Vestido é um caixão de renda e seda.
Apertado. Pesado. *Estrangulando.*
Olho no espelho e não me reconheço. O cabelo perfeito, a maquiagem impecável, os lábios pintados de vermelho como sangue fresco.
Pareço uma noiva.
Pareço a morte.
Lúcifer observa de cima do armário, os olhos amarelos fixos em mim como se soubesse que hoje tudo muda.
— *Não me olha assim,* murmuro, ajustando as mangas justas. *Não é como se eu tivesse escolha.*
Ele mia, baixinho, e vira o rosto.
*Até meu gato me julga.*
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### **A Cerimônia – Uma Execução em Festa**
A igreja está cheia.
De inimigos.
De aliados.
De abutres vestidos de seda esperando para ver o sangue escorrer.
Meu pai me espera no altar, o rosto impassível. Do outro lado, Vinni está de terno preto, as mãos atrás das costas, o olhar fixo em algum ponto acima da minha cabeça.
*Nem sequer me olha.*
Bom.
*Também não quero que ele olhe.*
O órgão toca. Todos se levantam.
E eu começo a caminhar em direção ao meu fim.
Quando chego ao altar, Vinni finalmente olha para mim.
Seus olhos são frios.
Os meus também.
O padre fala palavras que não escuto. Algo sobre amor, honra, eternidade.
*Piada.*
— *Os anéis,* o padre diz.
Vinni pega o meu. A aliança é pesada, cravejada de diamantes que custaram mais do que a moral de todos nesta sala juntos.
Ele segura minha mão.
*Dói.*
Não porque ele aperte.
Mas porque é a primeira vez que nos tocamos *sem raiva.*
Desliza o anel no meu dedo.
— *Com este anel, eu te aceito como minha esposa,* ele diz, a voz rouca.
*Mentira.*
*Mentira.*
*Mentira.*
Repito as palavras mecânicamente quando é minha vez. O anel dele desliza fácil, como se sempre tivesse pertencido ali.
O padre nos declara marido e mulher.
— *Pode beijar a noiva.*
O silêncio na igreja é tão denso que quase dá para mastigar.
Vinni se inclina.
Eu me arqueio como um gato prestes a atacar.
Seus lábios tocam os meus.
É rápido.
Frio.
*Vazio.*
A plateia aplaude.
E assim, Isabella Rossi deixa de existir.
Agora, sou Isabella Orsini.
*Que Deus tenha misericórdia da minha alma.*
O salão de festas é iluminado por mil velas. Champanhe flui como água.
E eu quero morrer.
Vinni e eu dançamos a valsa nupcial como dois estranhos, nossos corpos perfeitos na postura, nossos corações a milhas de distância.
— *Você está tremendo,* ele murmura no meu ouvido.
— *É o ódio,* respondo, os dedos cravados no ombro dele. *É contagiante.*
Ele ri, baixo, e o som vibra contra meu peito.
— *Pelo menos não estamos mentindo mais.*
— *Sobre o quê?*
— *Que isso não nos afeta.*
Puxo o rosto para trás para olhar nos seus olhos.
— *Não afeta.*
Ele levanta uma sobrancelha.
— *Claro que não.*
A música termina. Nos separamos como dois oponentes saindo de um ringue.
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### **A Noite – O Fim do Começo**
É tarde quando finalmente nos deixam sozinhos.
Nosso quarto de casal é grande, luxuoso, e parece uma cela.
Vinni fecha a porta atrás de si e solta um suspiro pesado, afrouxando a gravata.
— *Bem,* ele diz, olhando para a cama king-size. *Eu durmo do lado esquerdo.*
— *Ótimo. Eu durmo em outro quarto.*
Viro para sair, mas ele pega meu pulso.
— *Isabella.*
Paro, mas não me viro.
— *O que?*
Há uma pausa longa.
— *Nada.*
Ele solta meu braço.
Saio sem olhar para trás.
Mas no corredor, paro.
Respiro.
E pela primeira vez hoje...
*Choro.
O corredor da mansão Orsini é frio como o túmulo que meu casamento deveria ser.
Minhas lágrimas secam tão rápido quanto surgiram – raiva queimando o medo, como sempre.
*Não. Não vou chorar por isso. Não por ele.*
Dou um passo. Depois outro.
Até que ouço:
— *Você realmente vai fugir na nossa primeira noite?*
Vinni está na porta do quarto, a gravata desfeita, o primeiro botão da camisa aberto. A luz baixa do corredor acentua o cansaço nos seus olhos.
— *Não é fuga se o território é inimigo,* respondo, virando para enfrentá-lo.
Ele sorri, mas não é o sorriso de provocação de sempre. É algo mais cansado.
— *Então vem negociar a rendição.*
— *Não tenho nada pra negociar.*
— *Mentira,* ele diz, simples, como se fosse óbvio. *Você sempre tem algo a perder. Todo mundo tem.*
O silêncio cai entre nós.
Ele tem razão.
E eu odeio isso.
Entro no quarto como quem pisa em território minado.
Vinni fecha a porta e vai direto para a cômoda, onde despeja os pertences dos bolsos: chaves, carteira, um canivete idêntico ao meu.
*Pelo menos somos parecidos em algo.*
— *Você pode ficar com a cama,* ele diz, sem olhar para mim. *Eu durmo no sofá.*
Olho para o móvel em questão – um sofá de veludo que custa mais que um carro, mas que não cabe nem metade do seu corpo.
— *Vai acordar todo torto.*
— *Já acordei pior.*
Ele finalmente vira, e nossos olhos se encontram.
Há algo estranho no olhar dele. Algo que não consigo decifrar.
— *O que?* peço, defensiva.
— *Nada. Só...* Ele hesita. *Você está com a maquiagem manchada.*
Levo a mão ao rosto, como se pudesse esconder.
— *Não importa.*
— *Importa,* ele diz, e pega um lenço do bolso. *Aqui.*
Fico parada, olhando para o pano branco estendido.
— *Eu não preciso da sua ajuda.*
— *Eu sei.*
E ainda assim, quando ele joga o lenço na minha direção, eu pego.
O tecido é macio contra minha pele. Cheira a him – a madeira quente e algo mais, algo que não consigo nomear.
— *Obrigada,* murmuro, contra minha vontade.
Ele acena com a cabeça e vai até o armário, pegando um travesseiro e uma coberta.
Observo enquanto ele prepara o sofá, os músculos das costas tensionando sob a camisa.
*Por que isso parece tão... errado?*
— *Vinni.*
Ele pára.
— *A cama é grande o suficiente para dois.*
Dessa vez, sou eu quem hesita.
— *Não quero sua piedade.*
— *Não é piedade,* respondo, os dedos apertando o lenço. *É lógica. Se você acordar com as costas travadas, vai ficar insuportável.*
Ele ri, baixo.
— *Justo.*
Há outra pausa.
— *Eu não vou te tocar,* ele diz, sério. *Você sabe disso, né?*
*Sei?*
Não respondo.
Ele pega o travesseiro e volta para a cama, deixando um espaço largo entre nós.
Deito do meu lado, de costas para ele, ainda vestida no meu robe sobre o pijama.
As luzes se apagam.
A escuridão é absoluta.
E então, no silêncio, ele fala:
— *Boa noite, Isabella.*
Feicho os olhos.
— *Boa noite, Vinni.*
E pela primeira vez em dez anos..
Chamo ele pelo nome
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