À tarde, geralmente quando deixo o serviço mais cedo, costumo ir para casa estudar todos os pilares do desenho. Mas hoje decidi visitar minha avó. Ela mora a uns quinze minutos do meu trabalho indo de ônibus.
Passo por sua rua e dou a volta ao redor de sua casa, entrando pelos fundos onde tem um portão de ferro. Bato algumas vezes e o portão se abre. Uma Irina ranzinza se encosta, cruzando os braços ao erguer o queixo.
— Não quero comprar nada, moço, então rapa daqui!
Fico sério, apontando por cima de seu ombro e semicerrando os olhos.
— Se não parar com isso, vou doar seus gatos.
A coroa abre um sorriso e dá um soquinho em meu peito.
— Como se um frango como você fosse capaz.
Nos sentamos naquelas cadeiras de bar no centro do quintal repleto de plantas de todos os tipos que eu não conheço, repleto de gatos com nomes estranhos que esqueço facilmente. Coloco a mochila sobre a mesa. Minha avó prepara seu chá inigualável e ficamos horas conversando.
Quando ficamos em silêncio, pesco o celular no bolso da mochila e entro na minha conta empoeirada do Facebook. Será que ela tem uma conta ativa lá? De cara a encontro e fico contente por vê-la online. Agatha tem apenas três postagens de uns seis anos atrás. Ela em uma foto no espelho, outra tem ela sentada na grama apenas sorrindo e a última ela está dormindo. Isso me incomoda. Meu celular voa da minha mão quando minha avó o puxa. Tento recuperá-lo, mas a velha é rápida.
— O que meu frango tanto olha nesse celular? — ela aperta os olhos, mesmo que a tela já esteja bem na sua cara. — Ela é linda.
— Até demais. — Tento esconder meu sorriso.
Ela coloca o celular na mesa, cruzando os dedos embaixo do queixo. Arregala os olhos como se estivesse me analisando.
— Frango, você não pode mentir para a velha aqui. Ainda está em busca do conto de fadas?
Reviro os olhos e jogo as costas no apoio da cadeira, ficando bem despojado.
— Não é um conto de fadas — encaro o céu meio rosado de fim de tarde. — E eu não estou procurando mais...
— Anton! — ela estapeia a mesa, me fazendo olhar em seus olhos como se eu fosse um garotinho devendo explicações.
Me debruço sobre a mesa apoiando a cabeça nos antebraços. Escuto a coroa pigarrear com a minha resposta silenciosa que certamente a desagradou. Da última vez que tivemos essa conversa não foi muito divertido.
— Por qual motivo precisa ser preenchido tão depressa?
Levanto a cabeça e uno as sobrancelhas, não sei se quero discutir isso com ela ou com qualquer outra pessoa. Pego meu celular para conferir a hora.
— Nossa, tenho que ir, vó.
Coloco a mochila nas costas e beijo a testa dela, pronto para passar pelo portão de ferro.
— Do que tem tanto medo, Anton?
Reflito um pouco sobre sua pergunta. Aperto a nuca mirando em seus olhos.
— A vida é muito intensa, não dá pra viver sozinho.
Eu observei meus pais por muito tempo e decidi que teria algo semelhante com a mulher da minha vida. A forma suave como os dois se tratam, eu quero algo assim. É inadmissível que passe minha vida sozinho ou com um histórico de relacionamentos ruins.
Acho que eu só não quero morrer sozinho.
— E a sua alma gêmea é essa moça da foto? — ela pega um gato branco que se enroscou em seus pés e o coloca em seu colo.
— Acho que sim, vó. — Estico o braço para acariciar a cabeça do gato, talvez seu nome seja "Diguinho", não lembro.
— E o "mas"?
— Isso me assusta. Foi tão de repente.
— Você é um frango mesmo.
Semicerro os olhos e coloco o indicador na cabeça do felino.
— Vou fazer sopa com esse gato.
A velha dá um tapa em minha mão e se inclina.
— Seu avô lutou por anos até que nós pudéssemos ficar juntos, que Deus o tenha — ela faz um sinal voltando a me encarar. — E você aí todo assustadinho.
Passo os dois polegares pelas alças da mochila, franzindo a testa. Vasculhando o medo que estrangula meu peito desde o dia em que conheci Agatha. Meus planos eram colocados em prática durante as festas, mas fui surpreendido na Praça da Matriz. Não queria cair de cabeça com a ideia de que encontrei o que buscava e acabar me iludindo mais tarde.
Mas talvez essa velha tenha razão, talvez eu seja mesmo um frango.
— Valeu, vó. Acho que vou ser preenchido. — Bato meu punho contra o dela e depois abro o portão.
Pego o celular, ainda aberto no Facebook, e envio uma solicitação de amizade.
E Antes mesmo que eu passe pela saída, minha avó diz depois de dar uma risada misturada com tosses:
— Já nascemos completos, frango — ela ergue o gato, o devolvendo para o chão, enquanto me encara. — Mas algumas pessoas só percebem isso quando estão morrendo.
Assinto, focando toda a minha atenção em seu rosto sério e em suas palavras.
— Se cuida, vó.
Bato o portão.
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Atualizado até capítulo 30
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