15 Anos Depois
O amanhecer no pequeno sítio trazia consigo uma rotina humilde, mas cheia de significados para Josefina. Ela acordava antes do sol nascer, ouvindo o canto distante dos galos e sentindo o frio suave da manhã enquanto preparava o café. A fumaça que saía do bule enchia a cozinha de um aroma reconfortante, mesmo que a vida fosse simples e, muitas vezes, marcada pela saudade.
A velha varanda de madeira era o refúgio favorito de Josefina. Ali, com suas mãos calejadas segurando uma xícara de café, ela contemplava o horizonte tranquilo e pensava na vida que teve que reconstruir após a perda devastadora de sua filha, Vitória, e do genro, Victor. Quinze anos haviam se passado, mas a lembrança daquela noite fatídica nunca desaparecera.
No campo, Elena corria descalça pela grama molhada de orvalho. Seus risos ecoavam pelos arredores, e seus cabelos castanhos dançavam ao vento. Ela era a perfeita combinação dos pais: a determinação de Victor e a doçura de Vitória. Seus olhos, grandes e expressivos, carregavam a mesma profundidade dos de sua mãe, como se guardassem um mundo de histórias ainda não contadas.
— Não vá muito longe, Elena! — gritou Josefina, franzindo o cenho enquanto observava a neta desaparecer entre as árvores. — Lembre-se, você não pode ir sozinha até o rio!
— Eu sei, vovó! Não se preocupe! Te amo! — respondeu Elena, virando-se para lançar um sorriso antes de desaparecer na direção do bosque.
Josefina suspirou, deixando-se cair suavemente na cadeira da varanda. Elena era sua alegria, a única razão para seguir em frente após tudo o que havia perdido. Ainda assim, havia momentos em que o vazio deixado por Vitória e Victor parecia sufocá-la.
Aquela manhã em especial trazia lembranças vívidas. Era impossível esquecer a última conversa que teve com a filha. Vitória estava radiante por finalmente realizar o sonho de visitar o litoral, algo que sempre fora um desejo profundo dela. Porém, Josefina estava inquieta. Vitória estava grávida de nove meses e, para Josefina, uma viagem naquela situação parecia um risco desnecessário.
— Filha, por que não espera a Elena nascer? Vocês podem viajar depois, com mais calma e segurança. Essa estrada é traiçoeira, ainda mais com o tempo assim — dissera Josefina ao telefone, tentando convencer Vitória.
— Mãe, você sabe o quanto isso é importante para mim. A Elena vai nascer, e eu quero que ela saiba que a mãe dela viveu de verdade, que lutou para realizar cada sonho. Só falta esse, mãe. Quero sentir o mar, tocar a areia, respirar o ar salgado.
Josefina fechou os olhos, recordando-se da voz empolgada de Vitória. Sua filha sempre fora determinada, mas naquele dia havia algo diferente. Uma urgência, uma necessidade de viver algo maior antes de sua vida mudar para sempre.
— Filha, só me prometa que vocês vão tomar cuidado. Essa estrada não é segura, e o tempo está péssimo.
— Eu prometo, mãe. Vamos com calma. Te amo, até amanhã.
— Te amo também, minha filha. Que Deus proteja vocês.
Essas foram as últimas palavras que Josefina trocou com Vitória. Na madrugada seguinte, o telefone tocou, quebrando o silêncio da noite. Do outro lado da linha, uma voz fria e profissional comunicou que havia ocorrido um acidente.
A memória daquela ligação era como um punhal no coração de Josefina. A notícia de que o carro de Vitória e Victor havia derrapado em uma curva traiçoeira, caindo em um barranco, ecoava em sua mente como um pesadelo eterno.
Elena, milagrosamente, sobrevivera. O socorro chegou a tempo de salvá-la, mas para Josefina, aquilo não apagava a dor de perder sua filha e o genro. Desde então, ela dedicara sua vida à neta, criando-a com amor e protegendo-a de todas as formas possíveis.
Agora, olhando para o céu azul e ouvindo o riso de Elena à distância, Josefina sentia uma mistura de gratidão e tristeza. Apesar de tudo, Elena era a prova de que algo de bom havia resistido à tragédia. E mesmo que a dor nunca desaparecesse, a menina era sua força para continuar vivendo, um raio de luz que iluminava os dias mais escuros.
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Atualizado até capítulo 37
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