Capítulo 3

A amargura do licor descia por sua garganta como fogo líquido, abrasando suas entranhas, mas Zaira não parava. Uma dose. Duas. Três.

Cada gole era um escudo improvisado contra as vozes que ressoavam implacáveis em sua cabeça: As contas empilhadas sobre a mesa da cozinha, marcadas com selos vermelhos de "Vencido".

Os livros da universidade que já não podia comprar. A tosse seca de sua mãe, que se ouvia cada noite através das paredes finas como papel.

Engolia e ria, como se o álcool pudesse apagar a realidade. Como se pudesse, por umas horas, anestesiar a dor.

Sentada em um dos sofás laterais do clube, sob uma luz tênue que tingia sua pele de tons âmbar, Zaira ria de algo que nem sequer entendia. Suas bochechas estavam acesas pelo álcool, suas pupilas brilhavam como estrelas perdidas, e seu corpo se balançava ao ritmo lento da música grave que vibrava nas paredes.

A seu lado, Tatiana sorria forçada, fingindo diversão enquanto seus olhos traíam a culpa que corroía seu interior.

De vez em quando, lançava olhares nervosos para a varanda privada, onde Sergio, o dono do clube, lhe fazia discretas señas com a cabeça.

A pressão sobre seus ombros era sufocante.

Tatiana engoliu saliva, ajustando seu vestido curto enquanto sentia o peso do envelope cheio de promessas ainda invisível em suas mãos.

—Sabe, Tati? —balbuciou Zaira, deixando cair a cabeça sobre o ombro de sua amiga, seu alento impregnado de rum barato—. Às vezes... às vezes sonho que... um cara rico, sabe?, se apaixona por mim... e me tira deste inferno —riu com uma gargalhada quebrada, amarga, que soou como um lamento perdido na música.

—Que estupidez, né?! —zombou de si mesma, suas palavras arrastadas e vulneráveis—. Uma garota pobre salva por um príncipe milionário! Que piada!

Tatiana fechou os olhos um segundo, deixando que a culpa lhe arranhasse a alma.

Estava a vendendo.

E, ainda assim, acariciou o cabelo embaraçado com uma ternura hipócrita, como se esse gesto pudesse redimi-la.

—Não é uma estupidez, Zai... —sussurrou, sua voz tremendo levemente—. Às vezes a vida... nos dá oportunidades onde menos as esperamos.

Zaira alçou a vista, seus olhos brilhando com uma mistura de álcool e tristeza.

Antes que pudesse responder, dois homens de segurança, enormes e vestidos com trajes negros impecáveis, se materializaram frente a elas como sombras pesadas.

A música se desdibujó, o ar se tornou denso.

—Senhoritas —falou um, sua voz grave, mas educada—, o dono do clube deseja convidá-las a uma zona mais privada, para seu conforto.

Zaira piscou, confundida. O mundo a seu redor girava como um carrossel defeituoso.

—Nós? —balbuciou, com uma risada incrédula.

—Sim —afirmou o guarda, estendendo-lhe uma mão firme, implacável.

Ela olhou para Tatiana, buscando uma resposta, uma tábua de salvação.

Tatiana lhe devolveu um sorriso quebrado, esse que Zaira não soube ler.

—Vai, gata —murmurou—. Você está muito bêbada para seguir aqui. Eu irei em seguida.

O calor de sua voz era uma mentira envolvida em veludo.

Zaira, cambaleando, aceitou a mão do guarda.

Suas botas de sola gasta ressoaram surdamente no chão polido enquanto a levavam por um corredor tapizado de veludo escuro, iluminado apenas por lâmpadas douradas.

O ar cheirava a perfume caro e a segredos podres.

Chegaram a um elevador privado. A cabine subiu silenciosa, como uma sentença.

Quando se abriram as portas, o que apareceu diante dela foi outro mundo: uma suíte de luxo, de dimensões impossíveis.

Sofás de couro preto perfeitamente alinhados, tapetes persas macios, paredes de mármore que refletiam a luz suave de candelabros de cristal.

Um aroma embriagador a madeiras nobres e uísque envelhecido impregnava o ambiente.

—Espere aqui, por favor —disse o guarda antes de ir embora.

Zaira se deixou cair em um dos sofás, a cabeça pendendo para trás, os olhos fechados.

O silêncio era absoluto, salvo pelo zumbido surdo de seu próprio coração.

Tudo dava voltas.

A culpa, a ilusão tola, o medo.

E não sabia que, atrás dessa porta pesada, já caminhava em sua direção o homem que mudaria tudo.

Em outro rincón do clube, no escritório privado, Tatiana recebia seu pagamento.

Um envelope grosso, que cheirava a notas novas e a traição.

—Não se preocupe —disse o dono do clube, ajustando as abotoaduras de sua camisa sob medida—. Em umas horas, sua amiga terá a vida que sempre sonhou... ou a que merece.

Tatiana apertou o envelope contra seu peito, as mãos frias como o mármore.

Cruzou o olhar com Sergio por um instante.

E soube que havia vendido algo que não poderia recuperar jamais.

Leonardo Santos terminava o último gole de seu uísque em um salão privado contíguo.

A bebida escorregava por sua garganta, deixando um sabor amargo que não conseguia apagar o vazio em seu peito.

A luz cálida acariciava seu rosto curtido, sulcado de linhas que falavam de seus 50 anos vividos com intensidade e solidão.

O reflexo no espelho lhe devolvia a imagem de um homem poderoso... e profundamente só.

Não tinha esposa.

Não tinha filhos.

Nem sequer tinha uma casa que pudesse chamar de lar.

Só dinheiro. E fantasmas.

Um bufido amargo escapou de seus lábios enquanto deixava o copo de cristal sobre a mesa. Seu olhar escuro brilhou um instante, carregado de uma tristeza indomable.

Não buscava amor.

Não buscava companhia.

Buscava esquecimento.

Ajustou o casaco preto, inalou fundo, deixando que o perfume denso do uísque e o couro o envolvesse, e avançou para a porta da suíte.

Seu passo era firme, decidido, como um predador que já havia cheirado sua presa.

Tomou a maçaneta fria entre os dedos.

A abriu.

E a viu.

Zaira, recostada sobre o sofá, desprotegida, perdida, com a fragilidade de um suspiro a ponto de se romper.

Leonardo sentiu uma punzada inesperada no peito. Não era compaixão.

Era desejo brutal e algo mais escuro, mais retorcido. Era a necessidade de possuir algo tão limpo, tão alheio a seu mundo sujo.

Fechou a porta atrás de si. Os cliques da fechadura soaram como correntes que se fechavam.

E avançou em sua direção... Em direção à sua salvação ou sua condenação.

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