Capítulo 4 – Luto, Invasão e Desprezo
O céu estava estranho naquele dia. Cinzento, abafado, como se o mundo inteiro soubesse que algo ruim estava prestes a acontecer. Pedro estava com os olhos fixos no teto do quarto dos avós, o coração apertado. Aquele lar, antes cheio de carinho e histórias, estava em silêncio. Um silêncio pesado demais.
Os dois — seus avós — tinham partido. Um infarto levou o avô. A avó, abatida pela dor, foi logo depois, no mesmo dia. Pedro não teve tempo de chorar. A vida no morro não dava espaço pra luto.
E pior: naquela mesma noite, houve uma invasão. Uma operação policial intensa, barulhenta e cruel. Tiros cruzavam os becos. Gritos, correria, medo. O pai de Rafael, o chefão do morro, foi baleado tentando fugir. Morreu nos braços do filho.
Tudo mudou.
Rafael assumiu o comando. Pedro, aos 18 anos, viu sua vida virar poeira. Sem os avós, sem rumo, sem tempo pra sonhar. Agora era só sobrevivência. Ele, Rafael e Renato selaram um pacto de sangue naquela madrugada. Iriam manter o controle do território. Iriam proteger o que restava deles.
No meio do caos, Paula — a prima de Cíntia — viu uma chance.
Desde que Pedro crescera e passara a andar com Rafael e Renato, ela se insinuava pra ele. Sabia que ele agora era respeitado, temido, admirado. E ela, fútil e egoísta, só queria ter alguém de poder ao lado.
Naquela mesma semana, ela apareceu na casa dos meninos com uma roupa colada, maquiagem carregada e perfume doce. Pedro, atordoado pela dor e raiva, não resistiu. Dormiu com ela.
Tirou a virgindade da prima de Cíntia.
Paula achou que havia vencido. Que Pedro, com seu jeito rude e perigoso, ficaria com ela. Começou a espalhar que agora era "a mulher" dele. Mas ela não sabia o que era amar — e nem Pedro estava disposto a amar alguém como ela.
Dois dias depois, ela apareceu na casa dele com roupas, exigindo um canto pra morar. Pedro nem pensou duas vezes. Pegou a mochila dela e jogou no portão.
— “Tá maluca, Paula? Aqui não é motel de luxo, não. Você já conseguiu o que queria. Agora vaza.”
Ela gritou, fez escândalo, chorou, bateu o pé. Mas Pedro foi irredutível. Paula saiu humilhada, jurando que se vingaria.
E foi aí que Cíntia apareceu, parada na calçada, com uma sacola nas mãos. Tinha ido levar uns livros pra Luana e, sem querer, viu a cena toda.
Pedro, com o rosto duro, virou os olhos e a viu parada ali.
Ela o olhou com surpresa e reprovação, tentando entender por que ele tratava sua prima daquele jeito. Mas antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, ele cuspiu as palavras no ar, como se fossem veneno:
— “Tá olhando o quê, patricinha? Vai querer ser a próxima a deitar na minha cama também?”
O peito de Cíntia apertou. As palavras cortaram como navalha. Ela sentiu o rosto queimar de vergonha e raiva. Aquilo não era só grosseria — era humilhação. E vindo justamente dele, que ela observava de longe com tanta curiosidade e confusão.
Ela apertou a sacola nas mãos e respondeu, com a voz firme, mas embargada:
— “Você não me conhece, Pedro. E nem merece conhecer.”
Virou as costas e saiu, o coração em disparada. Ele ficou olhando, sem conseguir explicar por que falou aquilo. Não era ela o alvo do ódio dele — mas sim tudo o que ela representava: a vida que ele não teve, o carinho que perdeu, a pureza que se afastava dele a cada dia.
Lá dentro, Rafael apareceu e cruzou os braços.
— “Tá espantando até a patricinha agora?”
Pedro bufou.
— “Ela se acha melhor que todo mundo.”
Rafael riu.
— “E não é? Vive no mundo dela, cheia de regras, cheia de frescura. Mas vou te falar uma coisa, Pedro… essa menina ainda vai te virar de cabeça pra baixo.”
Pedro não respondeu. Só voltou pro quarto, onde o cheiro de Paula ainda pairava no ar — junto com o arrependimento e a solidão.
Aquela noite foi o marco. A partir dali, o coração de Pedro se tornaria ainda mais duro… mas, mesmo sem perceber, Cíntia começava a ocupar um espaço que ele nem sabia que existia.
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Atualizado até capítulo 40
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