O carro preto estava parado na entrada da Villa Bellucci como uma mancha de tinta sobre um quadro claro. Escuro, reluzente e com os vidros tão escurecidos que não se via nada dentro. Enzo caminhou em direção ao portão devagar, como quem mede cada passo, cada segundo. No bolso do paletó, sua mão firme segurava a pistola com a frieza de quem já conhecia bem o gosto da guerra.
O segurança da frente, Salvatore, o acompanhava de perto. Era um homem robusto, de queixo largo e olhos atentos.
— Patrone, o carro chegou há uns três minutos. Ninguém desceu — murmurou ele.
— Placas falsas — respondeu Enzo. — Eles não vieram conversar. Vieram mandar um recado.
Sem hesitar, Enzo se aproximou do carro, parando a menos de dois metros. Fez um gesto com a mão, exigindo que o vidro fosse abaixado. Nada aconteceu.
Segundos depois, o vidro do banco do passageiro desceu lentamente. Lá dentro, um homem magro, de terno cinza claro e sorriso escorregadio o encarava.
— Enzo Bellucci. O leão enjaulado. Faz tempo.
— Tempo o suficiente pra você esquecer que não é bem-vindo aqui, Romano.
Romano Mazzetti. Um nome que Enzo pensava nunca mais precisar pronunciar. Um velho aliado dos tempos em que resolver as coisas com palavras era considerado fraqueza.
— Vim em paz — disse Romano, erguendo as mãos. — Só uma visita. Ouvi dizer que você andou reabilitando sua imagem. Criando jardins, contratando babás...
Enzo não respondeu. Apenas manteve os olhos fixos, frios como aço.
— Acha mesmo que pode viver uma vida de homem comum, Bellucci? Com uma filha traumatizada e uma mulher nova sob seu teto? — o sorriso de Romano se ampliou. — Está formando uma família ou um novo ponto fraco?
Enzo se inclinou, o rosto próximo ao vidro.
— Diga ao chefe de vocês que, se pisarem aqui de novo, mando os corpos de volta em sacos pretos. Um por um.
— Sempre tão poético — murmurou Romano, antes de sorrir com escárnio e subir o vidro de volta.
O carro arrancou devagar, em silêncio absoluto.
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Dentro da casa, Isabella tentava entreter Giulia com lápis de cor e papel. A menina rabiscava uma árvore, mas seus olhos estavam atentos à janela, onde sombras dançavam ao ritmo da tensão.
— Papai vai ficar bem? — perguntou ela de repente.
Isabella hesitou.
— Vai sim, pequena. Ele é forte. E tem a gente com ele agora, lembra?
Giulia olhou o desenho e riscou com força o tronco da árvore, partindo-o ao meio.
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Enzo retornou cerca de meia hora depois, o rosto tenso, a camisa amassada. Encontrou Isabella na sala de estar, de braços cruzados e olhos cheios de interrogações.
— Era alguém do seu passado, não era?
— Era um aviso — respondeu ele, sem rodeios. — Um velho amigo tentando me lembrar de que homens como eu não têm direito a paz.
Isabella deu um passo à frente.
— E você vai aceitar isso?
Ele a encarou por um instante e, com um cansaço visível no rosto, disse:
— Não. Mas não posso fingir que não existe. Por isso estou te perguntando: você ainda quer ficar?
Ela respirou fundo, firme.
— Enquanto Giulia precisar de mim, estarei aqui. E, quanto a você... bom, ainda estou decidindo.
Um sorriso quase imperceptível apareceu nos lábios dele. Pela primeira vez, Enzo sentiu que talvez — só talvez — houvesse uma chance de redenção.
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Atualizado até capítulo 40
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