Sinais do Despertar

Dezesseis anos haviam se passado desde aquela noite chuvosa. A lembrança ainda rondava os sonhos de Valentina como uma névoa persistente, mas cada vez que acordava, era como se o tempo tivesse levado as respostas com ele.

Ela vivia com a família adotiva em uma cidade pequena, cercada por colinas e florestas espessas que pareciam esconder mais do que apenas árvores. Os Dantas, seus pais adotivos, eram bondosos e simples, e sempre trataram Valentina e Luna como filhas de sangue. Mas mesmo com o amor deles, Valentina carregava a sensação de que não pertencia completamente àquele mundo.

Naquela manhã, ela acordou sobressaltada. O mesmo sonho de novo. Chamas negras e douradas dançavam ao redor de si, e no centro havia uma figura com asas... uma branca e uma negra. Ela estendia a mão para Valentina, mas quando esta tentava tocar, tudo se desfazia em poeira.

— Sonhos de novo? — perguntou Luna ao vê-la na cozinha, já com uma caneca de chá nas mãos.

Valentina assentiu, o olhar distante. — Está piorando. Sinto como se... algo estivesse vindo. E ontem à noite, o espelho no meu quarto… trincou sozinho.

Luna franziu o cenho. — Isso aconteceu comigo também. Mas foi a janela. Estava fechada, e de repente estilhaçou. Tem alguma coisa errada, Val.

Elas trocaram um olhar longo. Desde pequenas, compartilhavam mais do que o mesmo teto — compartilhavam sensações. Quando uma ficava doente, a outra sentia. Quando uma sonhava com algo estranho, a outra via ecos no dia seguinte. Mas ultimamente, tudo parecia estar se intensificando.

Naquela tarde, as duas decidiram caminhar até o bosque. Era um refúgio para ambas, um lugar onde podiam respirar sem sentir o peso da cidade ou do mundo que as rodeava. O céu estava coberto por nuvens pesadas, e o vento trazia um cheiro de terra molhada e eletricidade.

— Sente isso? — Valentina perguntou, parando abruptamente. O ar estava denso, vibrante. Uma energia diferente percorria a floresta como um sussurro.

Luna olhou em volta. — Sim… mas não é daqui.

Valentina deu mais alguns passos à frente, se afastando um pouco da amiga. Uma clareira se abria diante dela, e bem no centro, uma pedra antiga com inscrições que ela não compreendia. Mas algo a chamava. Um zumbido baixo preencheu seus ouvidos, e seus dedos começaram a formigar.

Ela estendeu a mão.

No instante em que tocou a pedra, uma onda de energia explodiu ao seu redor. As folhas se ergueram, o vento uivou, e seus olhos se apagaram por um segundo. Quando voltou a si, a pedra estava rachada e sua mão brilhava — uma luz dourada de um lado, sombras pulsando do outro.

— Valentina! — a voz de Luna ecoou, distante.

Mas antes que pudesse responder, algo se moveu entre as árvores. Um vulto, rápido, feroz. A floresta parecia prender o fôlego. Valentina virou-se, e foi então que o viu.

Ele estava parado a poucos metros. Alto, imponente, os olhos vermelhos como brasas vivas. Cabelos escuros caíam sobre a testa, e a aura ao redor dele era selvagem, quase indomável. Mas não era isso que a fez estremecer. Era a sensação de reconhecimento. Algo dentro dela reagiu à presença dele — como se suas almas já tivessem se cruzado em outra vida.

— Quem é você? — ela perguntou, a voz falhando entre o medo e a curiosidade.

O estranho inclinou levemente a cabeça. — Eu é que deveria perguntar isso.

A tensão entre os dois era palpável. Valentina sentia os pelos dos braços se eriçarem, e o coração batia como um tambor de guerra. Mas não havia hostilidade nos olhos do homem — apenas confusão... e algo mais.

— Você não é humana — ele disse, após alguns segundos. — Nem um pouco.

Ela não sabia o que responder. Pela primeira vez, alguém falava em voz alta o que ela sempre temeu.

— E você? — retrucou.

Um sorriso lento apareceu nos lábios dele. — Sou Klaus. Alfa desta região. E você está em território de lobos.

Valentina deu um passo para trás, o instinto gritando em sua mente. Mas ao mesmo tempo, algo a fazia querer se aproximar. Aquele nome... Klaus. Soava familiar, mesmo que ela tivesse certeza de nunca tê-lo ouvido antes.

Antes que qualquer um pudesse dizer mais alguma coisa, Luna apareceu, ofegante. Ela olhou de Klaus para Valentina, e seus olhos se estreitaram.

— Vamos. Agora — disse, puxando a amiga pelo braço.

Klaus não a impediu. Apenas observou enquanto elas se afastavam. Mas antes de desaparecer na floresta, disse algo que ficou gravado na mente de Valentina:

— Nos veremos de novo, híbrida.

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