A sala onde ocorria o velório estava impecavelmente decorada, com coroas de flores brancas enviadas por amigos e parceiros de negócios do falecido Afonso Medrado Alcântara. O ambiente exalava sobriedade e elegância, refletindo o legado de um homem que havia construído um verdadeiro império no setor vinícola. Ao fundo, uma música instrumental suave tocava, trazendo um tom melancólico, mas digno, à despedida.
Ester Medrado, uma mulher que, mesmo tomada pela dor, mantinha a postura altiva que sempre lhe fora característica, estava sentada na primeira fila, ao lado do caixão do marido. Seus olhos inchados de tanto chorar revelavam o peso da perda de um companheiro com quem dividiu décadas de vida, mesmo que, ao longo do tempo, tivesse enfrentado as cicatrizes deixadas por traições e segredos.
Afonso, o primogênito e a quem o patriarca confiara grande parte dos negócios, mantinha-se ao lado da mãe. De pé, segurava uma de suas mãos de forma firme, tentando passar uma segurança que ele próprio não sentia. Sua expressão, ainda que compenetrada, denunciava a mistura de tristeza e responsabilidade que agora carregava, como o novo chefe da família e dos negócios.
Os gêmeos Álvaro e Alana, mais jovens e conhecidos por suas personalidades introspectivas, estavam sentados em um canto, ligeiramente afastados. Álvaro observava a todos com um olhar crítico, analisando cada expressão de condolência dos convidados, enquanto Alana mantinha a cabeça baixa, os olhos fixos no chão. Ambos guardavam suas emoções, preferindo não expô-las como o irmão mais velho.
Então, de maneira quase teatral, a chegada de Alifer rompeu a monotonia do ambiente. O filho fora do casamento, cuja existência havia sido um dos segredos mais controversos da vida de Afonso, entrou no salão, atraindo olhares. Vestido de preto, como todos, sua postura era ereta e séria, mas havia algo em seu semblante que misturava dor e uma espécie de desafio. Alguns dos presentes cochicharam discretamente; Ester desviou o olhar, visivelmente incomodada, enquanto Afonso tentou disfarçar o desconforto, acenando discretamente com a cabeça em sinal de reconhecimento.
Álvaro, porém, soltou um leve suspiro de impaciência, e Alana ergueu os olhos pela primeira vez, lançando um olhar furtivo para Alifer. Não havia palavras trocadas entre eles, mas a tensão era quase palpável.
O ambiente seguia em um misto de reverência e tensão, com pessoas se aproximando do caixão para se despedirem de Afonso Medrado Alcântara, enquanto a presença de Alifer parecia lançar uma sombra incômoda sobre a família. O velório não era apenas um adeus ao patriarca; era também um lembrete das complexas relações e segredos que, agora, poderiam vir à tona.
No canto mais afastado do salão do velório, Alana inclinou-se para cochichar com seu irmão Álvaro, lançando olhares discretos na direção de Alifer.
– Eu não acredito que ele ressurgiu das cinzas – murmurou, cruzando os braços. – Pensei que ele estava em Cuba, vivendo aquela utopia dele.
Álvaro soltou um riso curto e irônico.
– Pois é, Alana. Mas você sabe como ele é. Pode até bancar o anti-capitalista, mas nunca perde a chance de aparecer e lembrar a todos que ele também tem sangue Medrado.
Alana assentiu, ainda observando Alifer de longe, enquanto ele cumprimentava algumas pessoas.
– Só espero que ele não esteja aqui para causar confusão. Esse dia já está pesado o suficiente.
Álvaro não respondeu, apenas desviou o olhar, pensativo.
Enquanto isso, do outro lado da cidade, em uma realidade completamente diferente, Lavínia estava na cozinha simples de sua casa, rodeada pelos aromas das empadas que sua mãe, Joana, fazia para vender no dia seguinte. Entre ajudar o irmão mais novo com a lição de casa e rechear as últimas massas, ela tentava manter o foco, apesar do cansaço que pesava sobre seus ombros.
Joana, com as mãos molhadas enquanto lavava os pratos, olhou para a filha com certa empolgação.
– Você viu, Lavínia? Um empresário famoso morreu. Afonso Medrado, acho que é o nome dele. Tá passando agora no jornal.
– Quem? – Lavínia perguntou, distraída, sem tirar os olhos da tarefa. – Nunca ouvi falar desse homem.
Joana enxugou as mãos no avental, apressada, e foi até a pequena televisão na sala.
– Vem cá, menina. Olha isso. Parece que o cara era muito poderoso.
Com certa relutância, Lavínia deixou o que estava fazendo e foi até a sala. Na tela, o noticiário exibia imagens do velório luxuoso. Os jornalistas narravam a importância de Afonso Medrado Alcântara para o mercado vinícola, enquanto a câmera capturava momentos dos filhos e da viúva.
Quando o rosto de Afonso, o primogênito, apareceu na tela, Lavínia não conseguiu conter um comentário.
– Que homem gato, minha nossa!
Joana, que também tinha parado para assistir, riu do comentário da filha.
– Concordo, viu? Esse aí não puxou só a conta bancária do pai, não.
Lavínia revirou os olhos, sorrindo de leve, e voltou para a cozinha.
– Tá bom, mãe. Mas agora vamos terminar essas empadas antes que eu esqueça onde estava.
Enquanto isso, no velório, a presença de Alifer continuava a causar burburinho. O universo dessas duas realidades tão distintas estava prestes a se cruzar, embora nem Lavínia nem Afonso soubessem disso ainda.
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Atualizado até capítulo 82
Comments
Anatalice Rodrigues
Velório de rico é outro patamar. /Grimace//Grimace//Grimace//Grimace//Grimace/
2024-12-03
2
Claudia
Velório meio agitado 🤭🤭♾🧿
2024-11-25
0