Capítulo 3 – O Encontro na Praça

O sol da manhã entrava pela janela do quarto como um convite silencioso para sair. Leonardo acordou cedo, o corpo um pouco dolorido pela cama simples, mas a mente mais leve do que esperava. Havia algo reconfortante naquela rotina desacelerada, ainda que estranha para alguém acostumado ao luxo e à correria.

Depois de tomar um café com pão caseiro preparado por Dona Amélia, ele saiu para caminhar. A cidade parecia pequena demais, mas cheia de vida. Crianças brincando nas calçadas, senhores conversando em bancos de praça, e um silêncio diferente — não o silêncio do isolamento, mas da presença.

Foi quando seus passos o levaram até uma pracinha rodeada por árvores antigas. No centro, havia um coreto branco, e logo à frente, um muro largo que servia como tela para algo inesperado: um mural sendo pintado com cores vibrantes.

Curioso, Leonardo se aproximou. Viu várias crianças ao redor de uma jovem que, pincel na mão, orientava os pequenos com paciência e sorrisos. Os cabelos castanhos estavam presos de maneira desajeitada, e um pouco de tinta coloria sua bochecha. Ela ria com facilidade, envolvida completamente naquele momento.

Ele parou, observando à distância. Algo naquela cena o prendeu — talvez a leveza, talvez a forma como ela parecia pertencer ao lugar, como se fosse parte da paisagem. Seus olhos não conseguiam desviar dela.

— Quer pintar também? — disse uma voz infantil, puxando-o de seus pensamentos.

Leonardo olhou para baixo e viu uma menininha de tranças, com um pincel estendido em sua direção.

— Acho que não sou muito bom nisso — respondeu ele, surpreso com a abordagem.

— Ninguém é bom até tentar — disse a menina, com a sabedoria inocente de quem ainda não aprendeu a duvidar de si mesma.

Antes que pudesse responder, a jovem do mural se virou, notando a interação.

— Ei, você é novo por aqui — disse ela, caminhando até ele com passos firmes. — Nunca te vi nessa praça.

— É porque eu nunca estive nela — respondeu Leonardo, sem jeito.

— Então seja bem-vindo. — Ela estendeu a mão, sorrindo. — Clara.

— Leonardo.

Os dedos dela estavam sujos de tinta, e mesmo assim ele apertou sua mão, como se aquele toque simples tivesse um peso inesperado.

— Está de passagem? — ela perguntou, voltando o olhar para as crianças.

— Mais ou menos. Vim visitar minha avó.

— Dona Amélia?

Ele assentiu, surpreso por ela saber.

— Todos conhecem todos por aqui — disse Clara, com um sorriso leve. — E sua avó é uma lenda.

Leonardo soltou uma risada. Fazia tempo que não ria com tanta naturalidade.

— Está pintando esse mural com as crianças?

— Projeto voluntário. Toda semana fazemos uma atividade diferente com os pequenos do bairro. Eles ajudam, criam, sujam tudo… e no final, aprendem algo — disse ela, orgulhosa. — E eu também.

— Você é professora?

— De arte. Mas meu salário vem da livraria da esquina. Dar aulas aqui é por amor. E por teimosia — completou, com humor.

Leonardo ficou em silêncio por um instante, tentando processar aquilo. Ele não sabia que tipo de gente fazia esse tipo de coisa. Estava acostumado a pessoas que cobravam até pelo tempo. Clara era diferente. Muito diferente.

— Vai ficar olhando ou vai ajudar? — ela perguntou, entregando-lhe um pincel grosso. — Tem uma parede aqui esperando por cor.

— Já disse que não sou bom nisso.

— E eu já disse que ninguém é até tentar.

Ele pegou o pincel, hesitante. Aproximou-se da parede e, com um traço tímido, passou um pouco de azul ao lado de um desenho de nuvem. As crianças riram, incentivando-o.

— Está vendo? Já começou — disse Clara.

Leonardo não percebeu o tempo passar. Quando deu por si, o sol já estava mais alto, e seu pincel estava manchado de várias cores. Conversou com Clara sobre tintas, arte, livros e, surpreendentemente, sobre silêncio. Ela falava com paixão até mesmo sobre o som das folhas quando o vento soprava.

— Você parece ver beleza em tudo — comentou ele, intrigado.

— É que a vida já me mostrou o suficiente de feiura. A gente escolhe onde mirar os olhos — respondeu ela, com sinceridade.

Leonardo ficou com aquela frase na cabeça durante o resto do dia. Nunca tinha ouvido algo tão simples soar tão verdadeiro. Pela primeira vez, ele sentia que havia mais naquele lugar do que só calmaria rural. Havia algo que o fazia querer voltar no dia seguinte.

E, mesmo sem perceber, foi exatamente isso que ele fez.

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