Capítulo 3: Sob o Sol da Dúvida

O sol da manhã entrava pela janela, iluminando a cozinha de maneira quase irônica. O café estava na mesa, mas o ambiente estava longe de ser acolhedor. Hugo e Celma sentaram-se frente a frente, o silêncio entre eles era mais um convidado indesejado.

— Você não vai dizer nada? — perguntou Celma, quebrando o silêncio incômodo. Seus olhos procuravam algum sinal de reconciliação no rosto de Hugo.

— O que você quer que eu diga, Celma? — respondeu ele, sem levantar os olhos do jornal. A voz dele era fria, distante.

Celma suspirou, o peito apertado com a sensação de impotência. Tentou um sorriso, mas ele morreu antes de alcançar seus lábios.

— Só quero conversar, Hugo. Precisamos conversar se queremos salvar nosso casamento — disse ela, tentando manter a calma.

Hugo finalmente levantou os olhos, seu olhar era vazio, quase sem emoção.

— Conversar sobre o quê? Sobre como você arruinou tudo? — disse ele, a voz carregada de sarcasmo.

Celma sentiu as lágrimas queimarem seus olhos, mas se recusou a deixá-las cair. Não queria parecer fraca, não agora.

— Não estou tentando justificar o que fiz. Só quero que possamos seguir em frente — respondeu, com a voz firme.

Hugo riu, um som amargo que reverberou pela cozinha.

— Seguir em frente? Como, Celma? Fingindo que nada aconteceu? — perguntou, a raiva borbulhando novamente sob a superfície.

— Não. Enfrentando nossos problemas, juntos — disse ela, quase suplicando.

Hugo balançou a cabeça, a frustração evidente em cada linha do seu rosto.

— Você não entende, Celma. Você quebrou algo dentro de mim. Algo que não pode ser consertado — afirmou, a voz embargada.

Celma ficou em silêncio, as palavras dele atingindo-a como um soco no estômago. Sabia que havia machucado Hugo profundamente, mas não sabia o quanto até aquele momento.

— Hugo, eu...

— Não. Chega de falar — interrompeu ele, levantando-se abruptamente. — Eu preciso de um tempo para pensar.

Ele saiu da cozinha, deixando Celma sozinha com seus pensamentos e sua culpa. As paredes da casa pareciam se fechar ao redor dela, o ar ficando cada vez Mais pesado. Celma arrumou a cozinha depois de ter cuidado da louça, saiu da cozinha e, ao passar pela sala, não deixou de reparar em Hugo forrado com a cabeça no sofá. Celma foi ao quarto.

No banheiro, fez sua higiene pessoal. Após o banho, frente ao espelho na pia do lavatório, ela escovava os dentes, as lágrimas escorrendo e lembranças das manhãs alegres e das correrias da casa quando o dia nascia. Depois de vestir uma saia lápis preta, uma camisa de seda branca e um blazer cinza, ela caminhou até a sala, pegou sua pasta contendo o laptop, e olhou para o sofá.

— Hugo — chamou ela. Mais ele não respondia. Insistiu chamando. — Hugo — chamou ela outra vez.

— Sim, Celma. O que foi? — respondeu ele.

— Não irás para o restaurante hoje? — perguntou Celma, aproximando-se do sofá.

— Não estou com a cabeça para trabalho hoje — respondeu enquanto se ajustava no sofá.

— Está bem, então nos vemos mais tarde — disse Celma enquanto saía, fechando a porta atrás de si. O relógio marcava 7h30.

Na rua, a cidade de Lagoas começava a despertar. Celma caminhou até o ponto de ônibus, sentindo o sol morno no rosto, mas a mente ainda presa na conversa amarga com Hugo. A angústia pesava no peito, e a respiração era difícil, como se cada passo fosse um esforço para seguir em frente.

Enquanto esperava pelo ônibus, uma brisa leve trazia o cheiro de pão fresco de uma padaria próxima. O aroma familiar trouxe uma lembrança dolorosa das manhãs felizes que costumavam compartilhar. Hugo adorava pão fresco, e Celma sempre fazia questão de comprá-lo. Agora, tudo parecia tão distante, como se fossem vidas diferentes.

Quando o ônibus chegou, Celma subiu e se sentou junto à janela. A cidade passava diante de seus olhos como um borrão. Seu telefone vibrou na bolsa, trazendo-a de volta à realidade. Era uma mensagem de Ana.

— Celma, como você está? Como foi a noite passada? — lia-se na mensagem.

Celma hesitou antes de responder, as palavras dançando em sua mente. Finalmente, digitou:

— Foi horrível, Ana. Hugo está tão machucado. Não sei se vamos conseguir superar isso.

A resposta veio quase imediatamente.

— Fica calma, Celma. Vocês vão encontrar uma maneira. Hugo só precisa de tempo para processar tudo.

Celma fechou os olhos, tentando se acalmar. O ônibus parou, e ela desceu, caminhando em direção ao edifício da FortunaTech. As portas automáticas se abriram com um som suave, e o ar-condicionado trouxe um alívio temporário do calor crescente do dia.

No escritório, seus colegas cumprimentaram-na com sorrisos habituais, mas ela não conseguiu corresponder com a mesma energia. Sentou-se à sua mesa, ligou o laptop e tentou se concentrar no trabalho. A tela do computador parecia uma barreira entre ela e a realidade dolorosa de sua vida pessoal.

O telefone da mesa tocou, interrompendo seus pensamentos.

— Alô? — atendeu, tentando soar profissional.

— Celma, é a Marina. Precisamos discutir aquele caso urgente. Pode vir à minha sala? — disse a voz familiar de sua colega.

— Claro, estou a caminho — respondeu, levantando-se rapidamente.

Ao entrar na sala de Marina, ela percebeu imediatamente a expressão abatida de Celma.

— Tudo bem com você? — perguntou Marina, com genuína preocupação.

Celma tentou sorrir, mas seus olhos revelaram a verdade.

— Não muito, Marina. As coisas com Hugo estão... complicadas — admitiu, sentando-se.

Marina suspirou, balançando a cabeça.

— Sinto muito ouvir isso, Celma. Se precisar de alguém para conversar, estou aqui — disse ela, tocando levemente a mão dela em um gesto de apoio.

— Obrigada, Marina. Agora, qual é o caso urgente? — perguntou, tentando mudar de assunto.

Marina explicou os detalhes do caso, mas Celma teve dificuldade em se concentrar. Seus pensamentos voltavam constantemente para Hugo, para a conversa na cozinha, para o olhar vazio dele. Quando a reunião terminou, Celma voltou para sua mesa, sentindo-se exausta.

O dia passou em uma névoa de reuniões e documentos. Cada vez que o telefone tocava ou alguém a chamava, ela se sobressaltava, o coração acelerando com a expectativa de más notícias. Finalmente, quando o relógio marcou cinco da tarde, Celma desligou o computador e começou a arrumar suas coisas.

— Celma, vai sair agora? — perguntou Gonçalves, aproximando-se da mesa dela.

— Sim, vou para casa. Preciso tentar resolver algumas coisas — respondeu, com um suspiro pesado.

— Boa sorte. Eu ainda ficarei por aqui — disse Gonçalves, abraçando-a rapidamente.

Celma agradeceu e saiu do escritório, o sol da tarde agora baixo no horizonte. Pegou o ônibus de volta para casa, o trajeto familiar parecendo mais longo do que nunca. Quando chegou à sua rua, viu Hugo sentado na varanda, os olhos perdidos no céu que começava a escurecer.

Ela subiu os degraus devagar, sentindo a tensão no ar.

— Boa noite, Hugo — disse ela, tentando soar normal.

Hugo não respondeu, permanecendo imóvel, com o olhar fixo no horizonte.

Celma entrou em casa e foi direto para a cozinha. Colocou o frango para descongelar e, em seguida, foi até o quarto, onde trocou de roupa. Colocou um vestido confortável, sentindo o peso do dia nos ombros.

Ela sentou-se na beira da cama por um momento, respirando fundo e tentando reunir forças para a noite que se desenrolava à sua frente. Levantou-se e voltou à cozinha, determinada a fazer um jantar que pudesse trazer algum alívio à tensão entre ela e Hugo.

Enquanto cortava os legumes, ouviu a porta da frente se abrir e fechar. Hugo estava finalmente entrando. Ele caminhou até a cozinha, parando na entrada, observando Celma trabalhar.

— O que está fazendo? — perguntou ele, a voz ainda carregada de mágoa.

— Jantar. Frango à primavera — respondeu, sem se virar.

— Sério que você está fazendo frango à primavera? — disse Hugo, a descrença evidente em seu tom.

— Sim, pensei que um bom jantar pudesse nos ajudar a relaxar um pouco — disse Celma, tentando soar convincente.

— Não sei se um jantar pode consertar as coisas, Celma — disse Hugo, com um suspiro.

— Eu sei, Hugo. Mas é um começo, não é? — perguntou ela, finalmente virando-se para encará-lo, as lágrimas de novo ameaçando cair.

Hugo balançou a cabeça, mas não disse mais nada. Sentou-se à mesa, observando Celma terminar de preparar o jantar.

— Não quer ajudar aqui? — perguntou ela, tentando quebrar o silêncio.

— Não — respondeu Hugo, seco.

O silêncio entre eles era pesado, mas havia uma pequena centelha de esperança. Talvez, com tempo e esforço, pudessem encontrar um caminho de volta um para o outro.

O relógio marcava 18h. Celma virou-se para Hugo.

— Hugo, por favor, coloque os pratos na mesa — disse ela.

Hugo levantou-se e colocou os pratos na mesa sem falar nada. Celma serviu a comida nas tigelas e as colocou na mesa. Sentou-se de frente para Hugo.

— Me passa o seu prato — disse ela.

Hugo estendeu o prato, e Celma serviu a comida. Os dois começaram a jantar em silêncio, cada um perdido em seus próprios pensamentos, mas conscientes da presença um do outro.

— Está bom o frango? — perguntou Celma, quebrando o silêncio.

— Sim, está ótimo — respondeu Hugo, com um pequeno sorriso.

Enquanto provavam os primeiros bocados, o aroma perfumado do frango à primavera encheu o ar, trazendo à tona lembranças de momentos melhores juntos. Cada garfada era um passo cauteloso em direção à reconciliação, um sabor familiar em meio à tensão que os separava.

Ambos sabiam que aquele jantar não resolveria tudo, mas era um gesto de paz em um momento de turbulência, uma tentativa de reconstruir o que haviam perdido.

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Comments

Maria José Casarine

Maria José Casarine

Nossa o cara não era mulherengo pulava cerca ajava que não doía nela mais agora tá ofendido bem feito 🤪🤪🤪😁😁

2024-07-31

1

Inês Bernardete

Inês Bernardete

homem trai, a esposa fica carente, fraguexa e ele se sente magoado kkkk
é muito ridículo

2024-07-31

0

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