Um local simples

Darius continuou seu caminho pelas ruas devastadas, com os passos pesados e o coração endurecido pela visão do caos ao seu redor. Seus olhos captavam cada detalhe: as construções em ruínas, os gritos distantes, o fogo que ainda ardia em partes da cidade. Após um tempo caminhando, ele avistou o que parecia ser um abrigo improvisado. Apesar de parcialmente destruído, o lugar ainda estava de pé, com luzes frágeis emanando de dentro, e um fluxo constante de pessoas entrando e saindo.

Ele parou por um momento, avaliando a situação. "Pelo menos há algo aqui que ainda resiste... Mas, pelo visto, não está muito longe de cair também," pensou.

Decidindo verificar, Darius entrou pela porta desgastada. Assim que cruzou o limiar, foi atingido por um turbilhão de emoções vindas do ambiente. Pessoas choravam nos cantos, outras estavam deitadas em macas improvisadas com ferimentos graves. Crianças agarravam suas mães, enquanto vozes agitadas discutiam ou pediam ajuda. O cheiro de suor, sangue e medicamentos enchia o ar, sufocante e pesado.

Ele se encostou a uma das paredes, cruzando os braços, e observou a cena em silêncio. "Facções... Sempre elas," pensou, enquanto apertava os punhos. Sentia empatia pela dor ao redor, mas não o suficiente para intervir. O peso de suas próprias perdas era uma barreira que ele não estava disposto a ultrapassar. Ele se abaixou, sentando-se no chão próximo à entrada, seus olhos analisando o local com atenção, mas mantendo-se distante emocionalmente.

Enquanto observava o caos, algo chamou sua atenção. Em meio às expressões de desespero, lágrimas e angústia, havia uma jovem médica. Ela se movia com agilidade e determinação, passando de um paciente a outro, prestando ajuda de todas as maneiras possíveis. Seu sorriso era um contraste gritante com a cena ao redor. Ela sorria para cada pessoa que ajudava, trocava palavras gentis, e, por algum motivo, parecia inabalável.

Darius franziu o cenho. "Como ela consegue sorrir assim? Como pode parecer tão otimista em meio a tudo isso? Depois de tudo o que aconteceu e vem acontecendo?" Ele não conseguia entender. Era como se ela fosse imune ao peso da tragédia ao seu redor. Ele a observou por mais alguns momentos, intrigado, mas sem se aproximar.

Enquanto ela cuidava de uma criança ferida, sua expressão era genuinamente carinhosa. Seus gestos eram precisos e sua presença parecia trazer um mínimo de alívio para aqueles ao seu redor. Aquele contraste entre o caos e a calma irradiada por ela começou a mexer com ele, mesmo que não quisesse admitir.

Ainda assim, Darius afastou o pensamento, desviando o olhar. "Não importa. O mundo é cruel... Não há espaço para sorrisos." Ele apoiou os braços nos joelhos e inclinou a cabeça para trás, respirando fundo enquanto tentava ignorar o cenário à sua frente e as emoções que começavam a surgir em seu interior.

Darius continuou com os olhos fechados, respirando profundamente enquanto lutava contra o tumulto em sua mente. As memórias voltavam com força: o som ensurdecedor dos tiros, os gritos de dor, o cheiro de sangue e pólvora. Cada cena era vívida, como se estivesse acontecendo novamente. Ele apertou os punhos, sentindo as unhas pressionarem a palma das mãos, tentando ancorar-se ao presente.

— "Droga... Isso nunca vai embora..." — murmurou baixinho, sua voz carregada de cansaço e desespero. Ele sentia o peso do mundo sobre seus ombros, um peso que parecia crescer mais a cada dia.

Ele abriu os olhos lentamente e olhou ao redor. O caos do abrigo era quase um reflexo do caos dentro dele. As pessoas choravam, algumas gritavam, enquanto outras permaneciam em silêncio absoluto, consumidas pela dor. Por um instante, ele se perguntou como ainda estava de pé, como sua mente não havia desmoronado de vez.

Mas então, seus pensamentos foram novamente interrompidos. Uma sombra se moveu perto dele, e ao virar a cabeça, viu a mesma médica. Ela estava agachada ao lado de uma senhora ferida, segurando sua mão enquanto fazia um curativo. O sorriso persistia em seu rosto, mesmo enquanto suas mãos trabalhavam rapidamente para estancar o sangramento. Ela parecia alheia ao caos, ou talvez decidida a enfrentá-lo de frente, sem permitir que ele a consumisse.

Darius observou-a por um momento, intrigado. — "Como alguém pode ser assim? Como pode encontrar força para sorrir nesse inferno?" — pensou. Ele desviou o olhar rapidamente, irritado com o incômodo que aquela visão trazia. Não sabia se era raiva, inveja ou algo mais profundo que não conseguia identificar.

Ele fechou os olhos novamente, mas dessa vez, a imagem da médica sorridente ficou gravada em sua mente. Em vez das memórias de destruição, o que veio foi a cena dela confortando a senhora. Por um breve momento, o caos em sua cabeça deu lugar a um silêncio estranho, como se algo estivesse tentando abrir caminho através da escuridão.

— "Não faz sentido..." — murmurou para si mesmo, abrindo os olhos mais uma vez. Ele se levantou, tentando ignorar a onda de emoções confusas que começava a surgir dentro de si, e decidiu caminhar pelo abrigo. Ele precisava de algo para distraí-lo, algo que o mantivesse longe das memórias e daquela sensação desconfortável que não sabia como lidar.

Darius continuava imóvel, os olhos fechados, tentando ignorar o caos ao seu redor e dentro de si. Mas um toque suave em seu braço o trouxe de volta ao presente. Ele abriu os olhos e olhou para o lado, encontrando uma criança pequena olhando para ele. Era magra, com roupas rasgadas e o rosto sujo. Apesar disso, havia uma expressão de curiosidade e preocupação em seu olhar.

"Tão pequena e inocente, pobre coitada", pensou Darius, enquanto endireitava o corpo e franzia a testa.

— "Hm?" — murmurou, sua voz carregada de seriedade.

A criança deu um passo para trás, sentindo um frio na barriga diante do homem imponente e de expressão rígida. Ainda assim, gaguejou:

— "Vo-você precisa de ajuda?..".

Havia medo em sua voz, mas também algo genuíno. Darius franziu ainda mais o cenho, tentando não parecer tão ameaçador. Ele respirou fundo e respondeu, com um tom calmo:

— "Não. Estou bem."

A criança hesitou, mordendo os lábios antes de perguntar novamente:

— "Certeza?..."

Darius interrompeu antes que ela pudesse terminar.

— "Saia daqui. Estou bem. Se eu precisar, eu chamo alguém."

A criança ficou em silêncio por um momento, olhando para ele com olhos grandes e inocentes, antes de acenar com a cabeça e dar meia-volta, desaparecendo entre as outras pessoas no abrigo.

Enquanto a observava ir embora, Darius se pegou pensando na simplicidade daquele gesto. Por um breve momento, a inocência da criança havia afastado o caos em sua mente. Mas, assim que o silêncio voltou, as lembranças o invadiram novamente. Ele apertou os olhos com força, inclinando a cabeça para trás enquanto murmurava para si mesmo:

— "Oh, droga... Dor... Sempre volta..."

Ele estava psicologicamente acabado. A onda de angústia parecia não ter fim, esmagando-o com a mesma intensidade de sempre. Mesmo cercado por tantas pessoas, ele se sentia completamente sozinho, preso nas sombras de um passado que não o deixava seguir em frente.

Sentado no chão frio do abrigo, o caos em volta parecia se misturar ao caos dentro de sua cabeça. O som das vozes, dos gemidos de dor e do movimento incessante começou a ficar abafado. Sua respiração se tornou curta e irregular, o peito apertando como se algo o sufocasse. Ele sentiu uma pontada de pânico crescer.

Darius se levantou rapidamente, quase tropeçando nas próprias pernas enquanto tentava sair dali. Ignorou os olhares das pessoas ao seu redor, que talvez estivessem confusas ou curiosas com sua saída abrupta. Ele simplesmente não podia mais suportar ficar naquele lugar.

Ao alcançar o lado de fora, ele inspirou profundamente, enchendo os pulmões com o ar fresco da noite. A brisa leve acariciou seu rosto suado, e ele fechou os olhos, buscando algum resquício de paz. Ainda assim, evitou ao máximo olhar ao redor. Não queria encarar a destruição, os escombros, ou mesmo a lembrança de tudo o que havia perdido.

Ele direcionou o olhar para cima, para o céu. A lua brilhava, serena e indiferente, cercada por um manto de estrelas que parecia alheio à devastação na terra. Ele focou sua mente naquilo, deixando-se envolver pela tranquilidade distante do cosmos.

Darius inspirou e expirou lentamente, tentando regular sua respiração. Aos poucos, o aperto em seu peito diminuiu. Sentiu os ombros relaxarem, como se a tensão estivesse escorrendo para fora de seu corpo.

— "Preciso manter o controle... Não posso desmoronar agora..." — murmurou para si mesmo, fixando os olhos na lua como se ela fosse sua única âncora.

Depois de alguns minutos em silêncio, apenas ouvindo o som do vento e observando as estrelas, ele finalmente conseguiu se acalmar. A batalha interna havia dado uma breve trégua. E, naquele momento, ele soube que precisava reunir forças para seguir em frente, mesmo que o futuro parecesse incerto.

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Comments

Cecilia geralda Geralda ramos

Cecilia geralda Geralda ramos

será que ele vai ,conseguir se curar desta dor.

2025-01-16

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