no saguão do campus, um lugar amplo com paredes de vidro e mesas de mármore, onde a luz do sol entrava em diagonais perfeitas, iluminando cada detalhe do espaço. Ayden havia chegado quinze minutos antes, como sempre fazia, pontualidade sendo uma de suas muitas obsessões. Seu sketchbook estava aberto sobre a mesa, a caneta deslizando com precisão entre traços retos e sombras calculadas, cada movimento um testemunho de seu controle meticuloso.
Kai chegou com o sol refletindo em seus piercings, a mochila caída nas costas de um jeito que sugeria desleixo, mas também uma certa rebeldia calculada. Jogou-se na cadeira à frente de Ayden, esticando as pernas com um suspiro entediado, como se já estivesse cansado antes mesmo de começar.
— Que animado você tá — Ayden disse, sem erguer os olhos do papel, a voz tão seca quanto o traço de sua caneta.
— Você tá animado o suficiente pelos dois — retrucou Kai, apoiando o queixo na mão, os dedos batendo uma batida irregular na mesa. — Qual é o plano, chefe? Você me manda desenhar enquanto finge que fizemos juntos?
Ayden ergueu os olhos, o olhar cortante como vidro, capaz de furar até a couraça de indiferença de Kai.
— O plano é que eu não preciso que você faça nada. Só não atrapalhe.
Kai sorriu, daquele jeito que irritava mais do que qualquer insulto. Um sorriso que dizia: eu sei que você me odeia, e eu adoro isso.
— Relaxe, príncipe. Eu sei desenhar. Só não sigo a cartilha da perfeição.
— Ah, é. Você prefere o caos estilizado e sem técnica.
— E você prefere um caixão de regras onde a criatividade vai pra morrer.
A tensão crescia a cada troca de palavras, o ar entre eles carregado de uma eletricidade quase palpável. O contraste entre os dois era quase simbólico — como se a proposta do trabalho tivesse sido pensada só para eles, uma ironia do destino ou, quem sabe, um teste cruel do professor.
— “Conflito e Contraste”… — Ayden murmurou, batendo a ponta da caneta contra a mesa, o som ecoando como um metrônomo. — Talvez o professor tenha feito isso de propósito.
— Aposto que sim — Kai riu, o som áspero e despretensioso. — Deve ser fã de reality show.
— Isso aqui é sério, Kai. Essa apresentação vale 30% da nota final.
— Relaxa. Eu não tô aqui pra afundar ninguém. Não sou tão cruel.
— Só preguiçoso.
— E você, só é insuportável.
O silêncio caiu sobre a mesa por alguns segundos, mas havia algo nele que não era vazio. Era denso. Tenso. Como um campo magnético prestes a entrar em curto, a energia entre eles acumulando-se em ondas invisíveis.
Kai se levantou primeiro, pegando uma caneta qualquer da mochila, um modelo barato que ele provavelmente havia roubado de alguma sala de aula.
— Ok, me mostre o que você tem aí. Vamos ver se sua perfeição sabe trabalhar em equipe.
Ayden hesitou, os dedos tensionando por um instante antes de virar o sketchbook. Havia uma cena rascunhada: dois personagens presos dentro de uma moldura quebrada, um em preto e branco, com linhas precisas e sombras impecáveis, o outro em cores vibrantes, quase transbordando dos limites do papel.
Kai se aproximou, os olhos vagando pelo desenho, a postura relaxada dando lugar a uma atenção incomum. Por um momento, ele ficou sério, a máscara de desdém escorregando.
— Isso é... bom.
— “Bom”? — Ayden franziu o cenho, como se a palavra fosse um insulto disfarçado.
— Não me entenda mal. Eu detesto admitir, mas... tem algo aí.
Ayden observou Kai com cautela, os músculos da mandíbula tensionados. Aquela mudança súbita no tom, quase respeitosa, era desconcertante. Não era o que ele esperava.
Kai se sentou de novo, pegou seu próprio sketchbook e o abriu com um movimento brusco. O estilo era completamente diferente: rabiscos soltos, linhas curvas e distorcidas, como se cada traço fosse um reflexo direto de seus pensamentos. Mas havia expressão, força, intensidade — algo que Ayden não podia ignorar, por mais que tentasse.
Ayden não quis admitir, mas aquilo também... era bom.
Talvez, pensou ele com irritação, o problema fosse exatamente esse. Eles eram bons demais… um ao lado do outro. E isso, de alguma forma, era pior do que qualquer rivalidade.
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Atualizado até capítulo 50
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