3 - A Carta Escondida
A noite estava silenciosa, interrompida apenas pelo estalar da lenha na lareira e pelo som do vento sussurrando do lado de fora. Sentada à escrivaninha de seu quarto, Seraphina segurava um envelope entre as mãos trêmulas, seu coração pulsando forte dentro do peito. O selo de cera ainda intacto exibia o brasão delicado da falecida duquesa de Raventhorn, um lembrete cruel da mulher que, em vida, ocupara o lugar que Seraphina sempre desejou, mas nunca ousou reivindicar.
Ela deveria abrir aquela carta? Deveria permitir que as últimas palavras de Eleanor Montgomery, a duquesa perfeita, preenchessem o silêncio que ecoava dentro dela? Seu instinto gritava para que se livrasse do envelope, temendo as palavras que poderiam estar escritas ali. Mas a curiosidade era mais forte do que o medo.
Respirando fundo, Seraphina rompeu o selo com delicadeza, sentindo um arrepio percorrer sua espinha ao deslizar a folha de papel para fora do envelope. A caligrafia era graciosa e firme, mas havia uma leve urgência nos traços, como se a duquesa tivesse escrito aquelas palavras apressadamente, sabendo que o tempo estava contra ela.
*"Minha querida Seraphina,
Se você está lendo esta carta, então o destino seguiu seu curso, e minha jornada neste mundo chegou ao fim. Mas antes de partir, há algo que preciso lhe dizer, algo que guardei em silêncio por muito tempo.
Sempre soube da verdade. Sempre enxerguei aquilo que você tentou esconder de todos, talvez até de si mesma. Seu olhar nunca mentiu para mim. Vi o amor que você carregava em silêncio, o afeto proibido que brilhava em seus olhos sempre que meu marido entrava no salão. Mas jamais te odiei por isso. Nunca te condenei, pois sei que o coração não segue regras, e os sentimentos não podem ser apagados apenas porque a sociedade os considera errados.
Talvez, agora, a vida esteja lhe oferecendo uma nova chance, uma oportunidade de conquistar o que sempre esteve fora do seu alcance. Sei que você tem medo. Sei que seu coração está envolto em dúvidas e incertezas, mas preciso lhe pedir uma coisa: não fuja do destino que está se desenhando diante de você. Nem tudo está perdido, Seraphina. Às vezes, aquilo que sempre desejamos pode, enfim, nos pertencer."*
Seraphina sentiu um nó se formar em sua garganta, sua visão se tornando turva com as lágrimas que se acumulavam. Suas mãos apertavam o papel com força, como se temesse que a mensagem desaparecesse diante de seus olhos.
A duquesa sabia. Sempre soube.
Eleanor, a mulher que todos exaltavam como perfeita, aquela cuja sombra parecia impossível de ser superada, havia enxergado os sentimentos que Seraphina tentou enterrar tão fundo dentro de si. E, mais do que isso, não a desprezou por isso.
Mas como? Como ela poderia ter percebido algo que nem mesmo Seraphina ousava admitir? Como poderia ter escrito aquelas palavras na noite em que faleceu, como se já soubesse que sua partida abriria caminho para algo maior?
O peso daquela revelação era quase esmagador. O duque ainda a amava. Ainda se prendia à memória da esposa perdida. Mas Eleanor, antes de morrer, havia deixado aquela carta como um último sopro de esperança, uma promessa silenciosa de que a história ainda não havia chegado ao fim.
Seraphina fechou os olhos, sentindo o coração martelar em seu peito.
E se a duquesa estivesse certa?
E se o destino estivesse prestes a mudar?
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