Mina...
Quando cheguei ao fim da escada, virei à esquerda, em direção ao corredor que levava à cozinha. Andava devagar, quase como se meu próprio corpo estivesse tentando evitar que eu seguisse em frente. Foi então que ouvi.
Um grito abafado. Fraco. Como se tivesse vindo da minha cabeça
Parei instantaneamente, meu coração martelando no peito. Olhei ao redor, mas o corredor estava vazio. Apenas o som da minha respiração ecoava ao meu redor. Engoli em seco, tentando ignorar o aperto no estômago, e continuei andando.
Cheguei à cozinha, mas ela estava completamente vazia. Nenhum sinal de Clara, dos cozinheiros. O silêncio parecia ainda mais denso.
Continuei andando, passando pela cozinha em direção ao fim do corredor. Foi quando vi uma porta. Estava entreaberta, e uma luz fraca escapava pelas frestas.
Antes que eu pudesse me aproximar, ouvi de novo. Outro grito, desta vez mais alto, mais claro. O som rasgou o silêncio como uma faca, e meu corpo inteiro se arrepiou.
Parei, meu coração disparando. A razão me dizia para voltar, correr para o meu quarto e me trancar. Mas algo mais forte talvez a curiosidade, ou simplesmente a incapacidade de ficar sem respostas fez continuar.
Engoli em seco e dei mais alguns passos em direção à porta. Minhas mãos tremiam enquanto empurrava-a lentamente, tentando não fazer barulho.
O que vi lá dentro me fez congelar.
Era um porão escuro, iluminado apenas por algumas luzes fracas penduradas no teto. As sombras dançavam nas paredes, criando formas grotescas. Havia vários homens em pé, e entre eles estavam meu pai e meu irmão.
No centro do cômodo, pendurado por correntes e coberto de sangue, estava um homem. Ele gemia, sua cabeça caída para frente, como se a dor tivesse drenado toda a sua força. Meu pai segurava algo nas mãos uma barra de ferro, talvez? - e sua expressão era fria, cruel, como se ele estivesse lidando com um objeto, não com uma pessoa.
O ar saiu dos meus pulmões em um grito que eu não consegui conter.
Os olhos de meu pai se voltaram para mim imediatamente, furiosos. Meu irmão, Marco, também me olhou, mas sua expressão era diferente. Não havia raiva nele, mas algo mais... um misto de choque e impotência.
Meu pai deu um passo em minha direção, largando a barra no chão com um som que ecoou no porão. Sua presença era sufocante, e eu sabia, naquele instante, que ele não deixaria isso passar.
— O que você pensa que está fazendo aqui? — Ele questionou, sua voz baixa, mas cheia de ameaça.
Senti minhas pernas tremerem, mas não consegui responder. Não havia palavras. Só o som do sangue gotejando, os gemidos do homem torturado, e o olhar do meu pai, que parecia capaz de me arrancar daquela sala e me destruir.
E, naquele momento, eu sabia que algo havia mudado. Que, de alguma forma, eu havia cruzado uma linha da qual não poderia voltar.
O olhar de meu pai cruzou com o de Marco, frio e calculista, antes de ele dizer as palavras que me fizeram estremecer.
— Termine o trabalho.
Meu estómago se revirou, e um arrepio percorreu minha espinha. Marco não disse nada. Apenas baixou a cabeça, e eu não conseguia ler sua expressão. Ele parecia tão preso quanto eu, mas não era suficiente.
Antes que eu pudesse reagir, senti a mão de meu pai agarrar meu braço com força. Ele puxou-me para fora do cômodo com tanta brutalidade que meus pés quase não conseguiam acompanhar seus passos.
— Você perdeu completamente o juizo, menina? — Ele rosnou, enquanto me arrastava pelo corredor.
— Me solte! — Eu tentei me libertar, mas era inútil. Sua força era esmagadora, e a raiva em seus olhos me dizia que resistir só pioraria tudo.
Ele parou abruptamente na frente da porta do meu quarto e me empurrou para dentro com tanta força que quase tropecei. Minha respiração estava descompassada, minha pele ardendo onde seus dedos haviam apertado meu braço.
— Escute bem, Mina. — A sua voz era fria, cortante. — Não ouse descer lá novamente. Não saia deste quarto, seja lá qual for a circunstância.
— E se eu precisar de algo? — Perguntei, minha voz repleta de sarcasmo e raiva.
Ele riu, uma risada amarga, cheia de ironia, antes de perguntar:
— Fome? Alguma necessidade absurda?
Minha raiva transbordou, e eu gritei:
— Você acha que isso importa para mim?
Ele inclinou a cabeça, um sorriso debochado nos lábios.
— Não me interesso pelo que importa para você.
Eu senti minha garganta se apertar de ódio.Mas não podia deixar aquilo passar.
— Eu preciso de internet.
Ele riu de novo, um som que parecia um golpe.
— Não.
Sem dizer mais nada, ele saiu do quarto, fechando a porta com força. Antes que eu pudesse tentar absorver o que acabara de acontecer, ouvi a sua voz do outro lado, cheia de autoridade e fúria:
— Quero os dois aqui. Não saiam da porta, seja o que for.
Afundei na cama, o som de sua voz ainda ecoando na minha mente. Minhas mãos tremiam de raiva e impotência. Ele havia roubado até mesmo o pouco controle que eu ainda achava que tinha sobre minha própria vida.
Olhei para as paredes do quarto que, mais uma vez, se tornavam uma prisão. E, naquele momento, a necessidade de sair dali se tornou ainda maior. Eu sabia que não podia continuar vivendo assim. Não por mais um dia.
A ideia de fugir vinha me rondando há tempos, mas hoje ela parecia mais concreta, quase palpável. Minha mente girava com pensamentos, possibilidades e riscos. Apesar de só ter 15 anos, sabia que não podia mais viver assim.
"Eu consigo", pensei. "Não preciso desse lugar. Não preciso dele."
Fechei os olhos e respirei fundo, tentando organizar os pensamentos. O que eu faria lá fora? Não tinha dinheiro, nem amigos, ninguém para me ajudar. Mas a liberdade... a ideia de respirar ar fresco sem sentir o peso do controle dele... aquilo parecia suficiente para arriscar.
— Posso me cuidar sozinha,— sussurrei para mim mesma. — Sei lá... posso arrumar um trabalho, fingir ser mais velha. Qualquer coisa é melhor do que ficar aqui.
Minha mente começou a criar cenários. Eu fugindo no meio da noite, esgueirando-me pelos corredores enquanto os guardas estavam distraídos. Ou talvez pulando pela janela, escalando até o jardim. Mas, e depois? Para onde eu iria?
Um nó se formou na minha garganta, misturando medo e esperança. Eu não sabia como seria lá fora, mas sabia exatamente como era aqui dentro. E isso bastava.
Meus olhos foram até a porta, que agora tinha dois homens de guarda. Como se eu fosse perigosa. Era quase irônico. Eu era só uma garota presa, tentando sobreviver a um lugar onde tudo parecia cinza e morto.
— Não posso mais ficar aqui,— murmurei, sentindo a determinação crescer. — Eu preciso sair. De alguma forma, preciso sair.
Era isso. Eu não sabia como, nem quando, mas a ideia já não era apenas um pensamento. Era uma decisão.
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Atualizado até capítulo 73
Comments
Nem.Vem.
eu lendo isso e falando tudo da história pra minha mãe, tô chocada, que ele era frio já dava pra saber, mas mal desse jeito... credo
2025-03-27
1
Tânia Silva
Ela deveria ter fugido!
2025-03-19
0
Katia Erica
nossa que pai horroroso
2025-03-13
0