Leonardo Narrando
Hoje acordei com a Marisa já fazendo um milhão de planos. Ela quer ir para as Maldivas, mas eu não quero. Na verdade, eu quero ir para o Brasil. Faz doze anos que não vejo minha tia, e essa noite sonhei com meu pai. No sonho, ele me chamava. Ultimamente, a saudade tem me apertado o peito de um jeito que nunca senti antes.
— Amor, vai ser maravilhoso! — disse Marisa, saindo do banheiro, massageando o rosto como faz todas as manhãs. — Será como uma segunda lua de mel!
Respirei fundo, tentando reunir coragem para o que precisava dizer. Já havíamos discutido isso antes, mas eu não havia sido claro o suficiente.
— Eu não vou para as Maldivas, Marisa — falei, me levantando da cama. — Já falei que vou para o Brasil. Preciso ver meu pai.
Ela parou no meio do quarto e me olhou como se eu tivesse dito a coisa mais absurda do mundo.
— Pelo amor de Deus, Leonardo! — ela exclamou, irritada. — Quantos anos fazem que estamos casados? Você nunca deu a mínima para o seu pai, para a sua família! Você mal fala deles! Agora, quando finalmente planejamos uma viagem romântica nas férias, você vem com isso? Eu não vou para o Brasil!
Ela cruzou os braços, claramente indignada. Eu sabia que essa conversa não seria fácil, mas a decisão já estava tomada. Senti meu rosto esquentar, mas mantive a calma.
— Não estou te chamando para ir comigo, Marisa — respondi, firme. — Só estou comunicando que vou. Você pode ir para as Maldivas, para o Havaí, Xangai, ou para onde quiser. Mas eu vou para o Mato Grosso. Vou para a fazenda do meu pai. Vou para o Brasil.
O silêncio que se seguiu foi carregado de tensão. Marisa estreitou os olhos, tentando entender de onde vinha essa minha súbita determinação. Para ela, eu sou o marido previsível, que sempre coloca seus planos como prioridade. Mas algo dentro de mim mudou. Não era uma decisão impulsiva; era uma necessidade.
— Isso é ridículo! — ela finalmente disse, a voz mais alta do que o normal. — Doze anos, Leonardo! Doze anos que você não vê seu pai, e agora, do nada, resolve que tem que ir? Por quê? O que mudou?
— Eu não sei te explicar direito — confessei, tentando encontrar as palavras certas. — Mas ultimamente, inclusive essa noite... eu sonhei com ele. Ele me chamava, Marisa. Era como se estivesse pedindo para eu ir. E a saudade... Ela tem me sufocado. Eu preciso ir. Eu preciso resolver isso dentro de mim.
— Resolver o quê? — ela perguntou, descrente. — Você nunca falou sobre o que aconteceu entre vocês. Por que nunca me contou?
— Porque, nunca aconteceu nada, eu que sou ingrato dessa história, eu quero resolver isso. Eu não sei o que é, Mas, o meu pai precisa de mim. Eu sinto isso.
Marisa suspirou, exasperada. Ela começou a andar de um lado para o outro, como sempre faz quando está nervosa. Eu sabia que ela não gosta de ter seus planos contrariados, mas essa era uma batalha que eu não vou ceder.
Fui para o banheiro, deixando ela sozinha no quarto. Enquanto escovava os dentes, olhei meu reflexo no espelho e me perguntei o que me aguardava no Brasil. Faz tanto tempo. Meu pai, minha tia, a Aninha, a fazenda... Pareciam memórias de outra vida.
Ao sair, Marisa ainda estava no quarto, sentada na cama com o celular na mão. Ela não olhou para mim, mas percebi que seus olhos estavam úmidos. Parte de mim queria consolá-la, dizer que, depois, poderíamos fazer nossa viagem. Mas outra parte sabia que isso não bastaria. Marisa sempre precisou estar no controle. E, desta vez, não seria assim.
— Quando você vai? — ela perguntou, sem me encarar.
— Em duas Semanas, quero chegar lá no dia do aniversário do meu pai — respondi.
Ela assentiu, e o silêncio caiu entre nós novamente. No fundo, eu sabia que minha decisão criaria uma rachadura em nosso relacionamento. Mas, pela primeira vez em anos, eu estou disposto a enfrentar as consequências.
Depois daquela tensão toda, me arrumei rapidamente, tomei meu café e fui trabalhar. O dia começou cedo, dirigindo minha caminhonete pelas estradas do Canadá até a fazenda. A paisagem gelada, mesmo no início da primavera, é um contraste bonito com a tensão que sentia.
Na fazenda, o gerente Greg me atualizou sobre algumas coisas: o preparo do solo para o plantio de canola e os baixos níveis de fósforo em algumas áreas. Passei a manhã no campo, coletando amostras e avaliando o solo. Após uma reunião com a equipe para discutir a rotação de culturas e práticas sustentáveis, almocei rapidamente, e voltei, muita coisa para fazer.
À tarde, continuei o trabalho avaliando o sistema de irrigação e as drenagens, essenciais para evitar problemas com o degelo. No final do dia, deixei recomendações para a equipe. Com o trabalho concluído, dirigi de volta para casa, Marisa ainda não tinha chegado, sempre que brigamos é assim, ela se distancia um pouco.
Ultimamente, não tenho me sentido bem. Às vezes, parece que Marisa me esconde algo. Não sei explicar. O desejo que eu sentia por ela está sumindo. Só fazemos amor quando ela me procura, porque, sinceramente, não sinto mais vontade de procurá-la. É estranho, porque Marisa é linda, sempre se cuida, mas aquela atração que eu tinha simplesmente desapareceu. Nunca falei isso para ela. Não quero magoá-la.
Fiz o jantar sozinho, algo simples, porque não sabia que horas ela voltaria. Tomei banho, comi, lavei a louça e olhei para o relógio. Quase dez da noite. Até aquele momento, nem sinal de Marisa.
Peguei o celular e liguei para ela, mas o aparelho estava desligado. Estranhei, porque isso nunca acontece. Marisa é sempre organizada, e raramente deixa o telefone inacessível. Resolvi ligar para a casa dos pais dela, imaginando que pudesse estar por lá. A resposta foi outra surpresa. Marisa não passou lá hoje.
O desconforto no peito aumentou. Onde ela estaria? Tentei afastar os pensamentos ruins, mas era difícil ignorar. Sentei no sofá, decidido a esperar. Liguei a TV, mas não consegui me concentrar em nada. O silêncio da casa parecia ainda mais pesado. Acabei adormecendo no sofá, mas quando acordei, a madrugada já havia chegado, e Marisa ainda não estava em casa.
Algo estava errado, e, pela primeira vez, senti que nossa relação talvez estivesse mais abalada do que eu queria admitir.
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Atualizado até capítulo 45
Comments
Daisy Conceicao
um filho ingrato, onde não se lembra do pai,parou de ligar e de ter contato. cuida da fazenda dos outros tendo a do pai pra cuidar. era bom que quando ele fosse lá o pai já tivesse falecido pra a consciência dele doer mais ainda
2025-03-20
6
luciane souza
Sei não mas essa atitude dela tem algo, e lá vem paulada dessa labiscobra 🤨🤨🤨
2025-01-22
1
Maria Oliveira Poranga
espero que Marisa não apronte nenhuma armadilha ,para atrapalhar viagem 😕
2025-01-22
1