Capítulo 05

Leonardo Narrando

Hoje acordei com a Marisa já fazendo um milhão de planos. Ela quer ir para as Maldivas, mas eu não quero. Na verdade, eu quero ir para o Brasil. Faz doze anos que não vejo minha tia, e essa noite sonhei com meu pai. No sonho, ele me chamava. Ultimamente, a saudade tem me apertado o peito de um jeito que nunca senti antes.

— Amor, vai ser maravilhoso! — disse Marisa, saindo do banheiro, massageando o rosto como faz todas as manhãs. — Será como uma segunda lua de mel!

Respirei fundo, tentando reunir coragem para o que precisava dizer. Já havíamos discutido isso antes, mas eu não havia sido claro o suficiente.

— Eu não vou para as Maldivas, Marisa — falei, me levantando da cama. — Já falei que vou para o Brasil. Preciso ver meu pai.

Ela parou no meio do quarto e me olhou como se eu tivesse dito a coisa mais absurda do mundo.

— Pelo amor de Deus, Leonardo! — ela exclamou, irritada. — Quantos anos fazem que estamos casados? Você nunca deu a mínima para o seu pai, para a sua família! Você mal fala deles! Agora, quando finalmente planejamos uma viagem romântica nas férias, você vem com isso? Eu não vou para o Brasil!

Ela cruzou os braços, claramente indignada. Eu sabia que essa conversa não seria fácil, mas a decisão já estava tomada. Senti meu rosto esquentar, mas mantive a calma.

— Não estou te chamando para ir comigo, Marisa — respondi, firme. — Só estou comunicando que vou. Você pode ir para as Maldivas, para o Havaí, Xangai, ou para onde quiser. Mas eu vou para o Mato Grosso. Vou para a fazenda do meu pai. Vou para o Brasil.

O silêncio que se seguiu foi carregado de tensão. Marisa estreitou os olhos, tentando entender de onde vinha essa minha súbita determinação. Para ela, eu sou o marido previsível, que sempre coloca seus planos como prioridade. Mas algo dentro de mim mudou. Não era uma decisão impulsiva; era uma necessidade.

— Isso é ridículo! — ela finalmente disse, a voz mais alta do que o normal. — Doze anos, Leonardo! Doze anos que você não vê seu pai, e agora, do nada, resolve que tem que ir? Por quê? O que mudou?

— Eu não sei te explicar direito — confessei, tentando encontrar as palavras certas. — Mas ultimamente, inclusive essa noite... eu sonhei com ele. Ele me chamava, Marisa. Era como se estivesse pedindo para eu ir. E a saudade... Ela tem me sufocado. Eu preciso ir. Eu preciso resolver isso dentro de mim.

— Resolver o quê? — ela perguntou, descrente. — Você nunca falou sobre o que aconteceu entre vocês. Por que nunca me contou?

— Porque, nunca aconteceu nada, eu que sou ingrato dessa história, eu quero resolver isso. Eu não sei o que é, Mas, o meu pai precisa de mim. Eu sinto isso.

Marisa suspirou, exasperada. Ela começou a andar de um lado para o outro, como sempre faz quando está nervosa. Eu sabia que ela não gosta de ter seus planos contrariados, mas essa era uma batalha que eu não vou ceder.

Fui para o banheiro, deixando ela sozinha no quarto. Enquanto escovava os dentes, olhei meu reflexo no espelho e me perguntei o que me aguardava no Brasil. Faz tanto tempo. Meu pai, minha tia, a Aninha, a fazenda... Pareciam memórias de outra vida.

Ao sair, Marisa ainda estava no quarto, sentada na cama com o celular na mão. Ela não olhou para mim, mas percebi que seus olhos estavam úmidos. Parte de mim queria consolá-la, dizer que, depois, poderíamos fazer nossa viagem. Mas outra parte sabia que isso não bastaria. Marisa sempre precisou estar no controle. E, desta vez, não seria assim.

— Quando você vai? — ela perguntou, sem me encarar.

— Em duas Semanas, quero chegar lá no dia do aniversário do meu pai — respondi.

Ela assentiu, e o silêncio caiu entre nós novamente. No fundo, eu sabia que minha decisão criaria uma rachadura em nosso relacionamento. Mas, pela primeira vez em anos, eu estou disposto a enfrentar as consequências.

Depois daquela tensão toda, me arrumei rapidamente, tomei meu café e fui trabalhar. O dia começou cedo, dirigindo minha caminhonete pelas estradas do Canadá até a fazenda. A paisagem gelada, mesmo no início da primavera, é um contraste bonito com a tensão que sentia.

Na fazenda, o gerente Greg me atualizou sobre algumas coisas: o preparo do solo para o plantio de canola e os baixos níveis de fósforo em algumas áreas. Passei a manhã no campo, coletando amostras e avaliando o solo. Após uma reunião com a equipe para discutir a rotação de culturas e práticas sustentáveis, almocei rapidamente, e voltei, muita coisa para fazer.

À tarde, continuei o trabalho avaliando o sistema de irrigação e as drenagens, essenciais para evitar problemas com o degelo. No final do dia, deixei recomendações para a equipe. Com o trabalho concluído, dirigi de volta para casa, Marisa ainda não tinha chegado, sempre que brigamos é assim, ela se distancia um pouco.

Ultimamente, não tenho me sentido bem. Às vezes, parece que Marisa me esconde algo. Não sei explicar. O desejo que eu sentia por ela está sumindo. Só fazemos amor quando ela me procura, porque, sinceramente, não sinto mais vontade de procurá-la. É estranho, porque Marisa é linda, sempre se cuida, mas aquela atração que eu tinha simplesmente desapareceu. Nunca falei isso para ela. Não quero magoá-la.

Fiz o jantar sozinho, algo simples, porque não sabia que horas ela voltaria. Tomei banho, comi, lavei a louça e olhei para o relógio. Quase dez da noite. Até aquele momento, nem sinal de Marisa.

Peguei o celular e liguei para ela, mas o aparelho estava desligado. Estranhei, porque isso nunca acontece. Marisa é sempre organizada, e raramente deixa o telefone inacessível. Resolvi ligar para a casa dos pais dela, imaginando que pudesse estar por lá. A resposta foi outra surpresa. Marisa não passou lá hoje.

O desconforto no peito aumentou. Onde ela estaria? Tentei afastar os pensamentos ruins, mas era difícil ignorar. Sentei no sofá, decidido a esperar. Liguei a TV, mas não consegui me concentrar em nada. O silêncio da casa parecia ainda mais pesado. Acabei adormecendo no sofá, mas quando acordei, a madrugada já havia chegado, e Marisa ainda não estava em casa.

Algo estava errado, e, pela primeira vez, senti que nossa relação talvez estivesse mais abalada do que eu queria admitir.

Mais populares

Comments

Daisy Conceicao

Daisy Conceicao

um filho ingrato, onde não se lembra do pai,parou de ligar e de ter contato. cuida da fazenda dos outros tendo a do pai pra cuidar. era bom que quando ele fosse lá o pai já tivesse falecido pra a consciência dele doer mais ainda

2025-03-20

6

luciane souza

luciane souza

Sei não mas essa atitude dela tem algo, e lá vem paulada dessa labiscobra 🤨🤨🤨

2025-01-22

1

Maria Oliveira Poranga

Maria Oliveira Poranga

espero que Marisa não apronte nenhuma armadilha ,para atrapalhar viagem 😕

2025-01-22

1

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!