Ele assentiu com a cabeça antes que seus olhos baixassem na direção de seus sapatos feitos do couro dos crocodilos mais ferozes do pântano dos carniceiros. Até seus calçados demonstraram mais autoridade que seus ombros caídos.
— Atenção! Ouçam-me, por favor!
Foi preciso que eu levantasse o outro braço também para acalmar os ânimos dos mais resistentes. Como esperavam que chegássemos a uma solução se mal podiam nos ouvir? Visto que berravam como animais de curral, revolto com o reinado deixado pelo rei Afonso de Salazar.
Outro rei melhor que o meu pai nunca existiu e não poderia existir. Alexander herdou muitos atributos de nossa mãe, mas pouquíssimos do nosso pai. A força, a coragem e a determinação não existiam em seu semblante temeroso e gestos de insegurança.
Ele era apenas uma criança e eu, uma adolescente admirada e por vezes cortejada em segredo pelos príncipes dos reinos vizinhos, quando a rainha Madalena de Salazar faleceu.
Lembro com clareza dela, de seu jeito dócil e de seus medos do poder que um povo revoltado pode oferecer ao monarca. Sua preocupação contaminou seu filho caçula, embora desejasse vê-lo crescer e se tornar um grande homem forte, responsável e soberano como o marido.
— Gente, a princesa Isabella deseja falar conosco — gritou entre eles um homem vestido como os ferreiros das fábricas de espadas do nosso reino, suas mãos calejadas surtiram mais efeito do que as minhas pálidas e macias mãos cuidadas balançando sob o vento daquela manhã de primavera.
Pouco a pouco a multidão se calou. O silêncio logo perdurou sem que os nossos soldados entrassem em cena, embora as mãos deles já se encontrassem postas sobre o cabo de suas espadas prontas para intimidá-los.
— Obrigada!
O ferreiro curvou a cabeça em sinal de reverência. Sua atitude lhe custou olhares de indignação por parte de seus companheiros. Ele deu dois passos à frente, ignorando a multidão que poderia matá-lo ali mesmo se quisessem. Os soldados só agiriam para proteção unicamente dos membros da nobreza.
— Fale, princesa Isabella, iremos ouvi-la agora.
Fiquei em silêncio por um breve momento. Aquele ferreiro fez mais do que calar aquela multidão. Ele atraiu a minha atenção, fazendo brotar em mim um sentimento negativo por sua forma de agir. Um homem como aquele me pareceu uma ameaça maior que o último exército derrotado de cinco mil homens das últimas porções de terras conquistadas.
— Não me diga o que fazer — desviei o olhar para o soldado mais próximo.
— Isabella, não faça nada que piore a situação — pediu Alexander em voz baixa.
Suas palavras sim, as de meu irmão e mais ninguém, eu permitia que fossem atendidas por minha mente criada para a soberania. Sempre estive ao lado do rei Salazar, em todos os momentos, incluindo à noite fria de sua súbita morte.
Os convidados não compreenderam a minha reação quando vi o meu próprio pai tombar morto sobre a mesa do banquete. O restante do vinho de sua taça escorreu sobre a mesa até a borda de onde gotejou até o chão.
— Chamem os curandeiros!
— É inútil, princesa — disse o rei Beltrano Salazar, conferindo a pulsação no pescoço do rei de Valeria. — O meu irmão se foi desta para melhor. — Seu olhar me atingiu como uma flecha mortal. — Sinto muito pelo seu pai, sobrinha.
— Assassino!
Sob os olhares dos demais convidados e de Alexander, que chorava como uma criança que nunca deixou de ser, apanhei uma pequena faca na mesa e avancei sobre o meu tio Beltrano, o monarca do reino de Valdemia, situado em uma ilha ao sul do continente de Orlandes.
Ninguém acreditou em mim. Acharam que eu estava louca, que minhas acusações eram infundadas. Embora todos soubessem dos atritos que hora ou outra surgiam entre os irmãos Salazar por questões de riqueza e poder. Além disso, era óbvio que muitos desejavam tomar o trono de Valeria.
O meu pai fez muitos inimigos por todos os lugares por onde andou, incluindo o reino de seu único e mais velho irmão, por quem nutria uma admiração absurda ao ponto de idolatrá-lo como um “Deus da guerra”, apesar das divergências.
O meu tio sempre foi um homem perspicaz e muito sagaz, dotado de muitas habilidades e cheio de charme. Uma vez no passado o vi discutindo com o meu pai. Escondi-me atrás de uma coluna para ouvir o que discutiam no corredor principal do castelo.
— O meu irmão está com ciúmes? Elas são apenas servas. Imagino que a Madalena desconheça esse seu ciúme por suas servas, ou não?
— Chega, Beltrano! Sabes muito bem que eu proíbo no meu reino o relacionamento entre nobres e camponeses, incluindo as mulheres que trabalham neste castelo. Não importa que elas sejam livres, e você seja um homem viúvo, completamente desimpedido para o amor. Ordens são ordens e lei é lei no reino de Valeria.
...Foto 4: Beltrano Salazar, rei do reino de Valdemia....
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Atualizado até capítulo 61
Comments
Ranna Silva
Até aqui conquistou minha atenção. Vou continuar.../Smile/
2024-05-11
2
Yasmim liberio
homem feio da peste
2024-03-06
1