Olhares Que Dizem Demais.

O carro de Camila se aproximava da rua estreita onde morava Isadora Figueira. As luzes dos postes lançavam sombras compridas nas calçadas, e a noite em Nápoles tinha aquele ar vibrante e caótico típico da cidade.

Camila diminuiu a velocidade, encostando o carro em frente ao portão da amiga.

— Lá vai você parar aqui pra levar essa chata da Isadora... — murmurou Lorayne com impaciência, cruzando os braços. — Eu não gosto dela.

Camila manteve os olhos na frente, contendo o suspiro.

— Lorayne, ela é minha melhor amiga. E, ao contrário de você, ela não julga o meu carro.

Antes que a discussão continuasse, Isadora apareceu no portão com o cabelo preso num rabo de cavalo, uniforme simples e sorriso aberto. Caminhou até o carro e abriu a porta de trás com naturalidade.

— Boa noite, amiga! — disse animada, entrando.

— Boa noite, Isa — respondeu Camila com um sorriso sincero.

Lorayne não disse nada. Apenas virou o rosto, olhando pela janela com tédio declarado.

Camila deu a partida, e o carro voltou a se mover pelas ruas movimentadas da cidade. Passavam por pequenos mercados ainda abertos, por becos barulhentos com motos e buzinas, e por luzes piscando em anúncios antigos.

No banco de trás, Isadora farejou discretamente o ar e fez uma careta dramática.

— Nossa, Layane... você tomou banho de perfume ou nem tomou banho mesmo?

Ela soltou uma risada alta e divertida, que contagiou Camila instantaneamente. A motorista riu, mesmo tentando se conter.

Lorayne virou-se bruscamente.

— Cala a boca, Isadora.

O clima no carro oscilou num segundo entre o riso e o silêncio. Camila apenas balançou a cabeça, sem dizer nada. Na verdade, ela já estava acostumada com aquele atrito — mas sabia que, por trás das farpas, um dia alguma verdade ia explodir.

O carro seguia firme pela estrada. A cidade se acendia ao redor. O destino era a Cantina Santo Maré, onde a noite prometia muito trabalho... e talvez, muito mais.

Se seria uma boa noite?

Talvez sim.

Talvez não.

Tudo dependia do que — ou de quem — as esperava do outro lado da porta dourada do restaurante mais elegante da cidade.

A Cantina Santo Maré brilhava sob as luzes de fachada. As mesas ao ar livre estavam quase todas ocupadas, o aroma de massa fresca e temperos italianos preenchia o ar. Henrique já estava na porta, vestindo camisa social escura, mangas dobradas até os cotovelos e o cabelo bagunçado de quem chegou às pressas.

Ele havia acabado de deixar o pai, Otávio, Otávio já ter entrado no restaurante direito para o escritório para resolver algumas pendências administrativas. Agora, observava o movimento, mantendo a postura de quem comanda, mas com o olhar distraído, até ser puxado de volta pela presença barulhenta de Lorayne.

— Boa noite, Henrique — disse ela, se aproximando com um sorriso forçado e um rebolado proposital.

Henrique franziu levemente o nariz antes de responder.

— Nossa, Lorayne... que cheiro forte é esse?

Antes que ela dissesse qualquer coisa, Isadora passou por trás rindo e respondeu com a língua afiada de sempre:

— Ela tomou banho de perfume, chefe!

Camila riu baixinho, contendo o riso com a mão.

Lorayne girou nos calcanhares e lançou um olhar mortal para Isadora.

— Cala a boca, Isadora! Eu tomei banho sim, tá?

Henrique apenas balançou a cabeça, tentando disfarçar a expressão de desconforto. Mas tudo mudou quando Camila se aproximou.

Os olhos dele pararam nela como se o resto da rua tivesse sido silenciado. O movimento do restaurante, as vozes ao redor, os farois dos carros... tudo pareceu desaparecer por um segundo.

— Boa noite, Camila — disse ele, com um sorriso sincero e quase tímido.

— Boa noite, senhor Henrique — respondeu ela, educada, com os olhos doces como sempre.

— Para de me chamar de “senhor”... não sou tão velho assim — ele riu, tentando parecer casual, mas o brilho no olhar o traía.

Lorayne revirou os olhos, já na pura inveja, e puxou a prima pelo braço, tentando encerrar aquela troca de olhares.

— Vamos, Camila. Temos trabalho.

Isadora apenas riu de canto, enquanto passava pela porta com um aceno leve.

Camila olhou uma última vez para Henrique antes de entrar, e ele permaneceu ali, observando até a última ponta do cabelo dela desaparecer por trás da porta.

Ele gostava dela.

Mas nunca teve coragem de dizer.

Ainda.

Dentro da Cantina Santo Maré, o clima era elegante e agitado. As luzes amarelas aqueciam o salão decorado com plantas suspensas, garrafas de vinho nas prateleiras e música ambiente italiana que preenchia o ar sem incomodar. O restaurante estava lotado — como de costume nas noites de sexta-feira.

Camila ajeitava o avental com delicadeza enquanto se dirigia ao balcão para pegar os pedidos. Sorriu para uma cliente, anotou com calma, e logo voltou com uma bandeja bem equilibrada: um copo alto de suco de laranja gelado, uma porção de batata frita, frango grelhado com arroz branco, feijão e salada.

— Aqui está, senhor. Bom apetite — disse com um sorriso gentil, colocando os pratos com cuidado na mesa.

Enquanto isso, Henrique observava tudo do caixa. Seus olhos fixaram cada movimento de Camila com um brilho discreto — um tipo de admiração silenciosa que ele nunca soube esconder muito bem.

Mas alguém ali via isso com olhos diferentes.

Lorayne, parada ao lado do balcão, segurava uma bandeja vazia enquanto bufava para si mesma.

— Você nunca vai ficar com o Henrique, Camila... — murmurou entre os dentes. — Agora quem vai te mostrar quem manda aqui sou eu. Se ela não notar ele, eu noto. Essa minha prima sem sal... e ainda gosta de tudo que é pobreza.

O ciúme ardia como pimenta em sua garganta.

Do outro lado, Isadora percebeu a aura venenosa se formando. Não pensou duas vezes.

— Lorayne, para de ficar parada! Anda, mulher! O restaurante tá cheio! Vai ajudar ou vai morrer resmungando aí?

Lorayne virou os olhos, engolindo a resposta. Passou por Isadora esbarrando de propósito, furiosa.

— Você é chata... — parou no meio da frase, sussurrando algo incompreensível.

Isadora levantou uma sobrancelha, com um sorriso provocador no canto da boca.

— Ih, ia me xingar, né?

Lorayne fingiu não ouvir e seguiu, furiosa, enquanto o salão se enchia de vozes e pedidos.

Camila continuava sua noite com dedicação, recebendo elogios dos clientes pelo bom atendimento. Seu sorriso era suave, mas seu foco era firme.

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Comments

Ismael Junior

Ismael Junior

imagino o cheiro desse perfume kkk

2025-05-03

2

Jéssica Bacchiega

Jéssica Bacchiega

Essa trecho me deu até um arrepio. Gosto quando um simples olhar já diz tudo.
/Drool/

2025-05-02

1

Cris Cherry

Cris Cherry

Kkkkkk E ela se achando com esse perfume

2025-05-02

1

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