Gabriella
Já havia 2 dias que eu trabalhava como um louca para o pedaço de gelo, nunca vi uma agenda tão complexa que muda mais do que eu respiro, mas eu não posso reclamar vou receber muito bem por isso. O que me encuca mais é como um homem lindo daqueles pode ser tão frio 🥶.
O relógio ainda marcava 5h50 quando Gabriela chegou ao 40º andar da Rivera & Associates. O prédio estava silencioso, quase sombrio naquela hora, mas ela sabia que não podia se dar ao luxo de se intimidar. Seu dia como assistente pessoal de Carlos Rivera havia começado antes mesmo do sol nascer, exatamente como ela esperava.
Branca, a secretária, a recebeu com um aceno breve e um olhar discreto. Não havia sorrisos ali. Não havia espaço para simpatia.
— Ele está no escritório. Entre direto — disse, voltando imediatamente à tela do computador.
Gabriela ajustou a pasta que trazia em mãos e respirou fundo antes de abrir a porta do escritório.
Carlos estava em pé, à janela, com a luz da cidade amanhecendo atrás dele. Mesmo de costas, sua presença preenchia o ambiente. Elegante, imóvel, impenetrável.
— Senhor Rivera — disse Gabriela, com firmeza controlada.
Ele não se virou.
— O voo para Londres sai às 21h. Preciso da apresentação com as alterações que pedi ontem. A reserva do hotel deve seguir os padrões de segurança anteriores. Sem fotógrafos. Prepare os contratos em francês, inglês e árabe. Você tem até às 10h.
A voz era firme, seca, sem sequer olhar para ela.
— Entendido, senhor. Há alguma preferência no sistema de escolta?
Carlos se virou devagar, os olhos frios pousando nela por um instante.
— Escolta privada, discreta, com experiência em eventos diplomáticos. Não me traga seguranças de shopping. E não me ligue com perguntas. Resolva.
— Sim, senhor.
Ele já havia voltado ao tablet antes mesmo de Gabriela terminar a frase.
Ela saiu sem mais uma palavra. Não havia incentivo. Não havia boas-vindas. Só responsabilidade — e um fio tênue de oportunidade.
No corredor, Branca a observou de relance e disse, num tom neutro:
— A primeira hora é a mais cruel. Se você passar por ela, talvez sobreviva ao dia.
Gabriela apenas assentiu e foi direto para a sala de suporte, onde montou seu pequeno centro de operações improvisado. Não perdeu tempo.
Sabia que Carlos esperava falhas. Que seu silêncio não era desprezo — era armadilha. Teste. Cada detalhe mal feito seria um motivo para demissão sumária. E ela não ia fracassar.
Conseguiu contactar a equipe privada de segurança que havia prestado serviço ao governo francês na última conferência da ONU. Discretos, experientes, eficientes. Em seguida, ligou diretamente ao gerente do Hotel Langham, em Londres, exigindo privacidade e exclusividade para o andar executivo. A apresentação, ela reconstruiu do zero, com base em discursos anteriores de Carlos, mantendo o estilo visual e retórico preferido dele. Os contratos, traduziu e revisou sozinha — até os termos jurídicos, graças às noites em que estudou Direito por conta própria na biblioteca pública.
Às 10h em ponto, voltou ao escritório com a pasta em mãos.
Carlos a olhou de relance e apenas estendeu a mão.
Ela entregou os documentos, sem dizer nada.
Ele analisou por alguns minutos. Os olhos passavam por cada slide, cada página, cada cláusula. O silêncio era absoluto.
Gabriela não sabia se respirava.
— Discreto. Objetivo. Sem erros — disse ele por fim, ainda olhando os documentos.
Ela aguardava algum comentário. Mas ele apenas devolveu a pasta e voltou ao tablet, como se nada tivesse acontecido.
— A equipe de segurança é confiável? — perguntou.
— Com histórico internacional. Já atuaram para o G20 e três embaixadas europeias. Enviei os dossiês para o seu e-mail.
Carlos assentiu. Só isso.
— Está tudo pronto, então. Pode ir.
Ela hesitou por um segundo, esperando talvez... um reconhecimento? Um comentário? Mas nada veio.
Ela se virou para sair.
Carlos — Srta. Garcia — chamou ele, sem levantar os olhos. — Isso foi um bom começo. Só não se iluda. Um erro e você estará fora. Compreendido?
— Sim, senhor — respondeu, firme.
E saiu.
Lá fora, Branca ergueu os olhos novamente.
— Isso foi... rápido — disse com um pequeno levantar de sobrancelhas.
Gabriela segurou a pasta contra o peito, controlando o alívio.
— Ainda é só o começo.
E, de fato, era.
Carlos não a elogiaria. Não a guiaria. Mas Gabriela já entendia: ela estava no campo de batalha, e sobreviver significava ser perfeita. Não por reconhecimento, mas por estratégia.
-
O avião particular pousou em Heathrow pouco depois das 8h da manhã. O céu estava cinza, com a névoa típica da cidade filtrando a luz como uma película melancólica. Carlos Rivera desceu primeiro, impecável em seu sobretudo de lã cinza escuro, os passos precisos e o rosto impenetrável. Gabriela, um pouco atrás, usava um blazer azul-marinho e carregava uma pasta com os compromissos do dia.
Do lado de fora, os seguranças já aguardavam. Tudo estava conforme o planejado — Gabriela havia garantido isso. Sem fotógrafos, sem jornalistas, sem surpresas.
— O carro está à direita, senhor Rivera — informou ela, mantendo a voz neutra.
Ele não respondeu. Apenas caminhou na direção indicada.
No caminho até o hotel, o silêncio foi absoluto. Gabriela se manteve focada no tablet, revisando mentalmente cada detalhe da agenda. Haveria uma reunião com um grupo de investidores europeus, um jantar informal com um político britânico influente e, no dia seguinte, uma conferência no King's College, onde Carlos faria um discurso sobre responsabilidade internacional em litígios comerciais. Ela havia organizado tudo com precisão cirúrgica.
Quando chegaram ao hotel, a recepção já estava vazia, com o gerente os esperando discretamente.
— Sr. Rivera, Srta. Garcia, bem-vindos ao Langham. Reservamos o andar superior conforme solicitado.
Carlos assentiu e seguiu para o elevador. Gabriela percebeu o gerente hesitar.
— Está tudo bem? — perguntou ela, baixando o tom.
— Apenas... uma observação, Srta. Garcia. O hotel foi notificado de uma falha no sistema de aquecimento do andar executivo. As suítes principais estão operando normalmente, mas a sala de conferência privativa que o senhor Rivera costuma utilizar estará inativa hoje.
Ela agradeceu, controlando a frustração. Já sabia o que Carlos diria ou pior, o silêncio carregado que viria.
Mais tarde, no corredor do andar reservado, Gabriela se aproximou dele após uma rápida ligação com a gerência.
— Senhor Rivera, sobre a sala de conferência: houve um problema técnico. Ofereceram uma alternativa no mesmo andar, um ambiente menor, mas com privacidade garantida. Eu pessoalmente testei a acústica. É funcional.
Ele a olhou brevemente. Havia algo no olhar — não irritação, nem aprovação. Apenas... análise.
— E você já se antecipou, como esperava — disse ele, antes de entrar em sua suíte.
Gabriela não respondeu. O elogio se é que se podia chamar assim era raro. Guardou-o em silêncio.
Mais tarde naquele dia, no fim da reunião com os investidores, algo inusitado aconteceu.
Um dos representantes espanhóis, já visivelmente impressionado com a clareza dos argumentos de Carlos, pediu que Gabriela explicasse um ponto sobre a estratégia de expansão no Oriente Médio. Surpresa, ela lançou um olhar sutil a Carlos. Ele fez um leve movimento com a cabeça uma permissão.
Ela se levantou. Com a segurança de quem havia estudado cada documento, respondeu com precisão e elegância. Quando terminou, o salão estava em silêncio por um segundo e então vieram os acenos de aprovação, as palavras de admiração.
Carlos não disse nada. Mas, quando todos se retiraram, ele a chamou.
— Você falou bem. Com propriedade. Foi uma surpresa... aceitável.
Gabriela engoliu a vontade de sorrir.
— Obrigada, senhor.
— Não agradeça. Faça disso um padrão.
Ela assentiu e virou-se para sair. Mas ele falou de novo, mais baixo:
— Ainda assim... não esperava que tivesse essa postura. Você tem algo que... não sei definir.
Ela o olhou, de leve, e pela primeira vez, viu um fragmento de dúvida — ou talvez curiosidade — naquele homem de pedra.
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Atualizado até capítulo 26
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