Capítulo 2 – O Guerreiro Exilado
A floresta parecia diferente naquela manhã. As árvores sussurravam em uma língua esquecida, e a luz que filtrava pelas copas oscilava como se o mundo não tivesse certeza de que dia era. Elara caminhava ao lado de Kael, mas cada passo ao lado dele era um lembrete do quanto sua vida mudara em apenas uma noite.
— Você sempre aparece no escuro? — ela perguntou, tentando quebrar o silêncio tenso.
Kael arqueou uma sobrancelha.
— Eu sou das Terras Sombrias. É natural.
— Isso não é exatamente reconfortante.
— Não estou aqui para te confortar, Elara — ele respondeu, sem olhar para ela.
Ela parou no meio da trilha.
— Então por que está aqui? Por que não fugiu para a floresta e deixou tudo para trás?
Ele parou também, os olhos prateados fixos nos dela.
— Porque a profecia nos uniu. Porque a marca pulsa toda vez que você respira. Porque, por algum motivo, o destino decidiu brincar com um guerreiro quebrado e uma curandeira cheia de luz.
— Não sou feita de luz — ela murmurou.
— Não? Então por que me cega quando me olha assim?
O silêncio caiu entre eles de novo, denso, carregado. Elara sentia as palavras de Kael como faíscas na pele. Não era apenas o que ele dizia, mas como dizia — como se ela fosse uma força da natureza que ele mal conseguia controlar.
Eles continuaram a caminhada até chegarem a uma clareira esquecida, onde as pedras formavam um círculo antigo. Símbolos estavam gravados nas rochas — a mesma espiral de chamas que marcava suas peles.
— Este é o Círculo dos Selados — Kael disse, olhando ao redor. — Foi aqui que os portadores da marca se encontraram pela última vez, há mais de mil anos.
Elara se aproximou das pedras, sentindo uma vibração estranha sob os pés.
— E o que aconteceu com eles?
— Morreram. Uns pelas mãos dos próprios reinos. Outros... um pelo outro.
Ela se virou devagar.
— Você diz isso como se estivesse acostumado a perder.
Kael caminhou até ela, sem pressa. Seus dedos tocaram levemente a marca na clavícula dela, como na noite anterior.
— Eu sou. Mas não quero perder isso.
Elara quase recuou — quase. Mas havia algo na presença dele que a ancorava, que a puxava como correnteza. Ela não sabia o que era mais perigoso: o destino... ou Kael.
— E o que exatamente é isso? — ela sussurrou.
Ele a olhou como se ela fosse feita de estrelas.
— É a única coisa que me faz sentir vivo desde que fui exilado.
Ela prendeu a respiração. Os olhos dele não vacilavam, e Elara podia sentir o calor entre eles, denso, eletrizante.
— Kael... eu não sei se posso confiar em você.
— Então me teste.
— Como?
— Fique perto. E escute o que seu corpo diz.
Elara sentiu o rosto corar. As palavras dele não eram vulgares — eram cruas, intensas, sinceras. E, mesmo que quisesse negar, havia uma parte dela que já estava ouvindo.
— Isso é loucura — ela disse.
Kael sorriu, lento, perigoso.
— Tudo o que vale a pena é.
Ela se afastou um passo, tentando manter a sanidade. Precisava de clareza. Precisava de ar.
— Preciso... pensar.
— Pensar pode ser traiçoeiro. Sentir é mais honesto.
Elara virou-se e caminhou até uma das pedras, sentando-se com as mãos no colo. O mundo estava mudando rápido demais, e ela estava no centro de algo que não compreendia completamente.
Kael sentou-se a alguns passos dela, mantendo a distância, mas não o olhar.
— Você quer saber por que fui exilado?
Ela o encarou.
— Se quiser me contar.
Ele apoiou os cotovelos nos joelhos e olhou para o chão.
— Porque amei uma princesa. E matei o irmão dela para protegê-la.
Elara ficou em silêncio. Não esperava algo assim.
— E ela?
— Me denunciou. Disse que eu era perigoso. Que eu... a enfeitiçara.
— E você?
Ele a olhou nos olhos.
— Eu só queria que ela fosse livre. Mesmo que isso significasse ser preso pelas correntes que eu mesmo criei.
Elara sentiu algo apertar no peito. Havia verdade demais naquela voz. Dor demais.
— E agora?
Kael se aproximou um pouco mais.
— Agora vejo você. Com sua luz, sua força. E quero acreditar que talvez, só talvez, eu tenha outra chance de fazer certo.
Ela não recuou quando ele encurtou a distância. Não protestou quando ele ergueu a mão e acariciou de leve uma mecha do cabelo dela.
— Você me assusta, Kael.
— Porque vê algo em mim... ou porque sente algo?
Ela engoliu em seco.
— Ambos.
Ele se inclinou levemente, a respiração quente roçando o rosto dela.
— Então estamos empatados.
Por um segundo, Elara achou que ele fosse beijá-la. O mundo parou. O som da floresta desapareceu. Apenas o coração dela martelava no peito, e a marca queimava como fogo líquido.
Mas Kael se afastou.
— Ainda não — disse, com um sorriso leve e um olhar faminto. — Quando você me beijar, Elara... vai ser porque quer. Não porque o destino mandou.
E, com isso, ele se levantou, deixando-a ali, no meio das pedras antigas e da confusão em seu peito.
Elara passou a mão sobre a marca e sussurrou para si mesma:
— O que eu estou
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Atualizado até capítulo 21
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