Ana Narrando
Acordei com meu pai me chamando. Abri os olhos, esfregando-os com sono, tentando me despertar.
— O que foi, pai? — perguntei, sentando na cama, ainda confusa.
— Filha, vamos pro curral. Tem uma vaca tá dando trabalho pra parir, e o seu Leonel passou a noite toda lá, mas não tá conseguindo resolver.
Na mesma hora, pulei da cama. Eu cuido dos bichos da fazenda, mas o seu Leonel não larga as vacas de jeito nenhum. Aqui, a gente tem uma boa variação de espécies, mas as vacas e os touros são os xodós dele.
Vesti uma calça jeans e minha velha galocha, que já conhecia cada canto do curral. Peguei uma camiseta de algodão; estava frio, mas sabia que logo estaria suando. Além disso, mangas compridas não combinam com uma missão dessas.
Saí com meu pai de moto, porque era mais rápido. O motor roncava mais alto do que uma toada. Assim que ele desligou a moto perto do curral, ouvi o mugido desesperado da vaca. Corri imediatamente para dentro, já me posicionando para avaliar a situação.
O cenário era caótico. A vaca, uma fêmea robusta da raça Girolando, estava deitada de lado, com respiração pesada e olhos arregalados. Seu Leonel, que parecia ter envelhecido dez anos naquela noite, estava ajoelhado ao lado dela, suado e cansado.
— Seu Leonel, me atualiza. Como ela tá? — perguntei, já me aproximando e puxando minhas luvas de dentro do bolso.
— Ana, tá complicado. O bezerro tá atravessado. Tentei ajeitar, mas ela tá sofrendo muito. Se continuar assim, vamos perder os dois.
Respirei fundo. O desespero nos olhos dele aumentava minha responsabilidade, mas não era hora para hesitação. Me aproximei da vaca, me abaixando ao seu lado.
— Calma, menina. Vai dar tudo certo. — Falei em voz baixa, tentando acalmar a vaca enquanto fazia uma avaliação inicial.
Primeiro, observei as contrações. Elas estavam espaçadas, sinal de que ela estava exausta. Com cuidado, inseri a mão enluvada no canal de parto. Era difícil ver com precisão só olhando, então o toque era essencial.
— Está realmente mal posicionado — comentei, sentindo a cabeça do bezerro virada para o lado. — Pai, traz aquele balde com água morna. Seu Leonel, preciso que o senhor fique perto da cabeça dela e continue falando com ela. Isso vai ajudar a mantê-la calma.
Enquanto esperava o balde, aproveitei para buscar a corda obstétrica que sempre deixo no curral para emergências como essa.
— Seu Leonel, ela tentou levantar em algum momento?
— Tentou, Ana, mas tá muito fraca.
Meu pai voltou com o balde, e eu lavei rapidamente minhas mãos e luvas antes de prosseguir. Toquei novamente, agora com mais firmeza, e consegui identificar as patas dianteiras do bezerro. Precisava reposicionar a cabeça dele com cuidado para alinhar o corpo ao canal de parto.
— Vai ser trabalhoso, mas é possível. Preciso da corda aqui. Pai, segura firme. Vou começar a ajustar.
Com paciência e força, introduzi a corda ao redor das patas do bezerro. Fiz movimentos lentos, sempre verificando se não estava machucando a vaca. Senti a tensão no ar, mas continuei falando com ela.
— Tá indo bem, garota. Você é forte. Só mais um pouco.
Consegui alinhar a cabeça do bezerro, mas ele ainda não estava completamente na posição certa. As contrações da vaca começaram a voltar, o que era um bom sinal. Aproveitei para coordenar o movimento.
— Seu Leonel, quando ela tiver a próxima contração, vou precisar que o senhor me ajude a puxar devagar. Pai, segura as patas traseiras dela pra evitar que ela se mova demais.
Fizemos isso em equipe. Na próxima contração, puxei com cuidado, sempre monitorando a pressão. Finalmente, a cabeça do bezerro começou a aparecer.
— Tá vindo, tá vindo! — exclamei, sentindo o alívio começar a surgir.
Mais uma contração e, com mais um puxão controlado, o bezerro deslizou para fora. Era um macho grande, com pelo úmido e brilhante. Coloquei-o rapidamente sobre a palha e comecei a esfregá-lo com um pano limpo para estimular a respiração.
— Vamos, garoto, respira pra gente. — Murmurei enquanto continuava esfregando.
Ele deu o primeiro gemido fraco, seguido de uma respiração mais forte. Sorri, exausta, mas aliviada.
— Conseguimos!
Seu Leonel soltou um suspiro tão profundo que parecia ter tirado um peso de toneladas de suas costas.
— Ana, eu sabia que só você podia dar jeito. Obrigado, minha filha. Não sei o que seria de mim, se não fosse você aqui do meu lado.
— Eu que digo isso, eu não sei o que seria de mim, se não fosse as oportunidades que o senhor me deu nessa vida. Agora vai descansar, que já está tudo bem — falei sorrindo, mas era um sorriso de alívio.
A vaca, mesmo exausta, começou a mugir baixo. Empurrei o bezerro para perto dela para que pudesse lamber o filhote e reforçar o vínculo entre os dois. Era uma cena que sempre me emociona, não importa quantas vezes eu veja.
— Pai, vamos dar um tempo pra ela. Amanhã bem cedo eu verifico, como eles estão.
Saí do curral com os braços doloridos e a roupa suja, mas com o coração leve. Esse é o tipo de trabalho que faz valer a pena a profissão que escolhi por amor.
Cheguei em casa exausta. Tirei a roupa suja, tomei um banho rápido e senti a água quente relaxar meus músculos doloridos. Enxuguei-me e vesti meu pijama, buscando o conforto de algo macio e familiar. Me deitei, e o abraço do meu colchão e da minha coberta me envolveu. Não demorou muito para o sono me vencer.
Acordei com o barulho estridente do meu despertador. Daqueles antigos, que parece que tocam dentro da cabeça da gente. Meti a mão nele para desligar e me levantei com um espreguiçar longo, sentindo os músculos despertarem junto comigo. Lavei o rosto na pia do banheiro, deixando a água gelada espantar o resto de sono, e segui minha rotina matinal: hidratante e uma camada generosa de protetor solar. Andar pelo sol escaldante da fazenda sem proteção seria um convite para a pele queimar e descascar.
Como de costume, meus pais já não estavam em casa. Acordam antes do sol. Peguei meu chapéu e fui direto para a casa grande, onde sabia que o café da manhã estaria servido. Precisava também dar uma olhada na vaca e no bezerro para ter certeza de que estavam bem depois da noite de ontem.
Ao chegar perto da cozinha, ouvi vozes. Era o seu Leonel conversando com minha mãe, A voz dele, geralmente firme e animada, estava diferente. Parei na área do fogão a lenha, sem fazer barulho, para ouvir melhor.
— Ana Maria é uma bênção, Rosa — disse ele, com um tom melancólico. — Queria eu que meu filho fosse metade do que essa moça é.
Meu coração apertou ao ouvir aquilo. Seu Leonel era um homem de mãos calejadas e coração grande. Ele não merece o desprezo que recebe do Leonardo.
Entrei na cozinha devagar, tentando esconder o nó que se formava no meu peito. Meu sorriso veio naturalmente quando vi o seu Leonel sentado à mesa com uma xícara de café nas mãos.
— Bom dia! — cumprimentei, tentando deixar o ambiente mais leve.
Ele levantou os olhos para mim e sorriu, mas seus olhos ainda carregavam uma tristeza que ele tentava disfarçar.
— Bom dia, Ana Maria — respondeu ele. — Já foi olhar a mãe e o filho?
— Ainda não, mas é a primeira coisa que vou fazer agora depois do café. Quero ver como estão os dois.
Minha mãe, com o avental sujo de farinha, colocou um prato de bolo na mesa e se dirigiu a mim.
— Sua comida tá no fogão, filha. Come bastante que você mal parou pra comer ontem.
Sorri, grata pelo cuidado dela. Enquanto me servia, olhei para o seu Leonel. Queria dizer algo que pudesse confortá-lo, mas sabia que palavras nem sempre mudam o que está no coração. Ainda assim, prometi a mim mesma que, de alguma forma, faria o dia dele mais leve. Afinal, ele merece.
Autora!
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Atualizado até capítulo 45
Comments
Ivanir Santana
Estou amando a história. Comecei a ler hoje 22/03 às 15:00h não consigo parar de ler. Espero continuar assim até o final
2025-03-23
2
Dalila Lopes
Estou amando o livro espero quê Leonardo não apareça pra estragar tudo.
Depois de tanto tempo longe do pai.
Gostaria quê ele voltasse pra ficar
2025-03-25
0
Solange Araujo
Quero ver a marra dela quando o Leonardo souber que ela abortou o BB, e que talvez nem fosse filho dele .
2025-02-27
0