Logan se aproximou do bebedouro, enxugando o suor da testa com a barra da camisa. O treino tinha pausado por alguns minutos, e ele aproveitou pra escapar dos gritos do treinador.
Me aproximei, ainda com o livro na mão e o ratinho seguro dentro da mochila, em uma caixinha improvisada com papel — não ia largar ele ali com a Clara solta pela escola.
— Logan — chamei, firme, tentando soar casual. — O que o Axel falou pra você? Antes... quando estavam cochichando.
Ele parou, olhou de canto de olho pra quadra — onde Axel batia bola como se nada tivesse acontecido — e depois se virou pra mim, com aquele sorriso sem-vergonha que só ele sabia fazer.
— Tá curiosa, hein?
— Logan — falei, apertando o livro contra o peito —, sem rodeios. O que ele disse?
Logan deu um meio suspiro e baixou um pouco o tom, como se não quisesse que ninguém mais ouvisse.
— Ele só comentou... que o Jayson tá quebrando uma regra do nosso time.
— Uma regra? — franzi a testa, confusa. — Do time?
Logan fez que sim com a cabeça, se inclinando um pouco mais pra perto.
— É. A regra de não se aproximar de você.
Fiquei em silêncio por um segundo. Depois outro. E então me levantei devagar.
— Que. Diabos?
Ele ergueu as mãos, como quem tenta evitar uma explosão.
— Não fui eu que fiz a regra, tá? Nem sei quem começou com isso... Mas a história é que... bom, você é tipo... "intocável".
— Intocável? — quase ri. Quase. — Isso é algum tipo de filme de máfia adolescente?
— Kiraz...
— Não, Logan. Vocês têm uma REGRA pra manter distância de mim? Eu sou o quê, um artefato amaldiçoado? Uma bomba atômica?
Ele coçou a nuca, sem graça.
— É só que... você é irmã do Gaziel, prima do Eliot, e, bom,minha prima meio que... você é você.
— "Você é você"? — repeti, cruzando os braços. — Que tipo de explicação é essa?
— É uma regra velada, Kiraz. Ninguém falou diretamente, mas... tá no ar. Axel meio que mantém esse padrão. E o Jayson tá quebrando. Simples assim.
Olhei pra quadra. Axel me lançou um olhar rápido, e por um segundo, tive certeza de que ele sabia exatamente o que estávamos falando.
— Então foi por isso que ele falou com o Gaziel, e depois com o Eliot. Estavam armando o cerco — murmurei, quase pra mim mesma.
— Não é bem isso...
— Logan — interrompi —, o que Axel disse exatamente?
Ele hesitou. Aí, finalmente, soltou:
— Disse: “Jayson tá forçando a barra. Alguém devia lembrar pra ele onde pisa.” E depois: “Ela não é território livre.”
Senti o estômago revirar. “Ela não é território livre.”
Não sabia o que doía mais — o fato de eles falarem de mim como se eu fosse um lugar, ou o fato de Axel ainda achar que tinha algum tipo de direito de marcar fronteiras.
— Isso é ridículo — falei, sentindo o sangue ferver.
— Eu sei — Logan disse. E, sinceramente, parecia sincero. — Mas, Kiraz... tem coisa que você precisa deixar queimar sozinha. Ou você explode tudo, ou espera até o fogo cansar.
— É, mas às vezes, Logan — olhei direto nos olhos dele —, é exatamente na explosão que as coisas mudam.
E com isso, virei as costas e voltei pra arquibancada.
Se eles acham que podem me cercar com regras não ditas, estavam prestes a descobrir que eu sou uma exceção ambulante.
O treino terminou com o apito do professor ecoando pela quadra. Todos correram para os bancos, pegando garrafas d’água e toalhas. Eu continuei sentada, imóvel, observando o campo como quem lê entrelinhas de um livro.
Depois de alguns minutos, decidi que já era hora de ir. Peguei minhas coisas e segui pelo corredor lateral que passava em frente ao vestiário masculino, o mesmo caminho de sempre. Eu não estava espiando — sério —, mas a porta entreaberta me traiu.
— Cara, você precisa parar com isso — ouvi a voz do Gaziel, firme.
— “Com isso” o quê? — respondeu Jayson. A voz dele soava seca, defensiva.
— Você sabe. A Kiraz. Não é pra você chegar perto.
Dei dois passos pra frente e encostei na parede, coração disparado. Eu sabia que tinha mais coisa ali.
— Sério? Agora tenho que pedir permissão pra conversar com ela? — Jayson rebateu.
— É uma regra, Jayson. Já conversamos sobre isso. — Agora era Eliot quem falava. — Não é só sobre o time. É por respeito.
— Respeito a quem? — Jayson respondeu, a voz ficando mais alta. — Ao Axel?
Silêncio.
E então a voz de Axel soou. Baixa. Controlada. Mas havia um fio de ameaça nela.
— Ela não é qualquer uma, Jayson. E você sabe disso.
Meu peito se apertou. O jeito como ele disse "ela"... Como se tivesse o direito. Como se ainda me conhecesse.
— Sabe o que é engraçado? — Jayson disse, quase rindo, mas sem humor. — Nenhum de vocês chega perto dela. Mas ninguém deixa ninguém mais se aproximar também. É tipo um museu com placa de “não toque”. Patético.
Meu sangue fervia. Era agora ou nunca.
Empurrei a porta com força. Ela bateu contra a parede com um estrondo que fez todos virarem ao mesmo tempo. Uns já estavam vestidos. Outros ainda não. Mas o constrangimento foi instantâneo.
— Se eu sou um museu, então vocês são as múmias — disparei, cruzando os braços, sem nem piscar. — Me falem, por favor: em que século estamos que vocês precisam de uma regra pra controlar quem conversa comigo?
Gaziel arregalou os olhos.
— Kiraz...
— Cale a boca, Gaziel. Tô falando.
Me aproximei mais dois passos, olhando diretamente pra Axel.
— “Ela não é qualquer uma”? — repeti suas palavras, com a voz mais firme que consegui reunir. — Você perdeu o direito de me colocar em qualquer pedestal no segundo em que decidiu sumir. Então não venha agir como se me conhecesse.
Axel sustentou meu olhar. Mas seus olhos estavam sombrios, indecifráveis.
— Kiraz, não é isso que você pensa...
— Não, Axel. É exatamente o que eu penso. E sabe o que mais? Se o Jayson quiser conversar comigo, ele vai. Se quiser fazer dupla comigo, vai também. E se eu quiser escrever um poema sobre ele... você não vai ter nada a ver com isso.
Silêncio total. Só o som de uma torneira pingando lá no fundo.
Jayson sorriu de canto. Eliot coçou a cabeça como quem queria desaparecer. Gaziel parecia dividido entre orgulho e pânico.
Dei um passo para trás, sem quebrar o contato visual.
— Vocês podem continuar suas reuniões medievais. Eu vou viver no presente.
E com isso, me virei e saí.
Mas dessa vez, quem ficou com o olhar preso em mim... foi o Axel.
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Atualizado até capítulo 33
Comments
Dulce Gama
isso Kira não deixa ninguém te pisar chega de ser trouxa vive sua vida amei pelas palavras que falou pra esses babacas ❤️❤️❤️❤️❤️👍👍👍👍👍🌹🌹🌹🌹🌹🎁🎁🎁🎁🎁🌟🌟🌟🌟🌟
2025-04-26
1
Dora Silva
tadinha da kiraz
2025-04-23
0