Naquela noite, o silêncio da catedral foi quebrado apenas pelo som suave dos passos de Gabriel, que caminhava pelos corredores sombrios. Sua mente estava em um turbilhão, os pensamentos se chocando como ondas fortes contra as rochas. Selene ainda estava em sua mente, mais forte do que nunca, mais presente do que ele desejava. Cada passo que dava parecia pesar como um fardo. Ele havia tentado ignorá-la, tentado afastar a dor crescente em seu peito, mas nada funcionava.
Enquanto a noite avançava e a vila mergulhava no sono, Gabriel não conseguia encontrar paz. Seu olhar se fixava no altar, mas seus pensamentos estavam longe dali, nas palavras de Selene, nas promessas não ditas que ela parecia ter feito com os próprios olhos. Ele não conseguia entender o que ela queria dele. O que ela via nele que a fazia continuar a provocá-lo?
A catedral estava vazia, e ele sentiu um vazio interior, mais profundo do que qualquer desolação que pudesse ser encontrada ali. Sentou-se nos degraus do altar, as mãos unidas em oração, mas a única coisa que se passava em sua mente era a imagem de Selene, dançando ao redor da fogueira, sorrindo para ele como se soubesse de um segredo que ele ainda se recusava a admitir.
No dia seguinte, a luz suave do amanhecer entrou pelas vitrais da catedral, e Gabriel sentia o peso de sua decisão cada vez mais pesado sobre seus ombros. Ele precisava tomar uma atitude. Não podia mais ignorar o que sentia. Não podia mais viver com o peso de uma tentação que lhe corroía a alma.
Decidiu ir à vila, procurar por Selene e, finalmente, enfrentar aquilo que ele sabia que estava se tornando incontrolável. As ruas ainda estavam tranquilas, as casas silenciosas, mas Gabriel sentia a inquietude crescente dentro de si. O que ele faria quando a encontrasse? Como diria o que precisava ser dito sem sucumbir ao desejo que parecia consumir sua alma?
Ele seguiu em direção ao acampamento cigano, sabendo que encontrá-la ali não seria fácil. Muitos moradores da vila o evitavam, temendo as superstições sobre os ciganos. Gabriel, no entanto, sentia que precisava encarar de frente essa situação. Selene estava além de seu entendimento, mas ela também era a resposta que ele não sabia que procurava.
Ao chegar ao local, ele viu as tendas de pano e o brilho das fogueiras. O cheiro de madeira queimando e a música que flutuava no ar pareciam convidá-lo a adentrar o mundo desconhecido dos ciganos. Gabriel hesitou, sentindo-se como um homem prestes a cometer um pecado irreparável, mas ainda assim, seus pés o levaram para mais perto.
Selene estava sentada junto ao fogo, conversando com outras mulheres do acampamento. Seu olhar se ergueu quando ela o viu se aproximar, e um sorriso enigmático surgiu em seus lábios. Ela sabia que ele voltaria. Sabia que, apesar das palavras duras que ele havia dito, ele não poderia resistir a ela. Nem ele mesmo entendia por quê.
— Você voltou — disse ela, a voz suave, mas carregada de um mistério que parecia envolver cada palavra.
Gabriel ficou parado por um momento, os olhos fixos nela. Não sabia o que dizer, mas sabia que não podia voltar atrás.
— Eu… — Ele começou, a voz falhando, como se as palavras não fossem suficientes para expressar o turbilhão que ele sentia. — Eu preciso entender o que está acontecendo entre nós, Selene. O que você quer de mim?
Selene se levantou, aproximando-se dele com uma graça que parecia desafiadora. Ela não era como as mulheres que ele conhecia, nem como aquelas que ele jurava proteger. Ela estava além de tudo isso. Ela era o fogo, a tempestade, e ele não sabia se poderia suportar o calor.
— O que você quer, Gabriel? — Ela o interrompeu, seus olhos penetrantes. — Você quer respostas para um desejo que te consome, não é? Não há como fugir disso. Não há como negar o que você sente por mim.
Ele sentiu o coração acelerar. As palavras dela eram venenosas e ao mesmo tempo irresistíveis. A tentação que ela oferecia era uma armadilha, mas ele não sabia se tinha forças para escapar.
— Eu não posso… Eu sou um homem de Deus. — A palavra “Deus” saiu como um sussurro, quase como se ele quisesse se convencer, mas o peso do desejo o impedia de acreditar nas próprias palavras.
Ela sorriu, como se soubesse exatamente o que ele estava pensando.
— Você não está aqui por Deus, Gabriel. Está aqui por você. Porque, no fundo, sabe que há mais em mim do que o que você foi ensinado a temer. — Ela deu um passo mais perto dele, e ele sentiu o calor de seu corpo como se fosse uma chama prestes a consumir tudo. — E você está com medo, não está? Medo de se entregar ao que seu coração deseja. Medo de que, se se permitir sentir, você perderá o controle de tudo.
Ele não conseguiu responder. Ela estava certa. A cada palavra que ela dizia, mais ele se via perdido, mais ele se via atraído por ela, como um homem que caminha em direção ao abismo sem poder parar.
— Eu não sou uma herege, Gabriel. Sou apenas uma mulher, com os mesmos desejos que você. — Ela tocou suavemente o braço dele, e ele fechou os olhos, tentando resistir. — Mas você é quem está me julgando, quem está me rejeitando, não porque eu seja uma ameaça, mas porque você tem medo do que sente.
Gabriel sentiu o peso das palavras dela como um fardo que ele não sabia mais carregar. Cada segundo ali parecia uma eternidade, e a única coisa que ele conseguia pensar era em como afastá-la, mas ao mesmo tempo, como queria que ela ficasse. Como queria ceder.
— Eu não posso… — Ele sussurrou, a voz trêmula.
Selene se afastou, dando-lhe um último olhar, e então falou, a voz carregada de algo quase triste, mas também cheia de entendimento.
— Eu sei o que você vai fazer, Gabriel. Você vai fugir de mim, como sempre fez. Mas lembre-se, padre, o que você rejeita, pode acabar destruindo o que resta de sua fé.
Ela se virou, desaparecendo na escuridão, deixando Gabriel sozinho, com seus pensamentos e o peso de suas palavras reverberando dentro dele.
Ele estava em um caminho sem volta.
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Atualizado até capítulo 40
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