O sol começava a se pôr sobre as montanhas, tingindo o céu de um laranja quente que se filtrava pela janela do pequeno quarto de Zaira. O ar fresco da tarde acariciava seu rosto enquanto se sentava em frente à mesa de madeira, cobrindo o rosto com as mãos. A luz suave iluminava as folhas dispersas com anotações, livros de texto e uma xícara de café frio.
A universidade parecia tão distante, o sonho de terminar sua graduação parecia impossível de onde ela estava. Seus dedos percorriam as páginas do caderno de matemática, mas sua mente divagava, perdida na preocupação com o futuro.
Como ia pagar o próximo semestre? A dívida acumulada já lhe afogava o coração, e o dinheiro que precisava para terminar a graduação parecia um sonho inatingível.
— Por que não consigo me concentrar? — sussurrou Zaira, deixando cair a caneta sobre o caderno e passando uma mão pelo cabelo, despenteando-o ainda mais.
Tinha crescido em um bairro pobre, onde o dinheiro não só não sobrava, como era um bem escasso. Em seu bairro, os sonhos costumavam morrer antes de nascer, ou pelo menos era o que sentia na maioria dos dias. As ruas empoeiradas e as casas de tijolo inacabadas eram tudo o que conhecia. Zaira olhou pela janela, observando as crianças que jogavam futebol na esquina da rua, com sorrisos cheios de esperança, alheias à luta constante que vivia.
— O que faço? — perguntou em voz baixa, olhando para as mãos, levantando-as lentamente, como se esperasse uma resposta delas.
Deixou de pensar por um momento e pegou seus cadernos, colocou-os em sua mochila desgastada e decidiu retornar à universidade, onde já sabia que ouviria uma advertência do diretor.
Zaira suspirou, levantando-se lentamente. Abriu a porta e saiu disposta a enfrentar as adversidades da vida.
Seus passos lentos e seguros permitiam que visse um pouco mais do lugar onde vivia, das coisas que sua mãe tinha que fazer para comer algo, mesmo estando doente.
A lembrança de que ela não tinha um carro a fez sair de seus pensamentos e a obrigou a correr, ou perderia o transporte.
Uma hora depois, já estava na universidade, onde Tatiana a esperava.
Zaira, tentando sorrir, embora seu tom revelasse seu esgotamento.
Tatiana usava uma blusa justa que deixava entrever sua figura perfeitamente esculpida por horas de ginástica. Seu cabelo loiro, liso e bem cuidado caía sobre seus ombros. Zaira a observava, invejando em silêncio a vida de sua amiga, tão diferente da sua. Enquanto Tatiana sempre estava rodeada de luxos, Zaira mal se dava o luxo de um café da loja.
— Não sei quanto mais vou aguentar, Tati — sussurrou Zaira, apertando as bordas de sua mochila gasta como se pudesse extrair dela uma solução mágica.
O burburinho da cafeteria universitária a envolvia: risadas, conversas cruzadas, cheiro de café barato e biscoitos rançosos. Mas em sua mesa, o mundo parecia detido, suspenso entre o cansaço e a angústia.
Tatiana, sua melhor amiga desde o primeiro ano, deixou cair a caneta com um suspiro exagerado.
— Zaira, você vai entrar em colapso! — exclamou, cruzando os braços sobre a mesa —. Não pode continuar se matando naquela loja à noite por um salário miserável e estudando de dia. Vai te dar alguma coisa.
Zaira riu sem humor, jogando para trás seu cabelo escuro.
— E que outra opção tenho? Cada mês é uma batalha. O aluguel, a universidade, o transporte... — Enumerava enquanto seus olhos se umedeciam —. E agora, com a doença da minha mãe... — a voz embargou.
Tatiana pegou sua mão com firmeza.
— Esta noite não vamos pensar em dívidas nem doenças. Esta noite você vai sair comigo.
— Sair? — repetiu Zaira, como se a palavra lhe fosse estranha.
— Sim, sair. Há um clube novo na cidade. Não é como os de quinta categoria, te prometo. É elegante, privado... E você precisa se distrair. — Piscou para ela, travessa.
Zaira hesitou. Não era seu estilo, e sabia disso. Mas algo na segurança de Tatiana, em seu sorriso decidido, a fez assentir finalmente.
— Está bem... mas só um pouco.
A noite caiu como uma seda negra sobre a cidade, manchada de luzes e promessas incertas.
Em frente ao Clube Eclipse, Zaira se sentiu diminuta. Uma fila de carros luxuosos chegava e partia, enquanto homens de terno e mulheres vestidas como estrelas de cinema desfilavam em direção à entrada.
— Tati... tem certeza? — sussurrou, abraçando a si mesma.
Tatiana, vestida com um vestido vermelho que parecia derreter sobre sua figura, riu divertida.
— Confie em mim. Além disso — acrescentou, apontando para seu próprio decote —, vestimos bem, babam, nos convidam a drinques e vamos embora. Sem compromissos.
Dentro do clube, a música envolvia o ar com um ritmo hipnótico, e as luzes tênues criavam um ambiente de mistério e pecado. Zaira se sentiu fora de lugar imediatamente. Seu vestido preto simples, que para ela era quase um luxo, parecia destoar em meio a tanto brilho e tecido caro.
O que não sabia era que, em uma das áreas exclusivas do clube, alguém a tinha notado.
De uma varanda na penumbra, com um uísque na mão, o dono do Eclipse a observava com interesse frio.
— A vê? — disse, virando-se para um homem vestido de preto ao seu lado.
O guarda-costas assentiu.
— A garota perfeita para o senhor Santos.
O dono sorriu, um gesto calculador e astuto.
— Certifique-se de que ela fique. Leonardo tem estado demasiado arisco ultimamente. É hora de lhe oferecer um presente... um que não possa recusar e menos hoje, que faz anos.
— Agora mesmo faço meu trabalho, senhor.
Enquanto isso, embaixo, Zaira se sentia como Alice caindo no País das Maravilhas, sem imaginar que aquela noite marcaria o começo de tudo.
— Isso aí, amiga, esqueça tudo por esta noite! — Exclamou Tatiana movendo seu corpo ao ritmo da música.
Zaira sorriu e se juntou à amiga.
Ela não tinha ideia de que essa noite seria o começo de sua ruína OU de sua salvação.
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Atualizado até capítulo 82
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