Segunda Chance
O sol do fim da tarde refletia no para-brisa do carro alugado, dourando os campos que se estendiam até onde a vista alcançava. Lia apertou os dedos no volante, o maxilar travado. O GPS anunciava que faltavam apenas cinco quilômetros até o destino, mas a estrada de terra parecia se arrastar por uma eternidade.
Era estranho estar ali, depois de tantos anos ignorando completamente aquele lugar. Ela nunca pensou que voltaria. Muito menos que herdaria a casa do pai que praticamente a abandonou.
Suspirou fundo, ajustando os óculos escuros no rosto. O ar-condicionado do carro lutava contra o calor abafado. Tudo nela gritava desconforto: a saia justa demais, o salto afundando no barro da entrada, o cabelo perfeitamente preso que já começava a desmanchar com a umidade.
Quando finalmente parou diante da casa — uma construção simples, cercada de árvores antigas — ela desceu e encarou a madeira gasta, as janelas semiabertas, o silêncio absoluto ao redor. Uma parte dela esperava sentir algo. Raiva. Saudade. Qualquer coisa. Mas tudo que sentia era um vazio incômodo.
— Parece que a cidade grande não te preparou pra isso.
A voz grave a pegou de surpresa. Lia se virou abruptamente, o coração disparando. Um homem estava encostado numa moto preta, braços cruzados, expressão neutra. Os cabelos bagunçados pelo vento, os olhos escuros a observando com um quê de desafio. Ele vestia uma camiseta cinza manchada de graxa, calça jeans surrada, e exalava uma mistura de óleo, suor e algo perigosamente masculino.
— Quem é você? — ela perguntou, instintivamente erguendo o queixo.
Ele deu um meio sorriso, lento, quase provocador.
— Oliver. Cuido da oficina aqui perto. Seu pai era meu cliente... às vezes amigo, às vezes dor de cabeça. — Ele a encarou. — E você é a filha fantasma, né?
Lia sentiu o estômago revirar, mas manteve a postura firme. Ela estava acostumada a enfrentar pacientes em colapso emocional. Um mecânico com atitude não seria problema.
— Não costumo lidar com fantasmas — respondeu, seca. — Só com os vivos... e os quebrados.
Oliver arqueou uma sobrancelha, como se estivesse decidindo se aquilo era uma ameaça ou um convite.
— Aqui todo mundo tem um pouco dos dois.
O silêncio se instalou entre eles, denso como o ar da tarde. Lia sentiu a pele arrepiar, mas não era por causa do clima. Era por causa dele.
E ela odiava admitir isso...
A casa estava tomada por poeira e silêncio. Lia atravessava os cômodos como quem caminha por um campo minado. Cada objeto, cada móvel coberto por lençóis brancos, parecia esconder lembranças que ela não queria desenterrar.
A cozinha ainda tinha cheiro de café velho. O corredor rangia sob seus pés. E, no quarto do pai, sobre a cômoda, ela encontrou uma fotografia: os dois, ela ainda criança, sorrindo ao lado de uma moto antiga. O mesmo modelo que agora repousava na lateral da oficina que vira mais cedo, coberta por uma lona desbotada.
Ela quase não se lembrava daquele dia. Mas Oliver, pelo visto... lembrava.
"Continua espero que goste da história "
Desde já obrigado 🙂
Lia 😌😌
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Atualizado até capítulo 42
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