Deixada para trás

A igreja estava cheia. Convidados murmuravam entre si, ansiosos para testemunhar o casamento do poderoso Damian Lynn com a encantadora Anika Zraa — uma união que, aos olhos de todos, seria o evento do ano. Mas, longe dali, Anika ajeitava o véu diante de um grande espelho, enquanto a mãe a observava com um sorriso falso.

— Estou tão ansiosa… Será que ele vai gostar? O vestido ficou perfeito! Não é? — Anika perguntou, tentando disfarçar o nervosismo. Seus dedos tremiam quando tocavam o tecido delicado do vestido feito sob medida.

— Gostar? — Magna Zraa ergueu uma sobrancelha, largada no sofá do camarim. — Vai mesmo fingir que se importa com tudo isso? Já esqueceu por que está fazendo isso? Não me diga que…

— Eu não esqueci — rebateu Anika, firme. — Mas não preciso ouvir esse tom. Não é só por dinheiro. Eu… até que gosto dele.

Magna soltou uma risada curta e sem humor.

— Amar um homem nunca pagou as contas, querida. Lembre-se: você promete amor, ele promete fortuna. E no fim, todos saem ganhando… vivos ou mortos. É assim que a vida funciona.

Anika desviou o olhar, tentando ignorar a pontada de desconforto que sentia toda vez que a mãe falava assim. Não poderia negar que ela estava certa, mas ouvir essas coisas a deixava um pouco desconfortável. Afinal, era seu casamento, como poderia não se sentir ao menos um pouco ansiosa?

— Eu sei o que estou fazendo. — Passou um batom, um vermelho que combinava com sua personalidade, e então respirou fundo. — Preciso mantê-lo tranquilo até o último segundo.

Antes que Magna pudesse responder, a porta se abriu abruptamente. O senhor Thomas Zraa, entrou com os punhos fechados, no rosto uma máscara de fúria contida perante sua única filha.

— O que aconteceu? — Magna levantou-se num salto. O tom calmo sumira por vê-lo dessa maneira.

Thomas não respondeu. Marchou até Anika e, sem aviso prévio, acertou-lhe um tapa que ecoou pelo quarto. O estalo fez o coração de Anika disparar, assim como seu corpo quase tropeçar — ela levou a mão à face, os olhos arregalados por tamanha violência. Seu pai nunca fez isso antes.

— O que pensa que está fazendo?! — Magna gritou, tentando afastá-lo com suas próprias mãos. Tão fraca que sequer conseguiu movê-lo do lugar.

— Você me enganou! — Thomas rugiu para a filha. — O que disse a ele, hein?! Diga!

— Eu não fiz nada! — Anika se defendeu, sentindo o rosto latejar. — Pai, por favor…

— Ele sumiu! — Thomas girou para encará-las friamente, a respiração pesada, voz carregada de ódio . — O maldito sumiu! Você estragou tudo!

— O quê? — Anika cambaleou, apoiando-se na penteadeira. — Não… isso não pode…

— Vi a família dele cochichando no saguão! — Thomas estava vermelho de raiva, não sabia mais onde descontar sua fúria senão na própria filha. — Se ele tivesse mudado de ideia, teríamos dado um jeito depois. Mas agora… agora ele sumiu antes de assinar qualquer papel!

Magna se colocou entre os dois, apertando o braço do marido para chamar sua atenção.

— Baixe a voz, Thomas! Quer que escutem lá fora? — sussurrou entre dentes, perplexa, mas ao mesmo tempo convicta. — Se alguém ouvir, acabou tudo.

Thomas respirou fundo, mas tremia. Olhou para a filha, quase cuspindo veneno contra ela.

— Se isso for culpa sua… — ameaçou.

— Eu juro! — Anika sussurrou, a voz embargada. Pegou o celular com os dedos trêmulos, discou para Damian como uma tentativa de resolver aquela situação — fora de área. De novo. E de novo. Nada.

Magna respirou fundo, buscando manter o controle da situação. Já não poderiam fazer mais nada no momento, apenas o óbvio.

— Chega. — A voz dela soou fria como aço. — Agora, você vai engolir as lágrimas e fingir que não sabe de nada. Quando nos trouxerem a notícia, apenas chore. Lamente. E, acima de tudo, silêncio. Você me entendeu?

Anika assentiu, respirando fundo para conter o tremor.

Um leve toque na porta os fez engolirem o medo. O pai de Damian entrou, acompanhado da mãe. Os olhares deles diziam tudo.

— Senhor Zraa, senhora Zraa… sinto muito. — A senhora Lynn segurava as mãos de Anika como apoio emocional. — Damian… fugiu. Ele não apareceu na igreja, não atendeu ligações. Infelizmente ninguém sabe onde está.

Por um segundo, o rosto de Anika ficou pálido. Mas, então, ela deixou que lágrimas escorressem, uma a uma. A mãe aproximou-se, abraçou-a. Thomas mordeu a língua, reprimindo a raiva. Magna, atrás de todos, forçou um soluço discreto. Precisavam fingir.

— Não… não pode ser… — Anika sussurrou, soterrada por braços que a confortavam. — Por que ele faria isso comigo? Eu não entendo… ele disse que me amava.

Amely, do lado de fora, observava a cena pela fresta da porta. Sentia o estômago embrulhar — algo estava errado. Seu irmão jamais faria isso. Ele realmente amava Anika — ou, pelo menos, sempre disse que sim.

Atrás dela, Koen, o irmão mais velho, cruzou os braços.

— Ele fugiu. Quem diria… — murmurou no ouvido dela de forma brincalhona. — Talvez eu tenha uma chance, afinal.

Amely se virou, furiosa.

— Koen! Nem pense em brincar com isso! — o repreendeu.

— Então me explica — ele rebateu, sério agora. — Olha bem pra eles. Não parece tudo encenado? Esse choro dela… Toda essa lamentação… angústia e dor.

Amely o silenciou com um olhar, mas por dentro, a dúvida corroía. O coração martelava em sua garganta — Damian estava em perigo. Ela sentia isso.

Enquanto isso, quilômetros dali, Damian acordava num leito de hospital, os olhos piscando sob a claridade cruel. A dor era latejante — perpassava-lhe o peito, o ombro, as costelas, praticamente tudo. Ele tentou se mexer, mas um gemido de dor escapou. Sua visão estava um pouco embaçada, sequer conseguia entender o que estava acontecendo consigo.

Damian fechou os olhos, lutando contra a confusão. Sua mente latejava. E agora? Onde estava? O que estava acontecendo? E como veio a estar neste estado deprimente?

Do outro lado do vidro, o médico geral Daniel o observava em silêncio. Sabia que, quando seu paciente acordasse por completo, perguntas viriam como uma avalanche, sem piedade. Principalmente quando soubesse o que causou seu acidente, e estava preocupado com isso.

Lá fora, a noite caía. Tão silenciosa e, com ela, a certeza: para Damian, voltar atrás não era mais uma opção, seu estado já não lhe permitia tamanho luxo. E Anika, mesmo traída em seu próprio jogo, ainda não estava disposta a perder.

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