antes de manchar nosso nome mais uma vez — sussurrou Lioran para Valeska, que apenas baixou os olhos.
Kael suportava tudo em silêncio. Dentro de si, algo crescia. Uma sombra. Uma chama oculta que queimava fria e paciente.
Dias se passaram até que uma visita especial fosse anunciada: a família Vaelstrom, nobres poderosos da província de Arvandor, faria uma estadia na Mansão Noctharion. Lorde Arkan desejava unir laços com eles. Diziam que o patriarca Vaelstrom era conselheiro do Rei e detinha alianças com magos arcanos.
Kael fora convocado junto dos irmãos e irmãs para a recepção. Apesar da vergonha, ele compareceu com o rosto limpo e o coração firme. As filhas da família Vaelstrom eram deslumbrantes. A mais velha, Lady Lysantia, tinha cabelos dourados como mel ao sol poente e olhos azuis cintilantes. A mais nova, Lady Aeloria, era como a noite: cabelos negros ondulados, pele pálida e olhos lilases, raros e encantadores.
Durante a recepção, enquanto Lorde Arkan discursava e os convidados brindavam, Kael mantinha-se afastado. Não queria atenção, muito menos constranger ainda mais a família. Mas seu silêncio e postura séria chamaram a atenção de Lady Aeloria, que se aproximou com um sorriso gentil.
— Você é Kael, não é? O sétimo filho de Lorde Arkan? — ela perguntou.
Kael assentiu, surpreso pela abordagem.
— Vi o seu teste. Lutou bem, mesmo sem os talentos óbvios que seus irmãos têm. Coragem não é algo que se ensina — disse ela, antes de ser chamada por seu pai.
Aquelas palavras gravaram-se como fogo em sua alma. Porém, o momento de esperança foi breve.
Na manhã seguinte, enquanto treinava sozinho nos jardins, Kael foi chamado pelos guardas da casa. A acusação foi feita de forma direta: ele teria tentado se aproximar de Lady Aeloria de forma inapropriada durante a noite anterior. A notícia espalhou-se como praga entre os salões da mansão.
— Um fraco e um pervertido. Que orgulho para a casa... — sussurrou Malrik com escárnio.
Dareth fez questão de contar a todos os presentes que Kael havia manchado a honra da família. Lioran, com sua máscara falsa de neutralidade, sugeriu que o irmão fosse afastado por segurança.
A voz de Lorde Arkan foi como um trovão:
— Kael Noctharion, por tua afronta e desonra, serás exilado da mansão por dois anos. Se voltares, que seja com provas de redenção. Caso contrário, perderás teu nome.
Kael não se defendeu. Porque sabia que, mesmo se tentasse, ninguém o ouviria. Naquela mesma noite, partiu com poucas roupas e sem recursos. Caminhou por trilhas escuras, com o vento frio cortando sua pele e a solidão se instalando como uma segunda alma.
Mas enquanto todos acreditavam que ele fora destruído, dentro de Kael algo despertava.
Uma semente de escuridão.
Um poder adormecido.
E, acima de tudo, uma promessa:
Eles verão quem é o verdadeiro Noctharion.
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Atualizado até capítulo 42
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