O relógio marcava seis da tarde quando Isabella retornou ao interior da Villa Bellucci, com Giulia ao seu lado. A menina segurava sua mão com firmeza, como se aquele pequeno gesto fosse uma âncora em um mar de incertezas. Ao entrarem na cozinha, Teresa, a governanta, ergueu os olhos e quase deixou o pano de prato cair.
— Parece que um milagre aconteceu — murmurou ela, boquiaberta.
Isabella sorriu com simplicidade.
— Giulia me levou até o esconderijo dela. Disse que só ela entra lá, mas hoje... me deixou entrar.
Teresa colocou o pano de lado e aproximou-se lentamente.
— Então você conseguiu atravessar o primeiro muro.
Isabella franziu a testa.
— O primeiro?
— Giulia é feita de camadas, como aqueles doces folhados que sua avó fazia. Cada camada é um segredo, uma cicatriz. Se ela te deixou ver o esconderijo, você é a primeira pessoa, desde... — ela pausou, engolindo em seco. — Desde que a mãe dela partiu.
No quarto de Giulia, Isabella ajudou a pequena a vestir o pijama. O ambiente era espaçoso e acolhedor, decorado com tons lavanda e adornado por brinquedos organizados com uma precisão incomum. Nada ali parecia escolhido por uma criança. Era bonito, mas estéril.
— Quem escolheu essa decoração? — perguntou Isabella, enquanto a ajudava com os botões da camisola.
— Papai. Ele disse que princesas dormem em lavanda.
— E você gosta?
A menina deu de ombros, sem responder.
Isabella ajeitou a colcha sobre o corpo frágil da criança.
— Está cansada?
— Não quero dormir ainda — disse Giulia, abraçando uma boneca de porcelana de olhos azuis vívidos.
— Quer que eu te conte uma história?
— Pode ser.
Isabella se sentou ao lado da cama e começou a inventar uma história sobre uma princesa que escapava do castelo toda noite para conversar com uma raposa encantada na floresta. Enquanto narrava, observava o rosto da menina relaxar, os olhos fechando devagar.
Quando Giulia finalmente adormeceu, Isabella levantou-se com cuidado e apagou o abajur. Ao sair do quarto, quase esbarrou em Enzo, que estava parado no corredor, apoiado na parede.
— Ela dormiu? — perguntou ele em voz baixa.
— Como um anjo — respondeu Isabella, tentando controlar a tensão que a presença dele sempre causava.
Ele se aproximou. Seus olhos escuros tinham algo que a intrigava — não era frieza, era vigilância. Como se vivesse sempre pronto para reagir.
— Ela tem um mundo próprio. Entrar nele não é fácil.
— As crianças só precisam de alguém que não as force a abrir portas. Às vezes, só estar por perto já é o suficiente.
— Você não pretende ir embora, então?
— Só se me mandar.
Enzo hesitou, depois balançou a cabeça.
— Não. Você vai ficar. Giulia... precisa de você.
A tensão entre os dois cresceu como uma névoa. Isabella sentia o coração disparar, mas manteve a postura. Queria saber mais sobre a mulher que partira, mas não era o momento.
— Boa noite, Enzo.
— Boa noite, Isabella.
Enquanto voltava para seu quarto, ela sabia que algo havia mudado. Um muro havia ruído — não apenas entre ela e Giulia. Mas também entre ela e o homem cuja dor ainda vivia nas sombras da casa.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 40
Comments