Contos - O que Nunca Será!

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Meu Coração Sempre Esteve Onde Você Está

**Capítulo 1: O Encontro Sob a Chuva**

O céu sobre Kyoto estava pintado de cinza quando a chuva começou a cair suavemente, desenhando padrões efêmeros nas pedras do caminho. As lanternas de papel, que horas antes iluminavam as ruas com sua luz acolhedora, agora tremeluziam sob a névoa úmida. O aroma de chá recém-preparado escapava das pequenas casas de madeira, misturando-se ao perfume das flores de ameixeira que resistiam estoicamente ao peso das gotas d’água.

Yukio Aizawa apressou o passo, protegendo a cabeça com o livro que segurava. Não queria que as páginas se molhassem. Era um exemplar raro, uma coletânea de poemas antigos que encontrara em uma livraria escondida entre vielas. Para ele, aquele livro era um tesouro — palavras que atravessaram o tempo, intactas, carregadas de sentimentos há muito esquecidos.

Mas, ao virar a esquina, esbarrou em alguém.

O impacto foi suave, mas suficiente para que os livros que carregava escorregassem de seus braços e se espalhassem pelo chão. Papéis voaram como folhas de outono ao vento, rodopiando antes de pousar sobre as pedras molhadas.

— Me desculpe! — Yukio exclamou, abaixando-se apressadamente para recolhê-los.

A jovem diante dele também se abaixou, seus dedos tocando os dele por um breve momento quando ambos tentaram pegar o mesmo livro. A pele dela era fria, mas não desagradável — era como o toque suave da chuva contra a pele.

Ela ergueu os olhos, e por um instante, tudo ao redor pareceu desaparecer.

Havia algo hipnotizante naquele olhar — um brilho inquietante, um segredo escondido em sua íris cor de mel. Seu rosto era delicado, mas seus traços traziam uma força sutil, como se carregassem histórias que ninguém jamais ouvira.

— Está tudo bem — disse ela, com um sorriso sereno.

Pegou um dos livros caídos e passou a ponta dos dedos sobre a capa gasta, como se pudesse sentir sua história através do toque.

— Você gosta de poesia?

Yukio hesitou. Não porque fosse mentira, mas porque nunca admitira isso para ninguém.

— Sim… às vezes.

Ela abriu o livro com delicadeza, folheando as páginas amareladas até encontrar um trecho sublinhado.

— "O coração nunca está onde o corpo repousa" — recitou, sua voz soando quase como um sussurro.

Yukio ficou em silêncio. Aquela frase, lida em voz alta, parecia diferente. Como se carregasse um peso maior quando dita por ela.

— Isso é belo, não acha? — Hana perguntou, fechando o livro devagar.

Ele a observou por um momento, sentindo algo que não sabia nomear.

Era como se já a conhecesse de algum lugar. Como se seu coração, de alguma forma, já estivesse ligado ao dela antes mesmo daquele encontro.

A chuva apertou. Pequenos riachos começaram a se formar entre as pedras do caminho, mas nenhum dos dois parecia se importar.

— Posso te acompanhar até algum lugar? — Yukio perguntou, sentindo um impulso estranho de prolongar aquele momento.

Ela sorriu, inclinando levemente a cabeça.

— E se eu disser que não estou indo a lugar algum?

Ele piscou, confuso.

— Então… está apenas vagando?

— Pode-se dizer que sim — respondeu Hana, fitando o céu nublado por um instante. — Mas, talvez, eu estivesse esperando algo sem saber.

Yukio não soube o que responder. Seu coração pulsava rápido, como se aquela conversa fosse mais significativa do que deveria ser.

— Aceita um chá quente? — ele perguntou, tentando ignorar a estranha sensação de déjà vu que o envolvia.

Hana observou-o por alguns segundos, depois assentiu com um sorriso enigmático.

E então, sem perceber, ele deu o primeiro passo em uma história que mudaria sua vida para sempre.

O aroma do chá de jasmim pairava no ar quando Yukio e Hana entraram em uma pequena casa de chá no coração de Kyoto. O ambiente era acolhedor, iluminado por lanternas de papel que projetavam sombras suaves nas paredes de madeira. O cheiro de tatame recém-limpo se misturava ao perfume das flores secas dispostas sobre o balcão, criando uma sensação de nostalgia difícil de explicar.

Yukio puxou uma cadeira para Hana antes de se sentar à sua frente. O som da chuva tamborilando no telhado criava um ritmo suave, quase hipnótico, preenchendo os momentos de silêncio entre eles.

— Então… — ele começou, mexendo distraidamente a colher no chá fumegante à sua frente — você gosta de poesia?

Hana deu um pequeno sorriso, levando a xícara aos lábios com delicadeza.

— Gosto. Mas gosto mais ainda das histórias por trás dos poemas.

— Como assim?

— Acho fascinante pensar no que levou alguém a escrever certas palavras. A poesia é uma confissão disfarçada. Você já reparou nisso?

Yukio franziu a testa, refletindo sobre aquilo. Nunca havia pensado na poesia daquela forma, mas fazia sentido. Cada verso era uma peça do coração de alguém, deixada para trás na esperança de que alguém a encontrasse.

— Nunca pensei nisso assim.

Hana pousou a xícara na mesa, inclinando-se levemente para frente. Seus olhos pareciam sondá-lo, como se procurassem algo escondido em sua alma.

— Você escreve, não escreve?

Yukio desviou o olhar.

— Por que acha isso?

— Você tem o olhar de quem carrega palavras dentro de si, mas não as deixa sair.

O comentário o pegou desprevenido. Como ela poderia ver algo assim? Nem mesmo seus amigos mais próximos sabiam que ele costumava rabiscar versos em seu caderno antes de dormir, ou que algumas noites passava em claro, preso em pensamentos que só conseguia expressar através das palavras.

— Acho que todos escrevem um pouco, de alguma forma — ele disse, tentando minimizar.

Hana não pareceu convencida, mas não insistiu.

Por um momento, o silêncio se instalou entre eles, mas não era desconfortável. Era o tipo de silêncio que existia entre pessoas que não precisavam preencher cada espaço com palavras vazias.

— E você? — Yukio perguntou, tentando mudar o foco. — Escreve?

Hana sorriu de canto.

— Escrevo. Mas não para que leiam.

— Então por quê?

Ela desviou os olhos para a janela, observando as gotas de chuva escorrendo pelo vidro.

— Algumas palavras não foram feitas para serem compartilhadas — disse, sua voz baixa, quase um sussurro.

Yukio sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Havia algo em Hana que o intrigava profundamente, algo que o fazia querer conhecer cada pensamento escondido por trás de seu olhar misterioso.

— Você acredita no destino? — ela perguntou de repente, virando-se para encará-lo.

A pergunta o pegou de surpresa.

— Nunca pensei muito sobre isso.

— Eu penso.

— E o que acha?

Ela hesitou por um momento antes de responder.

— Acho que algumas pessoas estão destinadas a se encontrar, não importa o caminho que tomem.

Havia algo na maneira como ela disse aquilo que fez o coração de Yukio acelerar. Como se aquelas palavras carregassem um significado muito maior do que ele poderia compreender naquele momento.

A chuva lá fora diminuiu, tornando-se apenas uma garoa fina. O tempo parecia ter desacelerado dentro daquela casa de chá, como se eles estivessem em um universo paralelo, onde apenas aquele instante importava.

— Quer andar um pouco? — Hana perguntou, seus olhos brilhando com um convite silencioso.

Yukio não soube dizer por que, mas sabia que não queria se despedir ainda.

— Quero.

E assim, ele seguiu Hana para a noite úmida de Kyoto, sem imaginar que aquele seria apenas o primeiro de muitos encontros que mudariam sua vida para sempre.

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