A brisa salgada do mar tocava suavemente a minha pele enquanto o som das ondas quebrando na areia era quase hipnótico. O cheiro do peixe fresco no ar misturava-se com a terra úmida da praia, e a rotina diária se desenrolava diante dos meus olhos, como se fosse um filme que nunca se cansava de rodar. As vozes dos pescadores se misturavam, algumas mais altas, outras abafadas pela distância. O barco de Antônio, simples mas robusto, estava encostado na areia, como se descansasse após um dia exaustivo. Ele tinha as mãos calejadas, e seu rosto enrugado pelo tempo mostrava os vestígios de uma vida inteira dedicada ao mar.
Eu o olhava, a tensão e o cansaço em seus olhos, enquanto ele começava a falar com aquela voz rouca, mas cheia de uma sabedoria que só a idade e a experiência poderiam trazer.
"Vou começar a história, menina", disse Antônio, enquanto se ajeitava na areia, com os olhos fixos no horizonte, como se buscasse nas ondas algo além da simples linha do mar. "Em tempos muito distantes, há mais de duzentos anos atrás, havia um rei, Thalor. Um rei feérico, como dizem. O sonho dele era encontrar o amor da sua vida, mas ele não sabia com quem iria se deparar..."
Ele fez uma pausa, como se as palavras precisassem ser mastigadas, ponderadas, antes de seguir. O som da água e dos pescadores ao fundo parecia se dissipar enquanto eu me perdia em sua narrativa. Uma sensação estranha e desconfortável começou a se formar em meu peito. "Ele acabou se apaixonando por uma deusa, nada mais poderosa, e a que trazia luz a esse mundo: Fênix. Mas Fênix... Fênix era uma das criaturas mais duras daquele planeta. Ela não tinha dó nem piedade de ninguém."
Meu corpo estremeceu com a menção do nome Fênix, uma sensação inexplicável percorrendo minha espinha. Eu pensava, mas não queria pensar demais. O mar continuava a rolar, o vento continuava a soprar, e as palavras de Antônio entraram em meu coração como um sussurro: algo estava começando a se revelar.
"Quando o rei percebeu que não poderia ter o amor da Fênix, ele a golpeou com a espada mágica e a matou, trazendo terror ao mundo mágico", Antônio continuou, e sua voz ficou mais baixa, mais sombria. "Foi aí que a maldição caiu sobre este mundo, menina. E o mundo se transformou em terras sombrias."
Eu senti um arrepio percorrer meu corpo. As palavras de Antônio estavam se colando na minha mente, e uma dor que eu não compreendia me envolvia. Lembrei-me de algo, um pesadelo talvez, ou um sonho recorrente... O golpe. A dor. O sangue. Mas não podia ser... não podia ser minha história, não poderia.
"Mas sempre que a maldição surgia, uma nova Fênix ressurgia. Porém, nunca era a verdadeira", ele prosseguiu, seu tom mais grave agora. "Sempre dura, com um coração impenetrável, uma mente tão rígida quanto o ferro, uma beleza radiante, mas incomum. E elas sempre tinham que ser mortas. Porque, segundo as lendas, apenas uma Fênix... apenas uma delas seria verdadeira."
Eu estava em silêncio. Os pescadores riam ao longe, e o som do mar parecia tão distante, tão irrelevante. Só as palavras de Antônio preenchiam o ar agora.
"Até a verdadeira Fênix ressurgir", ele disse, "todas as outras têm que ser destruídas. E quando a verdadeira Fênix voltar ao seu trono, ela se casará com o herdeiro de quem a matou."
"Mas... mas como as pessoas descobrem quem é a verdadeira Fênix?", perguntei, a voz trêmula. Eu sabia que estava indo longe demais, mas não conseguia controlar a curiosidade, a necessidade de saber mais. Algo dentro de mim gritava, mas eu ignorava.
"Ah... Há apenas uma maneira", Antônio disse, inclinando-se um pouco mais, como se estivesse prestes a compartilhar um segredo antigo. "Fogo, água e terra. Esses três elementos mostram quem é a verdadeira Fênix. Ela é tão poderosa que pode trazer ondas gigantes, destruir montanhas, fazer chover fogo dos céus... E ela é temida, menina, temida por todos."
Meu estômago se revirou. A história se misturava com algo mais, algo que eu não queria admitir. A dor do golpe no pesadelo, a sensação de estar perdida entre duas realidades, o calor e o frio que percorriam meu corpo.
"Mas, como o senhor disse, é só um conto, certo?", falei, tentando dar leveza às palavras, tentando afastar a sensação de que aquilo tudo tinha alguma conexão comigo. "Imagine se essa Fênix fosse de verdade..."
"É, com certeza, menina", Antônio sorriu, levantando-se lentamente e sacudindo a areia do corpo. "Não haveria mais peixes pra me dar se ela resolvesse trazer uma onda pra nossa ilha, não é?"
Eu o observei se afastar, indo em direção à sua casa. "Pois bem, menina. Tô indo agora levar os pequenos peixes que consegui. Foram poucos, mas o suficiente pra vender amanhã. Tchau, Joyce."
Tchau, Sr. Antônio.
Mas enquanto ele se afastava, a história ainda ecoava na minha mente. Como algo tão poderoso poderia ser real? Seria mesmo apenas uma lenda? Ou talvez... algo mais? O golpe, a dor, os elementos. Eu sabia que tudo aquilo estava interligado com algo que eu ainda não compreendia. E a sensação, essa sensação estranha, não me deixava. Como se, no fundo, eu já soubesse de tudo aquilo.
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Atualizado até capítulo 57
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